Como de praxe no Mundial de Clubes da Fifa, o país-sede é representado pelo campeão de sua liga nacional. Palco da edição 2015 do torneio, o Japão deposita sua confiança no Sanfrecce Hiroshima, campeão da J-League 2015.

Os Violetas abrem a competição na quinta-feira (10), dia em que recepciona o Auckland City, campeão da Oceania, no Estádio Internacional de Yokohama, às 8h45m, horário de Brasília. O vencedor do confronto medirá forças com o Mazembe, campeão africano, na segunda fase.

História: lenda, bomba atômica e crescimento no futebol

O nome "Sanfrecce" significa "três flechas", desenho representado no escudo do clube, e é inspirado em uma lenda que envolve Mori Motonari, um poderoso senhor de terras da província de Aki no século XVI, e seus três filhos. Conforme diz a tradição, Motonari entregou três flechas aos seus descendentes (uma para cada) e pediu que eles as quebrassem. Reivindicação atendida. Logo depois, o chefe da família novamente entregou uma flecha para cada filho e, dessa vez, pediu para que eles as juntassem. Posteriormente, um novo pedido: ele quis que seus filhos tentassem quebrar as três flechas. Nada feito.

A partir daí, Motonari explicou que uma flecha pode ser facilmente quebrada, mas o mesmo não se pode dizer das três juntas. O mesmo aconteceria enquanto os três filhos estivessem unidos: um pode ser vencido enquanto estiver sozinho, mas os três unidos são imbatíveis.

Mori Motonari, principal protagonista da lenda que inspira o Sanfrecce Hiroshima (Foto: Divulgação)

O clube japonês foi fundado no ano de 1938, com o nome Toyo Kogyo Syukyu Club ("Syukyu" é futebol em japonês). Teve essa denominação até 1970, quando passou a se chamar Toyo Kogyo Soccer Club. Entre 1981 e 1991, alternou entre os nomes Mazda Sports Club Toyo Kogyo Soccer Club, Mazda Sports Club Soccer Club e Mazda Soccer Club, até a definitiva mudança para Sanfrecce Hiroshima, em 1992.

Entre 1943 e 1946, teve suas atividades suspensas em decorrência da Segunda Guerra Mundial. A reconstrução após a bomba atomômica que foi lançada pelos Estados Unidos e devastou a cidade de Hiroshima - além de Nagasaki, o município vizinho - foi difícil. Mas a instituição se reergueu e voltou à ativa.

O Toyo Kogyo foi potência na década de 60, período no qual conquistou a primeira divisão japonesa por quatro anos seguidos, de 1965 a 1968. Em 1969, foi vice-campeão. A soberania foi retomada em 1970. Também vieram três taças da Copa do Imperador, em 1965, 1967 e 1969. Também em 1969, o clube fez sua melhor campanha em âmbito internacional, quando ficou em terceiro lugar na antiga Copa dos Campeões da Ásia (atual AFC Champions League).

Desde a profissionalização do futebol japonês e a consequente criação da J-League, em 1993, o Sanfrecce Hiroshima só ficou fora da elite duas vezes, em 2003 e 2008. Os primeiros títulos vieram em sequência, nas temporadas de 2012 e 2013, época em que o campeonato ainda era por pontos corridos.

EDION Stadium, casa do Sanfrecce Hiroshima (Foto: Divulgação/Sanfrecce Hiroshima)

Em 2015, com a novidade do mata-mata, o Sanfre fez a melhor campanha do segundo turno. Por ter sido o melhor time na soma das pontuações dos dois turnos, classificou-se antecipadamente para a decisão, na qual defrontou o Gamba Osaka, que superara o Urawa Reds na "repescagem". Conquistou uma vitória antológica por 3 a 2, no jogo de ida, em Osaka. Perdia o embate por 2 a 1 até os 46 minutos do segundo tempo, quando empatou. A virada veio aos 50 minutos.

Na partida de volta, em casa, mais drama: ficou atrás no placar aos 28 minutos da primeira etapa; no entanto, arrancou a igualdade no marcador aos 31 minutos do período complementar e conquistou a taça. O gol do título foi anotado pelo atacante Takuma Asano, que entrara em campo no segundo tempo.

O público da finalíssima, jogada no EDION Stadium, foi de 36.609 torcedores. A média do Sanfre, por sua vez, foi de 16.382 adeptos por partida - a oitava maior do campeonato, que tem 18 times. Número modesto perto das maiores médias, pertencentes ao Urawa Reds (38.746), FC Tokyo (28.784) e Yokohama Marinos (24.221).

Violetas agradeceram aos torcedores na comemoração do título: "Obrigado por tudo" (Foto: Divulgação/Sanfrecce Hiroshima)

O técnico: Hajime Moriyasu

Sanfrecce Hiroshima aposta em trabalho a longo prazo e colhe frutos: no comando técnico do time desde 2012, Hajime Moriyasu já acumula cinco títulos pelos Três Flechas (Foto: Getty Images)

A coincidência dos três títulos do Sanfrecce é o técnico Hajime Moriyasu, presente nas conquistas do clube de Hiroshima. Além das três edições da J-League, ele também guiou o grupo nas conquistas das Supercopas do Japão de 2013 e 2014. A identidade entre Moriyasu e a torcida do Sanfrecce Hiroshima é enorme. O ex-volante coleciona duas passagens na equipe como jogador: a primeira durou de 1992 a 1997; a segunda, de 1999 a 2001.

Hajime defendeu a seleção japonesa entre 1992, ano em que conquistou a Copa da Ásia, e 1996. Ou seja, participou da geração que "preparou" o Japão para o futebol. Desde 1998, os Samurais têm participado de todas as Copas do Mundo - em 2002, inclusive, sediaram o torneio juntamente com a Coreia do Sul.

Após pendurar as chuteiras no Vegalta Sendai, em 2003, Hajime Moriyasu investiu na carreira de treinador. Foi assistente técnico do Sanfrecce Hiroshima em 2004. Depois, treinou as categorias de base da seleção nacional. Em 2012, retornou ao Sanfrecce, agora para assumir o comando técnico.

A filosofia de Moriyasu preza por defesa e meio-campo compactos, além de um ataque mortal. Não à toa seus comandados tiveram o melhor ataque (73 gols marcados) e a melhor defesa (30 tentos sofridos) da temporada regular da J-League.

Os principais destaques da temporada foram o goleiro Takuto Hayashi, a dupla de zaga formada por Sho Sasaki e Tskusaka Shiotani, o volante Toshihiro Aoyama e os atacantes Douglas e Hisato Sato.

O cara: Toshihiro Aoyama

O Sanfrecce Hiroshima é, até hoje, o único clube da carreira profissional do volante Aoyama (Foto: Getty Images)

O volante Toshihiro Aoyama, de 29 anos, é um dos maiores ídolos do Sanfrecce Hiroshima. Iniciou a carreira nas categorias de base do Sakuyo High School e ascendeu ao profissionalismo no próprio Sanfrecce, em 2004. Desde então, nunca mudou de time. Marcou presença nos altos e baixos do clube: o rebaixamento em 2007, o retorno à elite em 2008 (com o título da J-League 2) e o bicampeonato em 2012 e 2013, além do título de 2015. De lá para cá, são 23 gols em 317 partidas.

Presente na seleção japonesa desde 2013, Aoyama esteve na lista de convocados para a Copa do Mundo de 2014. Era o terceiro atleta da história do time das Três Flechas a integrar uma equipe nacional em um Mundial, depois do também japonês Yüichi Komano (2006) e do sul-coreano Noh Jung-Yoon (1998).

Fique de olho: Douglas

Douglas (à esquerda) em ação contra o Gamba Osaka: brasileiro marcou um dos gols que levaram a taça para Hiroshima (Foto: Getty Images)

As informações que se tem do atacante Dyanfres Douglas Chagas Matos, de 27 anos, são poucas. O que se sabe é que o jogador iniciou seus trabalhos nas categorias de base do Moto Club e chamou a atenção de olheiros do Madureira, para onde foi em 2008 e se tornou atleta profissional. Em 2009, transferiu-se para o Figueirense. Contudo, recebeu poucas oportunidades no clube catarinense.

No ano seguinte, foi emprestado ao Tokushima Vortis, que mais tarde comprou seus direitos federativos. Em 2014, o Tokushima emprestou Douglas ao Kyoto Sanga. Este ano, o destino do camisa 9 foi o Sanfrecce Hiroshima, também por empréstimo. E o atacante finalmente deslanchou: anotou 21 gols em 35 partidas e se consagrou como o vice-artilheiro da liga japonesa. Foi superado somente pelo atacante Yoshito Okubo, do Kawasaki Frontale, que balançou as redes 23 vezes.

O gol mais importante de Douglas na temporada veio no primeiro jogo da final contra o Gamba Osaka. O brasileiro anotou o tento do 1 a 1 - o duelo, conforme já foi dito, terminou 3 a 2 pro time de Hiroshima.

O centroavante é o único brasileiro do elenco - e, também, o único estrangeiro, ao lado do meia Mihael Mikic. Mas a história mostra que muitos brasileiros já defenderam o Sanfre. Os mais conhecidos são o ex-volante César Sampaio, campeão mundial com a Seleção Brasileira em 1994, e o ex-zagueiro Dininho, que fez história no São Caetano que surpreendeu o Brasil no início dos anos 2000. O primeiro vestiu a camisa violeta nos anos de 2003 e 2004; o segundo, em 2005 e 2006.

A primeira vez no Mundial

Japoneses garantiram a quinta colocação do Mundial de Clubes de 2012 com vitória sobre o Ulsan Hyundai, da Coreia do Sul (Foto: Getty Images)

Por ter sido campeão nacional em 2012, o Sanfrecce Hiroshima teve o direito de disputar o Mundial de Clubes daquele ano. Estreou diante do Auckland City, o mesmo adversário desta quinta, também no Estádio Internacional de Yokohama. Venceu por 1 a 0, com gol do ídolo Aoyama.

Na segunda fase, os Três Flechas jogaram de igual para igual com o Al-Ahly. No entanto, os egípcios acabaram vencendo por 2 a 1, com gols de Hamdy e Aboutrika. Hisato Sato descontou para os anfitriões.

O ponto final da participação foi a disputa do quinto lugar, contra o Ulsan Hyundai, da Coreia do Sul. E os japoneses triunfaram de virada, pela contagem de 3 a 2. Autor de dois tentos, Sato foi o destaque do confronto. Yamagishi anotou o outro gol. Do outro lado, Mizumoto (contra) e Lee Yong descontaram.

Para a edição de 2015, ano em que o Mundial retorna ao Japão, os violetas almejam uma campanha melhor do que a de 2012. Se chegar à semifinal, já poderá se dar por satisfeito. Os melhores desempenhos do campeão do país-sede no torneio Fifa foram o título do Corinthians, em 2000, no Brasil, e o vice-campeonato do Raja Casablanca, em 2013, no Marrocos. Chegar a qualquer feito desse é um sonho.

E o que o escrete de Hiroshima pretende fazer para entrar na história é honrar a moral da lenda que lhe dá nome: unidos, os jogadores serão mais fortes.