Mais um ano, querido. Com vírgula, porque não é um ano querido. Estás mais velho, mas a beleza que sempre carregasse, ou fingiu nos últimos anos carregar, aparece lá atrás. Já. Já reconheci teus feitos. Não foi por isso que te escolhi, mas reafirmo: tão belos eles são. Foi o terceiro clube brasileiro a buscar o feito maior, o segundo dos brasileiros no Japão. Antes, só houve o Santos de Pelé e o Flamengo de Zico, duas grandes esquadras. O Grêmio de Mazaropi, Paulo Roberto, Hugo de León, China, Tarciso e Renato Portaluppi veio após, em 1983, capitaneado por Valdir Espinosa. Sobre lugares que pudeste chegar nestes 113 anos desde a fundação.

Poderia enfatizar novamente tuas glórias de calar estádios lotados e fazer pulsar o teu, saudoso Olímpico Monumental. Não. Fico tentado a isso, pois geralmente o fiz, mas a abordagem deste ano é intimista, entre eu e tu, entre tu e eu.

Sinto tua falta, meu amigo. Já te defendi em tantas, em desequilíbrio com a lógica e às vezes resgatando-a. No racional e no emocional. Defendi com dados, com estatísticas, desenrolei e enrolei faixas. Busquei datas e nomes. Fiz armas e escudos com eles para batalhar o presente. Mas há um tempo sinto o presente ausente.

Recapitulo nossos primeiros dias juntos, de esperança, de sonho, de sangue e de América do Sul. Sinto tua falta ao meu lado, com o que podes apoiar e lutar. Sinto caíres num poço que eu pensava ser tendência entre todos, mas estás degraus abaixo hoje. Sinto que olhas no espelho e não te vês, mesmo que vista todas as paredes da tua nova casa com o que um dia foste.

Foto: Omar Freitas
Foto: Omar Freitas

São imagens de um velho Grêmio na nova Arena

Sinto deixares passar oportunidades de aumentar o leque de decorações e comemorações. Sinto deixares passar a data de mais um aniversário com o que poderiam ser motivos maiores para comemorar. Nós todos juntos. Não falo e penso só por mim, mas pelos milhares e milhões que estão sempre ao teu lado, basta ver.

Mas é claro que não é fácil, veja tu mesmo e tua história. Nunca foi fácil. Há vários com objetivos semelhantes, claro que há. Sei que são momentos de transição, entre uma nova casa e dificuldades de gerir finanças. Ah, finanças. Se são elas que acabam com tantos casamentos, confesso que me chateiam. Mas é o encaminhento desse esporte que sempre vivesse.

Sei que a cada dia é mais difícil encontrar Alcindos, De Leóns, Tarcisos e Danrleis. Todos aí na volta procuram e se perguntam. Parte da imprensa pode até comparar os ídolos de clubes grandes surgidos hoje em dia com os antigos, mas a comparação de salário e serviços prestados ao clube costuma me fazer torcer o nariz.

Nisso tudo, nesse período juntos, já estivemos muitas vezes próximos das tais façanhas. Não acreditemos (somente) em sorte e azar. Claro, o futebol que nos dedicamos tem dessas. Mas é uma porcentagem dentre tantos fatores. Vi equipes com técnica e organização e a falta de um algo a mais: seja união, coragem, toda atenção para decidir... Vi também o contrário e, particularmente, me preenche mais o espírito pelo futebol ver equipes limitadas técnica ou organizadamente lutarem até o fim pela superação. Nestes anos de nós juntos, tu, já foste superado por equipes mais técnicas ou mais... focadas.

Jamais aceito a incapacidade de indignação. Nos últimos anos, estes da nova casa, já faltou técnica ou organização? Já. Mas o que realmente me incomoda e posso puxar o pronome "nos" incomoda, é perceber falta de entrega e comprometimento. Às vezes, nem é tão visível no dentro de campo, embora esperamos sempre um esforço a mais na marcação de bons jogadores, atenção redobrada para segurar resultados, bola aérea (neste aniversário em especial, merecia um texto só sobre isso) e indignação para tentar movimentações de todas as formas para furar as defesas quando és superior.

Mas discursos. Os discursos de alguns porta-vozes teus incomodam, quando resumem que "o futebol é assim" ou que, após sucessivos erros, "vamos trabalhar para melhorar". Desgasta a relação. Entende-se o pessimismo de uns torcedores. Entende-se a descrença e períodos, maiores ou menores, da desconfiança de outros. Entende-se até, tu compreenda, a desistência ou perda de tesão completa de alguns. "Não te mixa", afirma uma das citações antigas e preferidas de muitos dos teus, no sentido de não te apequenar, não te derrotar fácil e lembrar a grandeza do que já fizeste e das tantas pessoas que estão contigo. Se por agosto e setembro, bastante se ouviu falar sobre espírito olímpico, do atleta buscar o melhor, o ápice, de representar sua gente e quem torce junto, isso, na vitória ou na derrota, na boa ou na má equipe, já nos basta muito.

E não te mixa de procurar o melhor nas categorias de base, das crianças e jovens daqui e de outros estados. E não te mixa de buscar teus direitos, sabendo que o centro do país não é perto e os enfrentamentos dentro e fora de campo são constantes, mas são bandeiras nossas também. E não te mixa de fazer o teu melhor, de entregar a nós o que tu podes. A quem te viu e sente saudades. A quem te vê assim e quer te ver vencedor. A quem ainda não entende, mas logo entenderá quem tu podes ser, mas deixou de ser. Pois teus bons torcedores, Grêmio, estarão contigo, Grêmio, onde tu estiver.

Richard Ducker / Grêmio