Há 38 anos, se encerrava um dos campeonatos mais lembrados da história da Fórmula 1. No dia 24 de outubro de 1976, o inglês James Hunt, da McLaren, chegou em 3º no Grande Prêmio do Japão, e, com o abandono do rival, o austríaco Niki Lauda, da Ferrari, colocava seu nome no seleto grupo de campeões mundiais da F1 e na eternidade.

A disputa foi de uma proporção tão grande que, em 2013, o diretor Ron Howard produziu o filme "Rush - No Limite da Emoção", baseado naquela temporada. O filme, que esteve em cartaz nos cinemas do mundo todo (incluindo no Brasil), foi um sucesso de bilheteria, inclusive indicado ao "Globo de Ouro", para os prêmios de Melhor Filme Dramático e Melhor Ator Coadjuvante (com Daniel Brühl como Niki Lauda), porém, sem sucesso.

O enredo para a disputa entre os dois começou a ser formado ainda antes da temporada, quando o brasileiro Emerson Fittipaldi, bicampeão mundial e que havia ficado com o vice em 1975, saiu de forma surpreendente da McLaren para ingressar no projeto da Copersucar, primeira e única equipe brasileira na categoria. Sem grandes opções, a equipe inglesa acabou contratando Hunt, que já havia chamado a atenção com o carro da Hesketh, conseguindo a única vitória da história da equipe, no Grande Prêmio da Holanda de 1975.

Temporada começa com domínio da Ferrari e polêmica

Na primeira corrida do ano, no Brasil, a classificação já mostrava que a disputa seria parelha. Hunt, com uma belíssima volta, superou Lauda e largou na pole-position. Porém, na corrida, o inglês teve problemas no acelerador e bateu, e Lauda venceu sem grandes dificuldades. Na África do Sul, mesmo enredo: Hunt larga em primeiro, porém Lauda vence a prova, mas dessa vez, Hunt completou a prova e chegou na segunda colocação. No GP do Oeste dos Estados Unidos (a Federação Internacional de Automobilismo, FIA, para atender os desejos da Federação Americana de Automobilismo, dividiu os Grandes Prêmios dos EUA em Oeste e Leste), a Ferrari venceu novamente, mas dessa vez sem Lauda; o suíço Clay Regazzoni dominou, largando em primeiro, vencendo e fazendo a volta mais rápida. Lauda complementou a "dobradinha" da Ferrari com a segunda colocação, e Hunt, em um acidente com o francês Patrick Depailler, da Tyrrell, abandonou logo no início.

Porém, logo no quarto Grande Prêmio, na Espanha, surgiu a grande polêmica. Hunt largou na frente e venceu, mas foi denunciado que seu chassi havia passado do limite da largura traseira, o que foi confirmado pelos inspetores da FIA, que retiraram o triunfo de Hunt e o passaram para o segundo colocado, Lauda. Porém, Teddy Mayer, um dos diretores da McLaren, decidiu apelar na justiça, e só dois meses depois, foi dada a sentença: devolução da vitória e dos pontos a Hunt.

Lauda segue dominando e Hunt é novamente desclassificado

Nas duas corridas seguintes, a história se repetiu. Tanto na Bélgica quanto em Mônaco, Lauda venceu bem, Hunt abandonou; problemas de transmissão na Bélgica e de motor em Mônaco o fizeram desistir das duas corridas. Com essas vitórias, Lauda seguia tranquilo com uma vantagem de 36 pontos para o vice-líder, Regazzoni. Na Suécia, surpresa, nem Ferrari, nem McLaren venceram; Jody Scheckter, com a famosa Tyrrell de seis rodas, foi quem dominou e venceu a corrida, com Lauda em 3º, e Hunt, 5º. Na França, Hunt volta a vencer, e Lauda enfim sofre seu primeiro revés na temporada, com um abandono por problemas de motor. Na Grã-Bretanha, em casa, Hunt vence, mas em mais uma polêmica, é novamente desclassificado por problemas com o carro reserva, e dessa vez sem volta, Lauda fica com o primeiro lugar.

Acidente gravíssimo de Lauda põe campeonato em novo cenário

Na Alemanha, o cenário do campeonato mudou completamente. Lauda, ao ver a chuva e a situação do circuito de Nürburgring, pede na sexta-feira o cancelamento da prova, mas não é ouvido pela maioria dos pilotos. Na largada, vários pilotos, incluindo Lauda e Hunt, apostaram nos pneus para pista molhada, mas o longo circuito de quase 22km secou rapidamente, e a maioria foi fazer a troca para pneus de pista seca. Com isso, a McLaren de Jochen Mass assumiu a liderança. Lauda, ao tentar recuperar o tempo perdido, sofreu um dos piores acidentes da história da categoria: ao rodar, bateu, e voltou à pista com o carro em chamas, sendo atingido por Brett Lunger. Lunger e mais dois, Harld Etrl e Guy Edwards, desceram de seus carros para ajudar no resgate, junto com a equipe de socorro. O austríaco foi ao hospital em estado grave e sofreu múltiplas queimaduras severas, que lhe custaram parte da orelha direita. Hunt se aproveitou e venceu o Grande Prêmio. A teoria mais aceita para o acidente é de quebra na suspensão (como mostrado no filme "Rush - No Limite da Emoção"), mas segundo Mauro Forghieri, engenheiro de Lauda na época, foi um erro do piloto.

"Na corrida, eles (o filme “Rush – No Limite da Emoção”) mostraram o que queriam e fizeram algumas coisas falsas. Mas posso assegurar-lhe que os rapazes tinham ido verificar a máquina para ver se havia algum problema e eles garantiram que Niki (Lauda) colocou a roda traseira esquerda na sarjeta, e depois perdeu o controle do carro, causando o acidente terrível. Niki nunca quis admitir seu erro durante aquela pilotagem, se você chamá-lo, ele vai explicar como aconteceu o acidente: Lauda não queria correr, considerando o Anel muito perigoso para a F1, e havia procurado o apoio dos colegas, que, no entanto, não tinha ouvido. Então, não eram as condições ideais para dar o melhor na pista, especialmente em alguns lugares molhados" disse Forghieri em entrevista à revista italiana "Omnicorse".

Nas duas corridas seguintes, Áustria e Holanda, Hunt tenta angariar o máximo de pontos com a ausência de seu grande rival, chegando nas duas corridas em quarto (vitória da Penske de John Watson) e primeiro, respectivamente. Assim, a enorme vantagem que o austríaco tinha em relação ao inglês se reduz para apenas dois pontos.

Lauda volta, mas Hunt se sagra campeão

De forma milagrosa para muitos, Lauda volta na Itália, casa da sua equipe, Ferrari. Vê Hunt abandonar e chega em quarto, sendo ovacionado pelos torcedores. A vitória foi de Ronnie Peterson, da March. No Canadá e no Leste dos Estados Unidos, duas vitórias de Hunt, com Lauda chegando em oitavo e terceiro (seu primeiro pódio depois da volta), respectivamente. Com isso, o austríaco foi para a última corrda, em Fuji, no Japão, com apenas três pontos de vantagem na liderança.

Uma curiosidade da corrida decisiva: Hunt era, e ainda é até hoje, considerado um dos maiores playboys da F1. Isso foi retratado em sua biografia, "Shunt", de Paul Rubython. Segundo o livro, Hunt organizou uma festa no hotel no Japão com aeromoças da British Airways, que foi regada a sexo, bebidas e drogas, até a véspera da corrida. Além deles, também estava o seu amigo Barry Sheene, campeão mundial de motovelocidade naquele ano.

Na classificação, Mario Andretti colocou sua Lotus na frente, com Hunt em segundo e Lauda em terceiro. A largada no domingo foi dada sob intensa chuva, e mesmo com as reclamações das duras condições de pista, a prova aconteceu. Porém, o inacreditável ocorreu na segunda volta: alegando condições perigosas, Lauda simplesmente foi aos pits da Ferrari, se retirou do carro e abandonou a prova. Com isso, Hunt precisava de um terceiro lugar para ser campeão.

Porém, ao chegar na posição necessária, sofreu com um pneu furado e foi trocá-lo, caindo para quinto. Mesmo com pouco tempo e em uma pista extremamente molhada e perigosa, Hunt acelerou tudo que podia, ultrapassou Clay Regazzoni e Alan Jones e chegou ao terceiro lugar novamente. Andretti, que saiu em primeiro, venceu pela primeira vez em cinco anos. Mas todos os holofotes no pódio estavam para James Hunt. O inglês chegou em terceiro e se sagrou campeão do mundo. E assim se encerrou um dos maiores campeonatos da história da Fórmula 1.

Hunt conseguiu o resultado necessário numa corrida bastante chuvosa no Japão e levou o título (Foto: Getty Images)
Hunt conseguiu o resultado necessário numa corrida bastante chuvosa no Japão e levou o título (Foto: Getty Images)