A invisibilidade LGBT no meio esportivo precisa ser discutida

O dia 28 de junho é marcado pelo Dia Internacional do Orgulho LGBT. Hoje não é dia para fazer homenagens e demonstrar apoio se durante todos os outros dias você oprime, ataca diretamente e indiretamente ou utiliza orientação sexual como ofensa. A luta contra a homofobia é diária.

Após anos de incômodo e vendo as pessoas naturalizando violências de gênero no espaço do futebol, Nathália Duarte teve a ideia de criar o movimento Galo Queer, que inspirou outras torcedoras e assim veio a criação da Palmeiras Livre, Bambi Tricolor e Furacão - Sem Homofobia, esse movimento organizado tem como objetivo conquistar cada vez mais respeito e visibilidade dentro dos estádios, o trabalho requer muito esforço. 

Em pleno 2016, o ambiente futebolístico continua sendo um dos mais preconceituosos. Cada xingamento ou canto de torcida é mais uma prova da homofobia e machismo enraizados no futebol brasileiro. Torcedores insistem em ecoar cada vez mais alto suas discriminações desde o machismo até o racismo, obviamente passando pela homofobia. 

"Nesses espaços, a rivalidade não só redime e justifica qualquer ímpeto violento como os requer, faz parte da dinâmica entre as torcidas tratarem-se como inimigos, ofender da maneira mais grave que for possível - e aí as mazelas sociais, o discurso de ódio e as desigualdades fornecem o material perfeito para você atacar seus adversários", constata Juliana*, uma das fundadoras da Torcida Bambi Tricolor.

Desde criança somos instigados a proclamar gritos violentos que propagam o preconceito, porque há muitos anos os estádios são dominados por maioria masculina que insistem em reforçar sua masculinidade. Desta forma, torna-se completamente normal ofender pessoas que possam “ferir” a virilidade da torcida como um todo, principalmente se tratando de um comportamento diferente da heterossexualidade, que vira motivo de chacota e resulta na discriminação.

"Eu me ofendia com o apelido 'bambi' na adolescência por uma noção esquisita de precisar defender a honra dos homens da minha família, que são todos são-paulinos. O machismo no futebol é tão cego que nem mesmo a negatividade das ofensas homofóbicas cabem às mulheres. [...] É uma doidera. Foi muito bom amadurecer e me desprender disso, poder olhar até com algum deboche porque é realmente tudo muito tosco, muito pobre - ainda que nocivo", completou a tricolor.

A vida dos torcedores LGBT está muito longe de ser tranquila. Alguns precisam se privar de acompanhar o clube de perto por perseguições nas redes sociais. Bruna*, da Palmeiras Livre, tem receio de ir aos estádios após a página sofrer ataques e até ficar fora do ar; alguns integrantes de uma torcida organizada passaram a ofendê-la em seu perfil pessoal. Não foi a primeira vez e infelizmente não será a última que receberão mensagens com discursos de ódio.

Foto: Reprodução/Facebook
Foto: Reprodução/Facebook

E quem pensa que o problema é apenas na arquibancada, se engana. A não aceitação de um jogador que assume sua orientação sexual é motivo de muito deboche tanto por parte da mídia quanto por jogadores e torcedores no geral. A carreira de Richarlyson foi marcada por muita humilhação da própria torcida tricolor, que não cantava apenas o nome dele no início dos jogos e ainda da própria diretoria, que, devido ao episódio, pediu para o atleta cortar o cabelo.

"Nenhum jogador foi submetido a tanto desrespeito, violência e assédio quanto ele, e eu sinceramente acredito que um dia nós olharemos para a história desse rapaz com muita vergonha pela maneira com que o tratamos. Será um desses casos exemplares de como a homofobia era aceita, estimulada, praticada levianamente por todas as instâncias envolvidas com esporte, e mesmo as externas a ele", lamentou Juliana.

Tais comportamentos são fomentados pela imprensa que ironiza em manchetes apelativas e comentários desagradáveis de maneira discriminatória. Os casos de preconceito contra o público LGBT ainda são pouco noticiados. Não há tamanha comoção nacional. Não dão audiência e são essas pequenas atitudes que relevam estas condutas.

Quando a imprensa e os próprios times não fazem questão de abraçar a causa, invisibilizam ainda mais a luta e é assim que é criado o estereótipo, desta forma que os próprios LGBT não sentem vontade de acompanhar o esporte; preferem não se inserir em mais um meio tão opressor.

Seria hipocrisia dizer que há uma gritante diferença no meio esportivo após a criação dos movimentos LGBT. O progresso, porém, vem aos poucos. Não será toda vez que um grito homofóbico vai passar despercebido como passava na década passada; só deste assunto hoje ser uma pauta já é um avanço. Torcer é acompanhar e ter paixão pelo clube e não é a sua orientação sexual que vai lhe fazer mais torcedor. Seja consciente: homofobia é crime.

Devemos parar de ser tolerantes com piadinhas de mal gosto contra os homossexuais, ou então, se calar nos gritos lotados de preconceito. No início pode ser só uma voz ao se calar, mas depois podem ser todas. Devemos começar por nós e depois tentar mudar o nosso redor.

 (Camilla Rangel, organizadora da Furacão - Sem Homofobia)

O estádio é o reflexo da nossa sociedade e ela está doente. É preciso investir na educação, no respeito à diversidade e isso são coisas a longo prazo. Por ora, vamos resistindo

(Bruna, uma das fundadoras da Palmeiras Livre) 

A mudança vem de todos os setores que se dispuserem a promovê-la. [...] Para que a atmosfera fique livre disso tudo é preciso que clubes, imprensa, sociedade civil e governos se disponham a investir nisso, a reorientar as pessoas, sobretudo os mais jovens, em nome da civilidade e do respeito mútuo. 

(Juliana, moderadora da página Torcida Bambi Tricolor)

*Nomes fictícios 

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