Na ausência de Cardozo e Matic, o Benfica alinhou na Luz com o 4-2-4 que se previa, reforçando a aposta na dupla ofensiva Rodrigo\Lima e colocando, no centro do terreno, Enzo Pérez ao lado do médio defensivo Fejsa. A grande surpresa surgiu na ponta esquerda da linha defensiva encarnada: Bruno Cortez foi chamado à titularidade, relegando para o banco de suplentes André Almeida. O Arouca alinhou com o seu 4-3-3 habitual, feito de linhas muito aproximadas, a técnica apurada de David Simão e a experiência de Bruno Amaro no miolo, com a irreverência de Ceballos e Pintassilgo nas extremidades do ataque forasteiro.

Golias surpreso com golo de David

O Benfica cedo começou a mostrar as garras, mas os de Arouca não se deixaram intimidar, antes pelo contrário: Pintassilgo ganhou o flanco a Cortez, para depois ganhar a falta que permitiu a David Simão inaugurar o marcador, aos 18 minutos. Na Luz, o frio da noite ganhou proporções dramáticas, o Golias estava, apesar do domínio, a cair aos pés de um pequeno David de Arouca, ainda por cima antigo jogador encarnado: David Simão. O dramatismo do resultado acentuou-se com os sucessivos falhanços de Lima e de Rodrigo, cujos remates, ora com os pés, ora com a cabeça, teimavam em levar todas as direcções menos a da baliza de Cássio. O Benfica passou os primeiros 45 minutos a cheirar intensamente o golo, mas este apenas surgiu por uma vez, por intermédio de Rodrigo, que encostou para a baliza depois de uma boa combinação entre Gaitán e Maxi, desenrolada no flanco direito. Decorria o minuto 40.

Artur encaixou um golo tirado a papel químico deste, frente ao Estoril, na época passada

Sulejmani e Funes Mori de pouco adiantaram

Jorge Jesus veio dos balneários com um ímpeto ofensivo de risco: retirou Cortez para colocar Sulejmani, puxando Gaitán para baixo, fixando-o na posição de lateral esquerdo. Funes Mori entrou mais tarde, aos 62 minutos, mas o futebol encarnado continuou previsível, mastigado e sem pejo de organização capaz surpreender o Arouca. Com um meio-campo imperceptível e despovoado, as «águias» travavam-se a si mesmas na altura de atacar, circulando a bola num pueril jogo inofensivo. Com um Fejsa estático, apenas Enzo pegava na batuta cerebral que empurrava, a bochechos sinápticos, o Benfica para a frente. Pedro Emanuel tirava nabos da púcara, segurando o empate com relativa facilidade: à medida que a segunda parte se gastava, o Arouca adormecia o Benfica e preparava aquela que seria a segunda surpresa da noite.

Serginho para acicatar a surpresa

Aos 74 minutos, a Luz voltou a ficar de boca aberta: Pintassilgo, descaído para o lado esquerdo da desguarnecida pequena área, cruzou de costas para a entrada de cabeça de Serginho, completamente isolado na quina contrária da área. Golo tremendamente facilitado por uma defensiva encarnada desconcentrada e desligada da partida.
Defendendo o lance como um harmónio descontrolado, oscilando ao sabor da marcação «a olho», a defensiva benfiquista descoordenou-se por completo e ficou à mercê do lance estudado do Arouca, que usou uma táctica habitual nos encarnados para fazer o 1-2: Gaitán esquece-se de Pintassilgo, que cruza para Serginho, também totalmente esquecido, de baliza escancarada: pecado seria falhar.
O empate surgiu através de uma grande penalidade convertida por Lima, aos 83, que ainda teve o condão de despertar as bancadas vermelhas, mas não a equipa, que, de modo apático, se deixou morrer no lento morrer de um jogo mal jogado, repleto de paragens incompreensíveis, tempos mortos, vícios de boca arbitrários e fraca qualidade exibicional. Nos últimos minutos os encarnados, já com Ivan Cavaleiro em campo, bem tentaram marcar, mas a verdade é que nunca souberam como o fariam. Luisão acabou a ponta-de-lança, mas nem o «girafa» quebrou com a desilusão do empate. Com um tento de David Simão, onde Artur parece ter sido mal batido, e com outro de Serginho, acabado de entrar na partida, o Benfica perdeu dois pontos contra o Arouca, recém-promovido à Liga Zon Sagres, que até ao final do jogo de hoje apenas tinha 8 pontos, os mesmo que o lanterna vermelha, Paços de Ferreira. O Arouca agarrou o empate e teve o mérito de pasmar, por duas vezes, o vice-campeão no seu próprio estado.

Um Benfica que só enganava quem queria ser enganado

Depois da efémera mudança para o 4-3-3, nos idos duelos contra o Olympiakos e Sporting, o Benfica nunca mais se apresentou num declarado e inequívoco sistema com três médios centrais, dois extremos e um avançado, apesar das nuances tácticas e das momentâneas alterações organizacionais. Desde então, três jogos com muita confusão estrutural à mistura, mudanças tácticas e um futebol encarnado mastigado, aos solavancos e pleno de incerteza: primeiramente, o fraco jogo contra o Braga, depois a vitória atabalhoada contra o Anderlecht e, na semana passada, o triunfo pouco convincente em Vila do Conde. Hoje, em plena Luz, o Benfica voltou a apresentar o seu habitual 4-2-4, e de regresso esteve o fraco futebol, a passividade colectiva e a desagregação técnico-táctica. É caso para se dizer que este Benfica pós-4-3-3 só enganava quem estava disposto a ser enganado. O empate caseiro compromete a liderança e expõe as insuficiências estruturais deste Benfica de Jesus.