Seja qual for o país, as copas nacionais costumam ser redutos de muitas "zebras". Na Copa da França isto não seria diferente. Resultados como as eliminações de Lorient (0 a 1 vs. Yzeure, da quarta divisão) e Saint-Étienne (1 a 1 vs. Cannes, da quarta divisão; 3 a 4 nos pênaltis), da Ligue 1, e Créteil Lusitanos (0 a 1 vs. Jura Sud, da quarta divisão) e Istres (1 a 1 vs. Monts d’Or Azergues, da quarta divisão; 2 a 3 nos pênaltis), da Ligue 2, para times das divisões inferiores chamaram a atenção nas últimas semanas.

Mas, sem dúvidas, o jogo que envolvia mais história dentro das quatro linhas era o que colocava Cannes e Saint-Étienne frente a frente no Stade Pierre-de-Coubertin, na cidade homônima. Conhecido por sediar anualmente o Festival Mundial de Cinema de Cannes, o maior da categoria, o município também tem tradição no futebol, mais precisamente nas categorias de base.

Tradição manchada por más administrações

Fundada em 1902, a Association Sportive de Cannes Football é conhecida por revelar jogadores como os meia-atacantes Zinedine Zidane e Johan Micoud, o meio-campista Patrick Vieira, o lateral-esquerdo Gäel Clichy, o goleiro Sébastien Frey e o zagueiro Jonathan Zebina. Em competições envolvendo as categorias de base, o Cannes já conquistou a Copa Gambardella, que reúne as equipes sub-19 da França, duas vezes, em 1955 e em 1995.


Zidane, que divide o posto de jogador mais importante da história da França com Platini, foi revelado pelo Cannes (Foto: cap-football.com)

No futebol profissional, os melhores resultados obtidos foram os vice-campeonatos do Campeonato Francês e da Copa da França, ambos no ano de 1932. A última vez que os Dragons Rouges estiveram na elite do futebol francês foi na temporada 1997-1998, quando foram lanternas da Ligue 1 com 28 pontos conquistados em 34 jogos (àquela época, a competição tinha apenas 18 integrantes). Seu maior rival é o Nice, com quem faz o famoso Derby de la Côte d’Azur.

Em competições internacionais, os Dragões estiveram presentes na antiga Copa da UEFA nas temporadas 1991-1992 e 1994-1995. Na primeira oportunidade, eliminou o Salgueiros, de Portugal, na primeira fase (1 a 1 no placar agregado; 4 a 2 nos pênaltis) e caiu diante do Dynamo Moscou, da antiga União Soviética, no round seguinte (2 a 1 no agregado). Na segunda participação, fez história ao eliminar o Fenerbahçe, da Turquia (9 a 1 - isso mesmo! - no marcador agregado). No entanto, foi despachado pelo Admira Wacker, da Áustria, na segunda fase (5 a 3 no agregado).

De lá para cá, o clube colecionou muitas decepções e dívidas. Após a queda para a segunda divisão em 1998, caiu para o terceiro escalão pela primeira vez em sua história na temporada 2000-2001, quando terminou a Division 2 (atualmente denominada Ligue 2) na 19ª posição. No Championnat National, passou vários anos batendo na trave na luta pelo acesso e em algumas edições chegou a perder pontos por problemas administrativos, até ser mandado para o Campeonato Francês de Amadores (quarta divisão) pelo mesmo motivo em 2011. E é lá onde está até hoje.

Apurações na Copa da França

Na terça-feira, dia 14, o Cannes tinha ninguém mais e ninguém menos que o Saint-Étienne, maior campeão francês com 10 taças conquistadas e detentor de 6 canecos da Copa da França, além de 1 da Copa da Liga, como adversário na Coupe de France, competição na qual já havia eliminado o Biguglia, da sexta divisão (1 a 0), e o Troyes, da Ligue 2 (2 a 1). Obviamente, os Verts eram os favoritos. No entanto, a partida provou uma das máximas do futebol: "São 11 contra 11".

Aos 20 minutos, o brasileiro Brandão abriu o placar para o ASSE, mas nada que desanimasse a equipe da casa. Quando o relógio marcava 25 minutos do segundo tempo, Darnet deixou tudo igual no marcador. O empate no tempo normal forçou a realização de uma prorrogação.

O jogo também foi marcado por duas expulsões, uma para cada lado: Polomat, do Saint-Étienne (na segunda etapa do tempo normal), e Jamaï, do Cannes (no segundo tempo da prorrogação), foram punidos com o cartão vermelho. A igualdade no placar persistiu no prolongamento e levou o duelo à disputa de pênaltis. Nas penalidades, brilhou a estrela do goleiro Gavanon e os mandantes venceram por 4 a 3. Apesar de o resultado ser considerado uma "zebra", pode-se dizer que o ASCF honrou suas tradições.


A classificação foi dramática, mas veio (Foto: backpagefootball.com)

Agora, na fase de 32 avos de final, os alvirrubros enfrentarão o Plabennec, que também milita no quarto escalão atualmente. O jogo ainda não tem data definida. Qualquer que seja o resultado, o elenco já está ciente de que chegou longe, mas pode fazer muito mais para que o clube o qual defende volte a ser respeitado. O respeito, aliás, parece ser um sentimento que não pertence aos dirigentes os quais levaram os Dragões Vermelhos ao ostracismo e estão quase levando-o à falência.

O resultado da última terça e a boa campanha na atual edição do Championnat de France de amateur football (o time está em 5º no Grupo C com 35 pontos, apenas 3 atrás do líder Marseille Consolat - só o líder do grupo é promovido à terceira divisão) fazem a torcida ter a esperança da vinda de dias melhores.