Steven Gerrard e Frank Lampard são lendas de seus respectivos clubes. Ambos os jogadores, apesar de já não viverem seus momentos de auge, tem um talento incontestável e são extremamente respeitados por qualquer um - desde um adversário, passando por um companheiro de equipe e até um mero espectador. Não há dúvidas sobre o que cada um desses diferenciados meio-campistas podem fazer dentro das quatro linhas, mas quando o assunto se estende até a seleção nacional é que as contestações começam a aparecer - e com justiça. 

Até que ponto é correto utilizar os dois ao mesmo tempo, sendo que ambos, a princípio, desempenham função bem semelhante? Essa questão ronda a cabeça de muita gente há bastante tempo, mas tendo em vista a Copa de 2014 ela pode ser melhor - e facilmente - respondida agora.

Michael Carrick cada vez mais demonstra ser a resposta para o enigma que Roy Hodgson herdou de Fabio Capello, Steve McClaren e Sven-Goran Eriksson, o último em menor proporção. Todos esses comandantes tiveram o mesmo problema para resolver, mas o atual dono da casamata inglesa parece ter uma solução bem debaixo do seu braço. O meia, revelado no West Ham - assim como Lampard -, aperfeiçoado pelo Tottenham e desde 2006 um dos pilares do poderoso Manchester United tem tudo para ganhar suas merecidas oportunidades aqui no Brasil.

Levando em conta que a grande maioria das principais equipes do momento - e dos últimos anos - utilizam esquemas, filosofias e estratégias ofensivas e prezam pela movimentação, dando um brilho mais do que enorme para as peças de destaque lá na frente, temos que saber reconhecer a importância dos que sacrificam suas eventuais aparições no ataque para dar o suporte e sustentação que todo expressivo time necessita.

Carrick é exatamente esse tipo de jogador. Sua fundamental participação nas últimas - e vitoriosas - campanhas dos diabos vermelhos vem ganhando devido reconhecimento, e na Seleção da Inglaterra, quando recebe a chance, o meia desempenha, com primor, praticamente o mesmo papel. Vamos à algumas situações e panoramas costumeiros nos jogos da esquadra britânica.

A última - e decisiva - partida da equipe nas Eliminatórias, uma vitória por 2 a 0 diante da Polônia, que sacramentou a classificação para o torneio mundial, pode ser utilizada para observarmos as atitudes do inglês em campo. Lampard e Gerrard são extremamente admirados pela capacidade de ataque e faro de gol, logo, tendo isso em seus instintos, qualquer um dos dois partem pra cima de seus oponentes com frequência - e é a partir disso que surgem os problemas de quando jogam juntos. No caso em questão, o atleta do Liverpool foi quem atuou, e era presença assídua - e fundamental - nas jogadas ofensivas do time de Hodgson; em todas as vezes que se envolvia, Carrick ficava na cobertura com a missão de parar possíveis contragolpes do adversário.

Mais do que isso, o jogador era o grande ‘maestro’ da equipe; se não todas, diversas bolas passavam por seus pés antes de chegar em alguma das peças da linha de frente. Com uma distribuição de jogo impecável, tanto quando direcionava passes curtos ao centro - para Rooney, Sturridge e até mesmo Gerrard - quanto nas horas que resolvia dar amplitude aos lances efetuando lançamentos aos flancos, tendo Welbeck e Townsend como principais alvos.

  

  

Resumindo, Carrick foi o cérebro do time. Ele controlou o andar da carruagem durante os noventa minutos, se envolvendo nos mais variados cenários. Leighton Baines, lateral-esquerdo talentoso e que tem no ataque suas principais armas, frequentemente percorria o corredor e deixava um buraco lá atrás. Michael se deslocava e preenchia a lacuna, fazendo o mesmo, com menor intensidade, quando Chris Smalling - zagueiro de ofício, improvisado na direita - ousava a atravessar a linha de meio campo. Kyle Walker ou Glen Johnson, cotados para assumirem a posição em junho e julho, ambos laterais de origem e que costumam participar das jogadas ofensivas com maior regularidade, dariam mais espaço ainda. Essa, por exemplo, é uma situação que Lampard teria dificuldade em lidar e poderia acabar comprometendo sua equipe.

Para ser mais direto, sua escalação foi um grande acerto e Hodgson deve mantê-lo se quiser afastar os maus ares que pairam sobre a seleção recentemente e traçar planos maiores que uma mera participação na Copa. O red devil é, indiscutivelmente, quem melhor complementa e até eleva o nível do seu rival do Liverpool. Essa certeza pode até parecer estranha, mas a alta inteligência e ótima leitura do jogo tanto de Carrick quanto de Gerrard faz com que tal combinação dê tanto resultado e, ao mesmo tempo que seja efetiva, dê prazer à quem está os assistindo.

“No futebol moderno você não precisa de desarmadores da mesma maneira que acontecia há algum tempo. Não existe necessidade para isso. Tudo se resume a antecipação e leitura do jogo”, foi um dos trechos de uma declaração de Sir Alex Ferguson sobre o meio-campista que até pouco tempo estava sob sua batuta, e exemplifica a verdadeira essência do estilo do jogador. O inglês pode não ser - e definitivamente não é - aquele que usa e abusa da força, distribui carrinhos desgovernados pra tudo quanto é lado e coleciona advertências, mas tem uma eficiência de alto nível e desempenha tal função, tão importante nos dias atuais, como poucos - na Inglaterra, como ninguém, podemos dizer. Portanto, é seguro afirmar que Michael Carrick já tem seu passaporte às terras tupiniquins carimbado, e está próximo de assegurar sua vaga entre os titulares dos Three Lions.

*Foto: Reprodução/Daily Mail