Vivemos um momento de muita controvérsia nas opiniões dentro do mundo do futebol. Mesmo que nunca antes na história foi possível ter tanto material, conteúdo e ferramentas para embasar análises, a transição do que consistia o esporte para aquilo que está se tornando pode confundir bastante gente. A exorbitante transferência de Neymar para o Paris Saint-Germain é um dos grandes exemplos. Um lado da moeda pende para as críticas ao 'egoísmo’ do atleta e outro aponta sua coragem de deixar uma constelação de estrelas para ser uma solitária na França. Existem argumentos válidos para todos os casos, é claro, mas parecem esquecer de vários aspectos bem visíveis.

O primeiro da lista é óbvio e devia ser considerado por todos aqueles que criticam o negócio: se trata de uma escolha pessoal. Sabemos da influência que seu pai tem nas idas e vindas da carreira e o próprio staff carrega uma boa parcela de responsabilidade em cada movimento, só que o planejamento de vida parte de um ser humano. Se a vontade do brasileiro é construir uma trajetória com os mais variados desafios, explorando diversos polos do beautiful game, não há nada para se questionar. Caso o desempenho deixasse a desejar ou o extra-campo realmente fosse algo preocupante (como alguns da mídia tentam pintar), poderíamos levantar algumas interrogações.

Mas o cenário é diferente; estamos tratando de um fenômeno mundial, daquele menino que está sendo trabalhado como uma marca progressiva desde os 12 anos de idade. Saiu da periferia e sempre deixou claro - geralmente nas entrelinhas ou por intermediários, isso é verdade - que pretendia conquistar o mundo. E tem potencial para tal, como pudemos perceber antes do planeta inteiro quando destruía defesas nacionais semana após semana. Tinha acumulado 136 gols com míseros 21 anos de idade, período em que decidiu se desenvolver na Europa. E como teve sucesso, né? Novelas burocráticas à parte, o jogador engatilhou uma evolução que pouquíssimas promessas conseguiram.

Nem precisamos falar de Robinho, Kaká ou Ronaldinho, já que a capacidade de Neymar supera qualquer um. E, por certo pessimismo criado pelo relativo fracasso dos nomes supracitados, se liam alguns absurdos lá por 2013. Mencionaram que não existiria encaixe com o estilo paciente e de troca de passes exaustiva do Barcelona; se tornou em uma peça capaz de quebrar a previsibilidade do sistema e fez com que treinadores mudassem a sagrada filosofia do time para potencializá-lo. Que não se daria bem com Messi, uma personalidade tão diferente e supostamente  um ‘ditador’ no vestiário do Camp Nou; se tornaram amigos pessoais com entrosamento dentro e fora de campo.

Foto: Reprodução/Sport
Entrosamento não faltou entre os dois craques culés, mas por lá Rei só existe um; Neymar pode seguir seu caminho (Foto: Reprodução/Sport)


Falaram, também, que não corresponderia a expectativa na Seleção Brasileira. Afinal de contas, era comum ver atletas atuando em 60, 70% do nível que atingem por seus clubes. O garoto foi lá e passou por cima dessa desconfiança também. Carregou aquela equipe mediana de Luiz Felipe Scolari para a semifinal da Copa, finalmente trouxe a medalha olímpica batendo o pênalti decisivo (em um momento que mídia e população caiam em cima dele a cada ação) e fica até difícil lembrar de uma partida fraca com a amarelinha. Vai ser o maior artilheiro da história em breve - faltam 25 gols para alcançar o número de Pelé - e as perspectivas são ótimas.

Dentro das quatro linhas, essa transação representa um pedido de liberdade. Não é como se ele não fosse parte de um dos melhores trios de ataque de todos os tempos, mas sim no sentido da confiança para fazer o que bem deseja. Neymar tem a capacidade de comandar um time e ser o centro de todos os movimentos, sendo utilizado como referência e ao mesmo tempo potencializando o desempenho daqueles sortudos por estarem ao seu lado. Na Catalunha essa referência era, e sempre será, Lionel - algo totalmente plausível. E, mesmo não sendo tão genial quanto o argentino, falamos de uma peça do mesmo patamar de ‘especiais’. Pode fazer história com protagonismo, algo que todos os gigantes fizeram.

O que há de errado nisso? No Parc des Princes terá a plataforma perfeita - nesse exato momento - para marcar seu nome. Chega em uma agremiação que, apesar da grife criada nos últimos anos, ainda não representa tanto no cenário mundial. Selou sua ida pela confiança no seu taco, acreditando ser capaz de mais carregar a brand Neymar Jr. para Paris do que colher algo já existente lá. Enxerga uma lacuna a ser preenchida tanto no seu destino quanto em suas próprias vontades pessoais. Com um passe livre em campo, companheiros  de alto nível e a motivação extra de um desafio totalmente distinto, os ingredientes estão na mesa. O resultado ainda não sabemos, mas a história nos proíbe de duvidar do novo camisa 10 dos parisiens. Não dá muito certo, e se pretendem seguir esse caminho, aconselho que mudem de lado - ou desistam. Uma das narrativas mais interessantes do esporte está criada.

Foto: Reprodução/Twitter
Em Paris, nunca existiu alguém do tamanho dele - e é isso que deixa a história interessante (Foto: Reprodução/Twitter)


 

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