Nos últimos anos, a Itália vem sendo dominada com tranquilidade por apenas uma equipe, a Juventus. Recentemente, sua principal adversária foi a Roma, vice-campeã da Serie A em 2013/14, 2014/15 e 2016/17. No entanto, os giallorossi não vêm conseguindo repetir o mesmo padrão de competitividade na atual temporada, com Eusebio Di Francesco comandando o time. Contratações e nível dos jogadores à parte, existe uma mudança absolutamente necessário para os lupi: mudar o esquema tático.

Desde que o francês Rudi Garcia, que havia encantado com o Lille de Gervinho e Hazard, chegou ao clube, a principal formação utilizada passou a ser o 4-3-3, como diversos times ao redor do mundo resolvem escalar suas equipes. Uma linha de quatro na defesa, um volante, dois meio-campistas centrais, dois atacantes abertos, podendo cortar para o meio para definir ou tabelar com os laterais, e um centroavante de referência.

Para muitos, funciona e vem sendo uma "tática de segurança", visto que não precisa de tantas adaptações e é fácil traçar o perfil dos jogadores que a equipe precisa ter em seu elenco para que ela funcione. No entanto, para a Roma, ela é ultrapassada. Este texto tentará mostrar o motivo.

Rudi Garcia: francês começou reformulação, quebrou recordes e empolgou em 2013/14

Depois de uma temporada como presidente romanista e um vice-campeonato da Copa Itália contra a Lazio, o americano James Pallotta operou uma grande reformulação no clube da capital para a disputa da Serie A em 2013/14. Tanto o elenco quanto a comissão técnica passaram por grandes mudanças. Marquinhos, Piris, Bradley, Lamela, Stekelenburg e Osvaldo, titulares na equipe de Zeman e Andreazzoli, foram vendidos nas janelas de transferências.

O técnico Rudi Garcia, campeão da Ligue 1 e da Copa da França com o Lille na temporada 2010/11, chegou para comandar um plantel com diversos jovens. E parecia que o francês poderia ser a cara da Roma para os próximos anos. Com as contratações de De Sanctis, Maicon, Benatia, Strootman, Gervinho e Ljajic, a espinha dorsal da equipe estava montada. Nainggolan ainda reforçou os giallorossi em janeiro.

Com um futebol bastante ofensivo, a ideia era ter De Rossi como volante de contenção, mas que poderia ajudar na construção de jogadas, Dodô e Maicon avançando bastante pelas alas e dando suporte a Florenzi e Gervinho, pontas que apareciam muito para finalizar. Em inúmeros momentos, Totti, já sofrendo por conta da idade, recuava para fugir dos defensores, evitar o contato físico e distribuir a bola para os atacantes abertos. Pjanic complementava a função de armador, e Strootman (ou Nainggolan) era o meio-campista área-a-área perfeito, chegando com qualidade ao ataque e defendendo com muita intensidade. (Time-base: De Sanctis; Maicon, Benatia, Castán, Dodô; De Rossi, Strootman/Nainggolan, Pjanic; Gervinho, Totti, Florenzi)

O começo não poderia ser melhor: os romanistas bateram o recorde da Juve de 2005/06 e atingiram o melhor início de Serie A da história, com dez triunfos consecutivos. A defesa formada por Leandro Castán e Benatia era uma das mais sólidas da Europa, tendo levado apenas oito gols no primeiro turno - três deles contra a Juventus, única derrota da equipe - do campeonato. O ataque prosperava: Gervinho e Totti lideraram a liga em assistências (10), e Florenzi esteve entre os melhores (7). O vice-campeonato italiano e a volta à Champions League após quatro anos pareciam excelentes, até porque a campanha romanista foi de título: 26 vitórias, sete empates, cinco derrotas. Foram 85 pontos no total, mais do que cinco dos seis campeões desde 2008/09. 

2014/15: temporada irregular, massacre do Bayern e problemas psicológicos

O futuro parecia brilhante, mas a Roma foi decaindo com o tempo. Para 2014/15, a base da equipe foi mantida, e os reforços foram pontuais. Sem Dodô ou Balzaretti, Holebas assumiu a titularidade na lateral-esquerda. Após a saída traumática de Benatia, o grego Kostas Manolas manteve o nível na defesa. Yanga-Mbiwa, Paredes, Seydou Keita e Juan Iturbe - um fracasso que custou 22 milhões de euros - também compuseram o elenco. Doumbia - um fracasso de 14 milhões de euros - e Ibarbo chegaram em janeiro, mas pouco adicionaram.

Iturbe custou 22 milhões de euros, mas o retorno dentro de campo foi pífio (Foto: Mario Carlini/Iguana Press/Getty Images)
Iturbe custou 22 milhões de euros, mas o retorno dentro de campo foi pífio (Foto: Mario Carlini/Iguana Press/Getty Images)

O início da temporada até que foi bom. Foram sete jogos de invencibilidade - incluindo um 5 a 1 contra o CSKA Moscou e um empate fora de casa contra o Manchester City pela Champions - até que uma derrota com arbitragem questionável ante à Juventus, por 3 a 2, marcou o primeiro revés romanista, em 5 de outubro.

Dezesseis dias depois, no jogo de ida contra o Bayern de Munique, no Olimpico, um golpe duríssimo: 7 a 1 para os alemães, diante de 70 mil torcedores incrédulos. Em dezembro, a eliminação da UCL, após derrota por 2 a 0 contra o City, também em casa. Desde então, o que se via era uma Roma com pouca criatividade e que sofria para se impor dentro de campo. O time não perdia, mas empatava. E muito. Na Serie A, foram absurdos TREZE empates, a maioria deles contra equipes menores, muitos dentro de casa.

Queda de rendimento de Totti e ineficiência de Iturbe "mataram" esquema de Garcia
Queda de rendimento de Totti e ineficiência de Iturbe "mataram" esquema de Garcia

Garcia apontava que o problema não passava pela técnica, mas sim pelo aspecto psicológico, utilizando até mesmo a derrota para o Bayern como um trauma. No entanto, o esquema do francês já sofria seus primeiros sinais de deterioração: Totti não mantinha o nível, e Destro, teoricamente seu sucessor, não emplacava. Doumbia, também contratado para ser o goleador, foi horrível na Itália. Ljajic e Iturbe, que assumiram uma posição no ataque - com Florenzi recuado para a lateral -, não produziam.

Os giallorossi sofreram apenas seis gols a mais do que em 2013/14, mas a fase ofensiva caiu muito: 72 gols (13/14) a 54 (14/15). Os resultados na Serie A acabaram sendo os mesmos: uma segunda colocação, mas já com gostinho amargo pelo futebol extremamente irregular do fim de temporada romanista.

2015/16 e 2016/17: Fim da linha para Garcia e lampejos de inovação com Spalletti

Se a defesa romanista havia sido o ponto forte da equipe nas temporadas anteriores, Garcia não conseguiu atingir a mesma solidez em 2015/16. O ataque, totalmente reformulado, tinha Totti no banco, Ljajic e Destro fora do clube, e Falqué, Salah e Dzeko titulares. Iturbe, Doumbia e Gervinho deixaram a capital em janeiro, para a chegada de Perotti e El Shaarawy. O esquema, entretanto, não mudou. O 4-3-3 do francês ainda era o mais repetido.

E os resultados e atuações se tornaram ainda piores. A frágil defesa giallorossa sofreu absurdos 16 gols nas seis rodadas da fase de grupos da Champions - seis numa só partida, contra o Barcelona - e atuações sofríveis contra BATE Borisov e Bayer Leverkusen, além de tropeços contra times como Sassuolo, Hellas Verona, Sampdoria e Atalanta na Serie A. Pjanic era sobrecarregado por não ter a ajuda de Totti para armar o jogo. A bola pouco chegava a Dzeko - que atuava mal -, e Salah e Falqué não eram goleadores. O que se via era uma equipe dependente das bolas paradas de Pjanic. A eliminação da Copa Itália contra o Spezia, da Serie B, tira Garcia do comando da equipe.

Spalletti levou bom futebol de volta aos giallorossi (Foto: NurPhoto via Getty Images)
Spalletti levou bom futebol de volta aos giallorossi (Foto: NurPhoto via Getty Images)

O velho conhecido Luciano Spalletti é anunciado como treinador para o ano de 2016 e tenta, antes de mais nada, um choque psicológico nos atletas. Dentro de campo, a base tática era a mesma, mas o estilo de jogo mudou. Mais direto, o italiano abusava da capacidade de dribles de Salah e Perotti - contratado na janela de inverno - para quebrar as linhas defensivas. Os resultados aparecem, com oito vitórias consecutivas na Serie A. A terceira colocação e classificação à Champions saem até como lucro, depois do péssimo começo. Pjanic termina o ano como líder em assistências (12). 

As mudanças aparecem mesmo na temporada 2016/17. Algumas delas são forçadas com a saída de Pjanic para a Juventus. Com Strootman de volta, Spalletti passa a utilizar Nainggolan em nova função, mais avançado, e a Roma passa a atuar num 4-2-3-1. A armação de jogadas melhora infinitamente com três jogadores atrás de Dzeko, e o camisa 9 ressurge como goleador. A defesa se ajusta com Federico Fazio e Manolas na dupla de zaga, mas ainda sofre com seus laterais Bruno Peres e Emerson, que aparece como grata surpresa no ataque, mas sem tanta consistência defensiva. Sem Florenzi, sofrendo com lesões no joelho, Antonio Rüdiger chegou a ser utilizado como lateral-direito, mas não empolgou.

Os giallorossi voltaram a ficar muito próximos do título, terminando apenas quatro pontos atrás da Juve, mas amargando a segunda colocação. Luciano Spalletti também tentou, em dados momentos, emplacar um esquema com três zagueiros, em um 3-4-2-1 que tentava potencializar a ofensividade de Peres e Emerson, se aproveitando da velocidade de Manolas e Rüdiger - ou Juan Jesus - para recompor a última linha de defesa. Foi o único momento em cinco anos onde algum técnico romanista tentou fugir do 4-3-3 implementado por Garcia, já que, após a aposentadoria de Totti e o fim do ciclo de Spalletti, a Roma tentou apostar em Eusebio Di Francesco, técnico do Sassuolo, que voltou ao esquema.

Spalletti tentou utilizar três zagueiros na capital, mas faltou entrosamento e costume à formação (Foto: Reprodução/Transfermarkt)
Spalletti tentou utilizar três zagueiros na capital, mas faltou entrosamento e costume à formação (Foto: Reprodução/Transfermarkt)

Eusebio Di Francesco: Boas ideias, reforços mal aproveitados e caminhos para o futuro

Em sua primeira temporada sem a lenda Francesco Totti, os romanistas mantiveram o padrão de contratações: principalmente apostas para o futuro e jogadores que possam dar retorno financeiro em curto e médio prazo. Não vem dando certo. Seja por nível técnico ou pela tática engessada do comandante, a Roma parece ser facilmente previsível e não representa, nesse momento, uma ameaça aos principais rivais.

O ponto alto da equipe vem sendo o goleiro Alisson e isso já demonstra algum problema. Apesar de grandes atuações esporádicas - como nos jogos contra o Chelsea, pela Champions League -, o que se vê é uma Roma que tropeça contra times mais fracos - empates contra Chievo, Genoa, Sassuolo e Sampdoria - e demonstra ter pouco poder de criação dentro de campo. Atualmente, o time alinha com: Alisson; Florenzi, Manolas, Fazio, Kolarov; De Rossi, Strootman, Nainggolan; Perotti, Dzeko, El Shaarawy. A escalação parece boa, mas já expressa um grave problema: não houve reposição para Salah, e o Faraó tem de jogar num lado onde não está acostumado.

Seguro: Alisson vem sendo um dos melhores goleiros do mundo na atualidade (Foto: Giuseppe Bellini/Getty Images)
Seguro: Alisson vem sendo um dos melhores goleiros do mundo na atualidade (Foto: Giuseppe Bellini/Getty Images)

Schick e Defrel, que teoricamente seriam a opção para a ponta direita, fazendo a função de "avançados interiores", cortando para o meio e finalizando, dando apoio a Dzeko, pouco jogaram por ali em suas carreiras. Ambos têm mais experiência jogando centralizados. Com Nainggolan novamente recuado, a equipe perdeu força ofensiva e Dzeko, outrora um bomber espetacular, não vem repetindo as mesmas atuações. O bósnio sai da área, busca jogo, faz tabelas, mas nem sempre tem grandes oportunidades pois a bola não chega.

De Rossi, à frente da linha de zaga, não mostra a mesma mobilidade de seu auge e acaba prejudicando a equipe na fase defensiva. Com sua lesão na panturrilha, Strootman assumiu a posição de volante e a dinâmica de criação contra a Inter foi imensamente diferente, já que o holandês ocupa muito mais espaço e mantém a qualidade na saída de bola e também realiza marcação firme, agressiva e precisa.

Caminhos a seguir: esquema com três zagueiros surge como opção

Para fugir da mesmice e dar uma nova cara à equipe romanista, não é difícil pensar em alternativas, ainda que o elenco que Di Francesco tem nas mãos possa ser considerado limitado em termos de opções e variação de estilos. A primeira delas que vamos apresentar neste texto é um 3-5-2. Nota: em todas elas, se cobra a utilização maior de Héctor Moreno, zagueiro com boa saída de bola e razoável velocidade, e a reserva para De Rossi, por motivos já citados anteriormente.

No esquema acima, as principais características da Roma são potencializadas: Florenzi e Kolarov, laterais com muita capacidade ofensiva, ganham mais liberdade pois Moreno e Manolas têm velocidade suficiente para suportar eventuais ataques pelas costas de seus alas. Fazio, pelo centro, seria a barreira anti-aérea da defesa e mais um com bom passe, tal qual o mexicano a seu lado esquerdo.

Strootman faz a função de meio-campista área-a-área, ocupando espaços e sendo fundamental tanto no ataque quanto na defesa, ajudando a organizar de trás e sendo o principal marcador. Pellegrini, mais solto, pode encostar com Florenzi pela direita e apoiar as subidas do companheiro. Nainggolan, mais avançado - como Spalletti costumava escalá-lo - pode voltar a ser mais prolífico e ser a segunda opção para marcar. Perotti tem total liberdade para flutuar entre as linhas de defesa e jogar onde encontrar espaço, servindo principalmente Dzeko, que seria a grande referência do ataque.

Nessa variação do 4-5-1, a Roma tem Perotti como segundo atacante, pronto para apoiar a subida dos meias Bruno Peres - que sofre com a marcação - e Cengiz Ünder. Nesse caso, o turco entra por eliminação: seria o único com certa capacidade de atuar na posição. Nainggolan segue presente em ambas as fases, e Strootman pode fazer até mesmo um papel de regista, armando o jogo de trás, ou subindo ao lado do Ninja no ataque. 

Na defesa, os alas têm o reforço dos dois meias que atuam abertos para dobrar a marcação em pontas adversários e Nainggolan e Strootman formam a primeira linha de contenção. 

Caso Dzeko se transfira para o Chelsea, a solução é simples: aproveitar Schick e Defrel em suas posições de origem. Nenhum dos dois teve muito espaço na capital, principalmente por conta de lesões. Quando jogaram, tiveram de atuar abertos e foram mal. No 4-4-2 diamante (ou 4-1-2-1-2), ambos podem formar dupla de ataque com bastante mobilidade. Schick, com 1,87m, serve como referência. Perotti, nesse esquema, perde um pouco de sua liberdade, mas pode aproveitar os espaços abertos pela movimentação dos jogadores à sua frente para chegar à área.

Strootman, novamente, aparece como regista. Ninja e Pellegrini ajudam a complementar o ataque, hora abrindo e tabelando com laterais, hora fechando pelo centro e aparecendo como finalizadores.