“Quem vai marcar o Mané?” A pergunta, antes capaz de fazer até o zagueiro mais experiente tremer, gerou surpresa naquela tarde de 1977. Ela partiu do craque Nilton Santos, a ‘Enciclopédia do Futebol’, e foi endereçada ao lateral-esquerdo Giru.
 
Para começar, é preciso explicar a história. Nas décadas de 70 e 80, foi montado o Milionários EC, time de futebol que reunia diversos famosos jogadores já aposentados ou em fim de carreira. Em 1977, a equipe foi até Taubaté, cidade a 123km de distância de São Paulo, realizar uma partida de exibição contra uma Seleção da cidade. Naquele dia, ao lado de Garrincha, o Milionários levou ao estádio Joaquinzão nomes históricos, como os campeões mundiais Carlos Alberto Torres, Nilton Santos, Belini e Djalma Santos. Uma verdadeira festa para o público que lotou as arquibancadas.
 
A história é contada por Paulo Ernesto, que atuou pelos taubateanos naquela partida. Segundo ele, o jogo terminou em 1 a 0, com gol de pênalti do próprio Garrincha. Paulo diz que o Joaquinzão, em festa, vibrava a cada jogada dos craques. "Foi uma grande emoção jogarmos com os nossos ídolos, que ainda tinham muito a nos ensinar", diz. Gilsinho, ídolo do Esporte Clube Taubaté, também contou que seu pai, Benício, atuou naquele jogo.
 
Outro que estava nessa partida e lembra com emoção como foi jogar com tantos ídolos é Noel Garcez. O taubateano, no jogo, foi designado a marcar Paraná, histórico ponta do São Paulo. "Eu tinha só 21 anos e o Paraná já estava quase aposentando. Tinha a malícia de profissional, e não me deixava jogar. Pisava no meu pé, tirava a minha chuteira...", conta Noel, hoje com 57 anos. "Foi uma coisa histórica. Nunca podia imaginar que ia enfrentar aqueles cara que eram de Seleção. Foi muito emocionante e gratificante, ver de perto e jogar contra todos aqueles craques", completa.
 
A história surgiu após o Mistau, Museu de Imagem e Som de Taubaté, divulgar uma foto do Anjo das Pernas Tortas atuando no Joaquinzão. As informações sobre a partida, porém, eram quase nulas. Após muita pesquisa e consulta de fontes, confirmou-se a veracidade da foto, e do confronto.
 
No gramado, Garrincha, já aposentado, era a atração maior do Milionários. “O Mané não anda nada bem, está muito mal fisica e psicologicamente. Vou te pedir um favor: por tudo que o Mané já fez pelo futebol, deixa ele te dar uns dribles. Tudo bem?”, pediu Nilton Santos ao lateral Giru.
 
Em outras palavras: você pode ser o João hoje? O nome João entrou para o folclore do futebol — era como Garrincha tinha o hábito de chamar seus marcadores de "João", independente de quem fosse. Para o eterno camisa sete, não havia preocupação com quem iria marcá-lo. 
 
Garrincha, então com 44 anos, já não tinha a facilidade de driblar de outrora. Realmente, para dar seu costumeiro show nos gramados, seria necessária alguma ajuda. Giru, indignado com o pedido, foi firme na resposta. "Olha, seu Nilton. Eu sei que o Mané é um cara legal, mas eu também tenho um nome a zelar", respondeu. Giru não quis ser mais um João. E mandaram outro dos nossos mortais para marcar o Mané.
 
De fato, Garrincha havia jogado no Joaquinzão - e, contra ele, o único zagueiro da história que recebeu um pedido para facilitar o jogo para um dos maiores atletas de todos os tempos.