A final da Copa do Brasil 2016 é um tanto quanto inesperada, ao menos no que se prevê das duas equipes, coletiva e taticamente. De um lado, o Atlético-MG, com um compilado de bons jogadores, mas padrão de jogo e comando técnico muito aquém do nível de seus atletas. De outro, o Grêmio, que tem, mais uma vez, Renato Gaúcho como treinador, com ideias de jogo não tão atuais.

Contudo, quis o destino que a decisão desta Copa do Brasil se assemelhasse, em alguns pontos, à do ano passado. Mais uma vez, Marcelo Oliveira é finalista – a quinta neste torneio como treinador –, com uma equipe que, coletivamente, está abaixo da rival. Adversário da vez, o Grêmio de Renato Gaúcho passou por uma troca de comando nos últimos meses e traz à tona outra disputa entre uma equipe forte coletivamente contra um time que possui um emaranhado de desacertos em sua conjuntura.

Com o Brasileirão posto em segundo plano, o Grêmio colocou o esquadrão reserva para atuar contra o América-MG, no último final de semana, pelo mesmo campeonato. O intuito era descansar os titulares para a grande final da Copa do Brasil, com o time "achado" por Renato Gaúcho após a instabilidade gremista na reta final do trabalho de Roger Machado, seu antecessor. Embora irregular no torneio de pontos corridos, o tricolor gaúcho chega confiante a Belo Horizonte, cidade que protagonizou a melhor atuação gremista na Copa do Brasil, na fase anterior, diante do Cruzeiro de Mano Menezes.

Com Portaluppi no comando, poucas mudanças: base do time mantida – saída de Giuliano à parte – e muitas características coletivas similares às dos meses anteriores. Tendo posse de bola, o time agrupado, com os jogadores bem próximos e trabalhando o passe curto à frente, com Luan entre as linhas de marcação adversárias, associando-se a Douglas, o armador central da equipe. Pelas beiradas, novidade com Ramiro, antes volante e defensor, agora atuando como ponta, apoiando o lateral-direito Edilson, protegendo o setor e contribuindo no jogo apoiado com a bola nos pés. Na esquerda, Pedro Rocha se consolidou como titular, por muitos momentos alternando com Luan o posicionamento em campo, com a ideia de também centralizar e confundir a marcação rival – especialmente quando o encaixe é individual, como o do Atlético.

Luan, no círculo vermelho da imagem, entre as linhas cruzeirenses; jogadores gremistas próximos para facilitar a circulação do jogo com passes
Luan, no círculo vermelho da imagem, entre as linhas cruzeirenses; jogadores gremistas próximos para facilitar a circulação do jogo com passes

Mas o Grêmio não é só ataque: os meio-campistas Walace e Maicon, tão importantes na "Era Roger", seguem sendo pilares da equipe, surgindo como opções de passe em toda ação ofensiva do time ou ocupando espaços no campo de ataque. Vale ressaltar também a capacidade gremista de jogar trazendo muitos atletas para um espaço curto de campo, com o propósito de ter superioridade numérica em uma eventual perda de posse de bola – para ter facilidade em recuperá-la com menos tempo –, ou até mesmo para qualificar uma jogada coletiva. 

Sem a bola, os mesmos volantes se tornam muito importantes como "precauções" para a marcação individual do time – ainda que, visando conter o espaço em que o adversário possui a bola. Individualidade esta que é vista, especialmente, quando os laterais duelam com os pontas adversários. Contra um Atlético que explora o talento particular e possui a jogada de mano a mano como ponto de desequilíbrio frente aos rivais, é um ponto a se prestar muita atenção.

Grêmio marca individualmente os jogadores cruzeirenses, à exceção da dupla de volantes, que se resguarda e age se houver necessidade de cobrir espaços
Grêmio marca individualmente os jogadores cruzeirenses, à exceção da dupla de volantes (Walace e Jailson), que se resguarda e age se houver necessidade de cobrir espaços

É a segunda final de Copa do Brasil do Galo em três anos. Na anterior, superioridade total sobre o adversário e título inédito, contra o técnico que agora é seu comandante. Desde aquela decisão, Marcelo Oliveira acumula críticas quanto ao estilo de trabalhar suas equipes, potencializando individualidades e enfraquecendo o coletivo. É verdade que o time mineiro tem o privilégio de contar com peças diferenciadas para o futebol brasileiro – Robinho e Lucas Pratto causariam alarde em qualquer clube do país –, mas a missão desta quarta-feira vai muito além disso.

Com as atuações aquém do esperado nas últimas semanas, o Atlético disse adeus à disputa por algo maior no Brasileiro, haja vista a impossibilidade de título no torneio e a considerável distância para Santos e Flamengo, equipes que hoje ocupam as vagas de classificação direta para a fase de grupos da Libertadores via Campeonato Brasileiro. Na Copa do Brasil, atuações abaixo da expectativa contra Internacional, Juventude e Ponte Preta. Mesmo sem convencer em nenhum de seus jogos, o destoante comando ofensivo mineiro, aliado à sorte e às boas defesas de Victor, garantiram uma vaga na fase derradeira do mata-mata.

Inconsistente defensivamente – sofreu gol em 5 de suas 6 partidas na Copa do Brasil, além de 48 tentos sofridos em 36 jogos pelo Brasileirão –, o time mineiro compensa o forte poder de fogo com a desorganização em sua retaguarda. Com um sistema defensivo totalmente descontrolado, de movimentos aleatórios e posicionamento totalmente descoordenado, as consequências vão se tornando cada vez mais pesadas. Além disso, o Atlético não vence uma partida há quase um mês. A última foi o triunfo diante do Internacional, na mesma Copa do Brasil, no jogo de ida da semifinal, por 2 a 1, em Porto Alegre.

Descoordenação no posicionamento defensivo do Atlético: movimentação rival atrapalhou toda a estrutura da última linha atleticana
Descoordenação no posicionamento defensivo do Atlético: movimentação rival atrapalhou toda a estrutura da última linha atleticana

Contudo, não só de componentes negativos vive o Atlético. Até por isso, está na final da Copa do Brasil. Rápido e de muita facilidade nos momentos de contra-ataque, o time mineiro aposta nos seus corredores para criar um caos no adversário. Tendo, muito provavelmente, Maicosuel e Robinho entre os titulares, o time de Marcelo Oliveira deve apostar muito nas individualidades desses jogadores para atrapalhar o encaixe individual gremista pelos lados de campo. Com o adendo de Lucas Pratto auxiliar muito o jogo ofensivo ao recuar, e podendo ter Clayton – já que Luan se lesionou mais uma vez, enquanto Otero segue no departamento médico – por uma das beiradas, a certeza é que o Galo deve correr muito e cansar os visitantes. 

Atlético no ataque: jogadores partem em muita velocidade no contragolpe e exploram, especialmente, as laterais do campo: um dos pontos fortes desta equipe
Atlético no ataque: jogadores partem em muita velocidade no contragolpe e exploram, especialmente, as laterais do campo: um dos pontos fortes desta equipe

Sem Rafael Carioca, suspenso, e, possivelmente, com Cazares no banco de reservas, o Atlético perde em criação e circulação com a bola nos pés. Perde também na manutenção de posse de bola, para fazer o Grêmio, que tanto pressiona os adversários quando eles possuem a redonda em seu poder, se cansar ainda mais e ceder espaços. Mas, acima de tudo, o time mineiro deve, mais uma vez, apostar todas as suas fichas no jogo intenso e no incansável "vai e volta" de suas exibições para superar o Grêmio: com muita velocidade para ir ao ataque, mas deixando muitas brechas e espaços para o adversário jogar e fuzilar sua meta. Haja trabalho para Victor, Erazo e Fábio Santos, ex-atletas tricolores.

Prováveis Atlético e Grêmio para o jogo de ida da final (Reprodução: Tactical Pad)
Prováveis Atlético e Grêmio para o jogo de ida da final (Reprodução: Tactical Pad)

Mais de dois anos após o desastre do 7 a 1, percebe-se que pouca coisa mudou no Brasil. Na final do maior torneio de mata-mata do país, as duas equipes ainda trabalham o jogo de uma maneira ultrapassada – ainda que em graus diferentes –, que ficou obsoleta quando se observa a revolução tática que este esporte vive. E é até irônico perceber o quanto isso caminha em desencontro com a evolução gradativa da seleção nacional, que se fortaleceu tanto com Tite no comando, trazendo novas ideias e um estilo de jogo mais atualizado e coletivista. Porém, apesar de todos os pesares, é uma das muitas provas de que o futebol é totalmente imprevisível e surpreendente.

Créditos: Blog Painel Tático

Dados: Soccerway

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Sobre o autor
Matheus Eduardo
Vinte anos de muito amor pelo futebol e pelo mais alto nível do esporte bretão. Jornalismo e, nas horas de fanatismo, torcedor de Atlético Mineiro e Liverpool