Procópio tinha apenas 27 anos quando retornou ao Cruzeiro e conquistou a Taça Brasil. No entanto, sua história com a camisa celeste é muito maior do que se pensa. Além do título nacional em 1966, foi tricampeão mineiro em 1959/60/61. Em sua volta ao time celeste, foi novamente campeão estadual em 1967/68/74/75

Há 50 anos, Cruzeiro conquistava a Taça Brasil em cima do Santos

Após uma dividida com Pelé, em 1968, Procópio se lesionou rompeu o tendão da perna esquerda. Ficou exatos cinco anos, um mês e 13 dias sem jogar. Recomeçou a vida, cursou Educação Física, e retornou aos gramados jogando em um time formado por veteranos jogadores do Cruzeiro. Em 1973, realizou testes para jogar futebol e conseguiu voltar aos gramados vestindo a camisa celeste. 

Lesão no tendão tirou Procópio dos gramados por cinco anos. Foto: Blog Tardes de Pacaembu

Jogou até 1975. Encerrou a carreira e começou sua trajetória como treinador. Trabalhou no Cruzeiro entre 1975 e 1978, e foi primordial na montagem do time campeão mineiro em 1977. Saiu para fazer história no Atlético-MG, e em outros vários times do Brasil e do exterior. 

Hoje, aos 77 anos, Procópio Cardozo, em entrevista exclusiva para a VAVEL Brasil, conta histórias e detalha a campanha celeste na Taça Brasil de 1966. Confira!

VAVEL Brasil: Quais são suas lembranças da montagem do time celeste em 1966, e como foi seu retorno ao Cruzeiro

Procópio: A base do Cruzeiro era formada por jogadores das categorias de base. Joguei no São Paulo, Fluminense, Palmeiras, e no Atlético-MG. Joguei no Galo em 1962 e retornei em 1966. Como capitão do time, briguei por mim e pelos jogadores com a diretoria. Na época, o Eduardo Magalhães Pinto comprou meu passe junto ao Palmeiras. 

Depois de brigar no Atlético, tive propostas do Flamengo e do Santos, mas fiquei Belo Horizonte, porque o Felício Brandi (presidente do Cruzeiro) comprou meu passe. Cheguei no Cruzeiro com a Taça Brasil de 1966 em andamento. O William, com quem joguei no Atlético, havia chegado e nós dois éramos os mais velhos do time. O resto do elenco era formado por jovens. Antes havia jogado com Evaldo no Fluminense, Hilton Oliveira no Renascença e no Fluminense. Enfim, conhecia muito bem o elenco. 

VB: Você, como jogador mais experiente, jogou contra times que passaram pelo caminho do Cruzeiro em 1966. Isto fez diferença?

P: Com certeza. Joguei no Fluminense. Enfrentei o Santos quando atuei no Palmeiras. Então, o Cruzeiro percebeu isso e os jogadores também. Lógico que analisávamos os adversários, mas sem violentar a nossa maneira de jogar.

Procópio faz trabalho de aquecimento com companheiros em 1966. Foto: Site Terceiro Tempo

VB: Com um time tão jovem e equipes tão gabaritadas no caminho, você chegou a perceber alguma desconfiança dos jogadores mais jovens no talento deles?

P: Nunca vi isso. Muito pelo contrário. Até chegar a final contra o Santos, passamos por times como Grêmio e Fluminense. Era verdade que o Cruzeiro era o menos conhecido entre eles. Na época, a quarta torcida de Minas Gerais. Então, quando eliminamos equipes fortes, a confiança foi crescendo e entramos na final com muita vontade e acreditando na vitória. 

Contra o Santos, era inevitável que os mais jovens sentissem a responsabilidade. Tinha o Pelé, que era o maior do jogador do mundo. Havia um grande respeito por eles, tanto que marcamos mais, porém, atacamos muito. Quem joga mais ganha o jogo e o resultado da primeiro partida (6 a 2) foi resultado disso. 

VB: Na final contra o Santos no Mineirão, houve alguma história que o torcedor talvez não conheça ou que nunca tenha sida revelada?

P: Tem. Acredito que pouca gente sabe disso que vou contar. Nós concentrávamos numa casa de três quartos onde hoje é a Toca da Raposa I. Na ida para o Mineirão, o ônibus passou pela orla da Lagoa da Pampulha. Na subida para o estádio, altura do Pampulha Iate Clube, não tinha como subir de ônibus. Nós (jogadores) fizemos o caminho restante a pé. Ajudamos a equipe de rouparia, massagem, comissão técnica a carregar todo o equipamento e passamos no meio dos torcedores. 

Cruzeiro goleou Santos no primeiro jogo no Mineirão. Foto: Arquivo/Cruzeiro

VB: Com 5 a 0 no primeiro tempo diante do Santos, acredito que até você ficou surpreso com o show de bola do Cruzeiro, não?

P: Fiquei, mas até certo ponto. Porque avaliando tudo o que jogamos na partida contra o Santos, os outros jogos contra Fluminense e Grêmio, além dos treinamentos, dava para saber que a nossa equipe jogava muito bem. Sempre atuando em velocidade com a bola no pé e no raciocínio. E ainda acrescento que não fosse pelo Evaldo, Tostão e Dirceu Lopes não seriam os mesmos. 

No segundo tempo, o Santos voltou com tudo, fez dois gols com Toninho Guerreiro, Nos preocupamos mais, marcamos com mais força, e mas jogávamos em velocidade. Numa dessas, fizemos o sexto gol. Depois disso, o Pelé estava furioso. Perdendo para um time de meninos, ele deu um carrinho violento no Piazza. Fui defender o Piazza, nos xingamos e o Armando Marques (árbitro do jogo) estava perto e nos expulsou. Sorte nossa que não havia suspensão automática (risos).

VB: No segundo jogo, era fato que o Santos viria com tudo. Precisava vencer para forçar a terceira partida. Como foi aquela partida? 

P: O gramado do Pacaembu era impraticável. Para nós do Cruzeiro, era terrível, porque nosso time era de toque de bola. Ninguém dava chutão e jogava sempre em velocidade. Em compensação, o Santos já conhecia o Pacaembu e estava acostumado com partidas assim, típicas de Libertadores. E os santistas fizeram 2 a 0 no primeiro tempo.

Teve a história de que dirigentes do Santos e da Federação Paulista de Futebol nos procurou no vestiário para discutir sobre o terceiro jogo que não tinha local ainda. Aquilo mexeu com o brio dos jogadores, mas eu não achei uma atitude provocativa. O Felício Brandi, muito esperto, usou aquilo para animar os jogadores. 

Jogadores desfilam no carro do Corpo de Bombeiros comemorando título brasileiro em 1966. Foto: Arquivo/Cruzeiro

VB: Então, você acredita que foi aquilo que deu novo ânimo ao Cruzeiro?

P: Pode ser, mas tem outro fato muito maior que foi Deus, porque a chuva parou e a drenagem do Pacaembu era ótima. Quando voltamos, o campo estava em excelentes condições para o tipo de jogo do Cruzeiro. A bola corria muito na grama molhada e fizemos um segundo tempo maravilhoso. Perdemos até pênalti, mas viramos o placar e fomos campeões.

VB: Para você, o que representou a conquista da Taça Brasil?

P: Foi uma vitória não só do Cruzeiro, mas também do futebol mineiro. As pessoas começaram a olhar com mais carinho para Minas Gerais, muito embora o nosso estado tivesse ganho o Campeonato Brasileiro de Seleções Estaduais, em 1963. Antes, Minas exportava jogadores para todos os times do Brasil. Depois da Taça Brasil, passamos a importar atletas para nós.

Na minha vida profissional e pessoal, foi uma vitória maravilhosa. Saí de Minas Gerais, voltei para cá. Fez crescer a minha carreira, que já era consolidada. Apesar da minha contusão em 1968, que arrebentou com a minha vida, quis Deus que aos 35 anos, depois de mais de cinco anos parado, voltei a jogar contra a opinião de todos.

Além disso, a maior alegria da minha vida foi que o maior zagueiro do mundo, Roberto Perfumo, com quem tive a felicidade de jogar pelo Cruzeiro, me escalou na Revista Placar como quarto-zagueiro na seleção dele de todos os tempos. Isso me deixa muito emocionado.

Procópio é homenageado por Januário Carneiro, Luiz Carlos Alves e Roberto Abras. Foto: Blog Chico Maia