Uma carta destinada ao Conselho Deliberativo do Cruzeiro nessa quarta (22) movimentou o dia do clube. De autoria do conselheiro nato Guilherme Nato, com apoio de outros cruzeirenses, o material pediu a instauração de uma comissão para investigar a gestão de Gilvan de Pinho, que encerra seu segundo triênio na presidência da Raposa em dezembro deste ano. Outro nome citado foi o de Bruno Vicintin, que deixou a vice-presidência de futebol do clube em outubro.

Para esclarecer os pontos citados na carta, Bruno convocou uma coletiva e citou, dentre outras questões, que foi ameaçado de morte pelo seu sucessor, Itair Machado, que ocupará o cargo a partir do ano que vem junto ao presidente eleito, Wágner Pires de Sá. Vicintin deixou a vice-presidência de futebol da Raposa em outubro, logo após a eleição presidencial do clube mineiro. Em um primeiro momento, apoiou a chapa de Wágner, que foi a da situação, mas decidiu deixar o Cruzeiro quando o novo cartola afirmou que Itair trabalharia na instituição - Bruno não quis abrir mão de sua equipe.

Após ser acusado por Vicintin, Itair Machado divulga nota negando ter feito ameaça de morte

A carta reuniu uma espécie de clipping junto à mídia nacional, em que foram coletadas informações sobre uma porção de dívidas que o Cruzeiro tem. Vários pontos foram citados, como um valor próximo de 50 milhões de reais que o clube deve na Fifa, fora problemas envolvendo inúmeras negociações. Vicintin, por tudo isso, comentou caso a caso e se mostrou surpreso pelo material.

"Para minha surpresa, recebi uma carata do Sr. Guilherme Cruz, questionando uma série de fatos ao conselho sobre minha administração no departamento de futebol. Quero deixar claro que um gestor tem contratações certas e erradas. Eu errei, como ele mesmo cita, nas contratações de Gino e Sanchez Miño, com acertei em contratações como Thiago Neves, Diogo Barbosa, Robinho, Lucas Romero, dentre vários outros. Acho que uma razão de ter acertado foi o título na Copa do Brasil", comentou.

O ex-dirigente da Raposa afirmou que não deixará tudo da forma como está, porque sua idoneidade foi questionada na carta. Ele citou que fez contratações erradas, mas que também acertou muito em outras negociações. Vicintin ainda lembrou como pegou a vice-presidência de futebol em 2015 e como a deixa agora.

"Passei a carta aos meus advogados e vou tomar as medidas cabíveis. Posso ser questionado sobre os erros que cometi, mas não posso ser questionado sobre a minha idoneidade. Não devo só satisfação ao Conselho do Cruzeiro, mas também à minha família, porque deixei de trabalhar e conviver com ela por cinco anos e meio de forma voluntária, sem receber um real", pontuou.

"Pelo contrário, tirava do bolso pelo Cruzeiro. Recebi o clube numa situação financeira terrível, sem treinador e diretor, à beira da zona de rebaixamento, e entreguei numa situação financeira difícil, porém, campeão nacional no profissional, no Sub-20 e com mais de 81% em média de direitos econômicos dos jogadores da base", completou.

1. Direitos esportivos de atletas distribuídos sem critérios a investidores

"Nós tornamos pública a porcentagem de todos os jogadores da base no balanço. Essa foi uma brilhante medida sugerida pelo Antônio Assunção e apoiada por mim, e acho que tem que seguir. Os atletas da base são 81% do Cruzeiro. Quando recebi o Cruzeiro, o destaque da base era Leo Bonatini, e Cruzeiro tinha 17% dele. Lucas Silva só 10% quando vendido. Durante minha gestão na base, foi uma determinação de nenhum jogador ter menos de 10%".

2. Contratações com problemas na Fifa: Caicedo, Sóbis, Pisano e Denílson

"Na minha gestão, Cruzeiro teve quatro casos na Fifa, que foram contratações na minha gestão: Pisano, Denilson, Sóbis e Caicedo. Pisano e Denilson são valores menores que os que a mídia está divulgando, valores que não dão 1,5% do faturamento do Cruzeiro no ano. Quitar essas dívidas é muita mais uma questão de engenharia financeira do que realmente dívidas que gerem problemas ao clube. 

Sóbis, quando estava saindo, a gente estava conversando com o [Jorge] Machado, empresário dele, sobre uma negociação com o Querétaro, que iria matar praticamente a dívida toda. Mas depois que saí não conversei mais com o empresário, não sei o andamento, mas era uma dívida que estava caminhando para ser resolvida sim.

Caicedo foi um jogador que não deu o retorno que a gente esperava e foi emprestado ao Barcelona [de Guayaquil-EQU], onde o passe está fixado, o que "mata" grande parte da dívida. Se não for comprado, ele tem idade ainda para o Cruzeiro recuperar".

Futuro de Sóbis no Cruzeiro ainda é incerto (Foto: Washington Alves/Light Press)

3. Gonzalo Latorre, contratação que nunca jogou pelo Cruzeiro

"Sobre o Latorre, foi uma contratação junto ao Arrascaeta. Não fui para o Uruguai, não tive com o empresário do Latorre. Como o próprio Latorre falou, eu o vi poucas vezes. Ele foi uma contratação em janeiro. O Valdir Barbosa me ligou, disse que estava com o [empresário] André Cury, que na negociação do Arrascaeta estava vindo um atacante da seleção uruguaia, está vindo para o profissional. O Valdir não sabia o jogador. Perguntei, você quer que eu anuncie ou o profissional anuncia? Pode deixar que o profissional anuncia, ele disse.

Não sei porque motivos o Latorre chegou em abril ou maio, chegou fora de forma, o que é normal para um atleta que está parado, não é crítica à contratação. Em setembro fui promovido ao profissional. Estive com o Latorre quatro meses, tive pouco contato com ele. Depois no profissional, conversava Klauss Câmara e com treinadores da base. Ele nunca foi colocado atletas entre os tops para subir. Tiveram oportunidades de empréstimo que foram oferecidas para ele, como se falou na entrevista, e ele agradeceu, e tiveram algumas propostas para rescindir. Um atleta que não quer ser emprestado, rescindir, a única solução, assim como foi feita, é colocar para treinador separado e à disposição do treinador profissional, assim como feito do sub-23".

4. Paulo Bento e pagamento de salários ao treinador mesmo após sua saída

“O Paulo Bento tinha um contrato europeu quando veio, esse pode ter sido um dos erros nossos. Na época estávamos muito pressionados e ele receberia mesmo demitido. Logo depois ele arrumou emprego no Olympiakos e o agente dele ligou para o Cruzeiro e disse assim: 'olha, ele vai pro Olympiakos, porém o salário na Grécia é muito mais baixo que no Brasil. Então ele só vai se o Cruzeiro pagar 50% do salário dele'. A gente não aceitou. Quem fez a negociação foi o Gilvan, não eu”,  disse.

Essa negativa em continuar pagando o salário integral de Paulo e a rápida recolocação do treinador no mercado, à época na Grécia, foi um bom negócio para o clube, na visão de Bruno. “No final, o Cruzeiro pagou 30% do salário dele e teve economia. Se for pensar no copo meio cheio, meio vazio, teve 70% de economia e 30% de prejuízo. Foi bom o Paulo Bento ter ido pro Olympiakos porque se não o Cruzeiro teria que pagar até o final”.

5. Contratação de Diogo Barbosa

"Realmente, a gente contratou o Diogo sem ter condições. Tinha uma disputa muito grande com o Flamengo, na época foi o Thiago (Scuro) que contratou. Tanto o Diogo como o Caicedo foi o Thiago Scuro. Depois Hudson foi eu sozinho, não tinha diretor. A partir do Thiago Neves foi o Klauss. O único que a gente contratou e tinha porcentagem mais baixa era o Diogo Barbosa, que era um jogador que a gente acreditava que não poderia perder. Thiago Neves tem 100%, é um jogador de idade avançada".

6. Ligação com empresário Genivaldo, citado na carta de Guilherme e que se envolveu nas contratações de Ezequiel e Careca

"Genivaldo era um empresário, que, durante a gestão Gilvan, tinha um contato direto com o Gilvan. Gilvan tinha um contato direto com ele, e ele fazia os scouts (estatísticas dos jogadores a serem contratados) pelo Gilvan. No departamento profissional, com o Givanildo foram duas contratações, com contato treinador, Bruno e Genivaldo. Uma foi o Ezequiel e outra foi o Careca que, então, eu vejo com naturalidade.0

O Cruzeiro vive um sistema presidencialista. No fim, o presidente pode contratar quem ele quiser. Ele confiava no scout e contratou os dois jogadores. Antes do profissional, ele contratou alguns jogadores, porque no Brasileiro Sub-20, que foi o Luiz Fernando, que está no Guarani, Caíque Valdívia, que está no Criciúma, só esses dois".

7. Problemas financeiros do Cruzeiro

"O problema do Cruzeiro, na minha opinião, não é o departamento de futebol. O Cruzeiro tem overhead (despesas) muito grande. Por exemplo, na minha opinião, o Cruzeiro não precisa de uma sede administrativa tão cheia como tem. Se eu fosse presidente do Cruzeiro, tentaria enxugar essas questões fora futebol que eu acho muito chato. Esse arrependimento não tenho. A folha salarial é controlável, o Cruzeiro passa por dificuldade financeira também por gestão financeira por uma série de motivos.

É igual administração pública, vai só encavalando. O Cruzeiro continua sem dinheiro, porém tem muitos ativos. Estes ativos, bem manejados, devem melhorar a situação do Cruzeiro. Qual grande risco que o Cruzeiro corre na minha opinião? É continuar sem dinheiro e dilapidar os ativos, deixar de ter os 81% dos direitos dos jogadores da base. Se isso acontecer, a situação do Cruzeiro vai ficar muito difícil".

8. Conversa com autor da carta, aumento de 300% na dívida da Raposa e balanço de passagem pelo clube

"Nunca conversei com o Guilherme (Oliveira Cruz, conselheiro nato do clube), não tenho interesse em conversar com ele. Minha briga é com os chefes da organização. Os mais abaixo da organização eu não tenho nada para conversar. O que ele afirmou, ele vai ter que provar. Como pode uma pessoa pode te acusar de aumentar a dívida em 300%, de uma contratação do Gonzalo Latorre, é só botar no Google. Valdir é meu amigo, se eu contratei um jogador, pode falar comigo. Nunca tive com o empresário do Latorre, ele teve uma reunião que a gente tentou resolver o imbróglio com o Klauss Câmara, e eu não tive.

Sempre tratei ele com maior educação. Ele colocou na quarta Sanchez Miño, Gino, Pisano, que foram contrataçãoes que não deram certo, mas que não geraram problemas ao Cruzeiro. E ele colocou na carta que geraram. Ao mesmo tempo, ele não fala das contratações que eu acertei. Você vai falar que o Alexandre Mattos é um péssimo gestor porque contratou o Rafael Donato, o Uelliton. Ele também contratou Everton Ribeiro, Ricardo Goulart. No futebol, o que ficam são os títulos. Eu também participei disso. Ninguém se recorda de mim no Cruzeiro, mas eu conquistei dois Brasileiros Sub-20, dois Brasileiros profissional, um Mineiro e uma Copa do Brasil. Mas, eu acho que a razão de vir aqui é não temer nada.

Se eu tivesse alguma coisa para temer, eu não chamaria a imprensa. Podem falar que eu errei. Gastei muito com o Ábila? Gastamos, gastamos muito com o Ábila, mas não caímos para a segunda divisão. O cruzeirense não sabe. Todos os outros times sabem. Mas o cruzeirense não sabe. Acho difícil de ter aumentado a dívida em 300% na minha gestão. É uma acusação totalmente leviana e absurda. Você aumentar a dívida em 300% em dois anos e meio, chega até ser ridículo. Mas vai ter que provar. Todo mundo que acusa, tem que provar".

9. Candidatura à presidência do Cruzeiro no futuro

"Eu acho muito difícil eu ser candidato, mas muito difícil. Claro que, no futebol, tudo mundo. Hoje o candidato para mim é o Pedrinho (Pedro Lourenço, empresário e conselheiro do Cruzeiro), já externei isso para ele. Ele será um grande presidente do Cruzeiro. Ele até brincou: quando eu for presidente, você vai ser meu vice de futebol e o Alexandre Mattos de diretor. É uma brincadeira, mas ele perguntou: você aceitaria? Eu disse: estou muito cansado do futebol, quero descanso.

Porém, posso falar a partir de hoje, que você tem o meu apoio. O Cruzeiro não teria sido pentacampeão sem o Pedrinho. Ele é um cara cruzeirense fenomenal e que merece o apoio de todos. Mas hoje eu não interesse em voltar. Eu tenho 40 anos, tenho três filhos a criar. Eu tive problema de saúde do meu pai, que isso se torna público. Tenho interesse em me afastar do futebol. Estou escrevendo até dois livros. Mas, a princípio, não tenho interesse".

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