2014 ainda se fez presente na Arena do Grêmio no domingo (16), na partida entre o Tricolor gaúcho e a Ponte Preta. Na equipe paulista estava o goleiro Aranha, vítima de injúria racial praticada por um grupo de torcedores gremistas em 2014, quando Grêmio e Santos se enfrentaram pela Copa do Brasil. Na ocasião, Aranha fazia excelente partida, o Santos vencia por 2 a 0 e alguns torcedores destilaram ódio dessa maneira, com insultos racistas.

Passado esse episódio, o Grêmio foi punido no Supremo Tribunal de Justiça Desportiva e acabou, com a perda de pontos como consequência das injúrias raciais praticadas por torcedores, eliminado da Copa do Brasil sem disputar o jogo da volta, na Vila Belmiro. Isto reacendia a desaprovação de mais torcedores. Em 2014, muitas pontas ficavam soltas quando a torcedora Patrícia Moreira foi duramente perseguida como se fosse a única a insultar o goleiro pela cor de sua pele. Ao mesmo tempo, o goleiro Aranha recebeu espaço na mídia para discussão do assunto e generalizou o comportamento como comum ao Sul do país e da própria torcida do Grêmio.

É verdade que as injúrias raciais na partida entre Grêmio e Santos em 2014 foram cometidas por um pequeno grupo de torcedores. Porém, a repercussão negativa ao clube e sua torcida nas entrevistas e a eliminação do Grêmio fizeram com que mais torcedores repudiassem ao goleiro Aranha, acusando o sujeito que foi vítima no primeiro momento. Em novo encontro neste 16 de julho de 2017 na mesma Arena, palco das cenas lamentáveis contra o arqueiro em 2014, Aranha foi muito vaiado desde o início do jogo. Suas declarações ainda estavam bastante vivas e o episódio de 2014 não pode ser isolado.

A torcida do Grêmio agiu mal. Aranha erra ao generalizar todo o povo do Sul e a torcida do Grêmio? Sim, erra. Mas sem dúvidas sofreu com as injúrias raciais em 2014. Ele foi vítima. O comportamento dele após isso é a consequência. Comenta-se que ele "não aceitou o pedido de desculpas do Grêmio". Não considero que uma pessoa que foi vítima dessa forma deva ser obrigada a perdoar. Seria legal de sua parte, mas não posso obrigar e a torcida não pode obrigá-lo. Após esse pedido de desculpas não funcionar, o que fazem os torcedores do Grêmio, agora em muito maior número, como viu-se no estádio e nas redes sociais online? Destilaram mais ódio. Sem dúvidas, destilaram mais ódio.

Os ataques ao goleiro Aranha não vieram mais da mesma forma que em 2014. Mas palavrões dos mais diversos e repúdios a seu caráter. Eu imagino a seguinte situação. Eu erro minha relação com uma pessoa. Ela foi vítima de meu erro. Eu peço desculpas, mas ela não me desculpa. Devo xingá-la de todas as maneiras possíveis porque não me perdoou? Não devo. Era melhor ignorar se Aranha segue colocando somente sobre o Grêmio um problema grave de nossa sociedade.

Campanha do Grêmio em divulgação do livro "Somos Azuis, Pretos e Brancos", de Leo Gerchmann.
Foto: Lucas Uebel / Grêmio

Mas, mais do que não alimentar mais ódio, o torcedor gremista deveria olhar ao seu lado. Olha para quem ocupa suas arquibancadas. Ao invés de comprar de vez a briga especificamente contra o sujeito Aranha pela repercussão do episódio, o torcedor gremista deveria se esforçar em combater toda a forma de racismo ainda existente no clube. Mas não o faz. São poucos atos, algumas pequenas campanhas da diretoria e de grupos de torcedores, como a Tribuna 77.

A maioria, e seguramente menciono maioria, pelo alto e bom som das vaias ao Aranha, pela presença de seu nome enquanto trending topic na rede social Twitter, quando foi ofendido mais vezes por vários gremistas - diferente dos poucos da ocasião em 2014 - preferiu comprar a briga específica contra Aranha. Preferiram ofender novamente do que combater o racismo ainda existente. Existente nas arquibancadas do Grêmio, existente em Porto Alegre, existente no Rio Grande do Sul, sim, no Sul do Brasil e em todo o país. Em diferentes escalas e esferas.

Seguem tempos difíceis em que há tantas brigas de torcida pelo país, como ocorreu no clássico entre Vasco e Flamengo, como aconteceu em Curitiba em um jogo entre Coritiba e Corinthians, em Goiás no clássico entre os esmeraldinos e o Vila Nova, e tantos outros exemplos. A torcida do Grêmio, que não vem protagonizando essas cenas, dessa vez perdeu a chance de tentar novamente o exercício do perdão no caso de Aranha. Ou ao menos ignorar. Preferiu partir para os insultos. E assim, independente da postura e das entrevistas do arqueiro, a certeza que destilar mais ódio ou colocar a defesa do clube, da instituição acima do combate ao racismo não é o caminho.

Torcedor gremista, também frequento espaços para torcida, seja na internet ou nos estádios. Este é meu posicionamento. Se discordas, como discordas do posicionamento do Aranha, quem sabe, ao menos comigo, perdoem. Ou ao menos não ofendam mais. Não é esse o caminho para livrar o Grêmio de ser acusado outras vezes. Pensem isso.

Creio que a maior bronca da torcida é ele não aceitar as "desculpas". Torcedor gremista, o melhor jeito de pedir desculpas seria combater o racismo com grandes exemplos e campanhas. Não isolar esse caso ou comprar essa briga contra o Aranha. Pensem nisso, queiram sempre o melhor para a sociedade e para o clube.

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Sobre o autor
Henrique König
Escritor, interessado em Jornalismo e nas mudanças sociais que dele partem; poeta de gaveta.