Neste domingo (18), o São Paulo completa 11 anos do seu terceiro título mundial, diante do Liverpool. Naquele dia, Mineiro e Rogério Ceni, com grandes atuações individuais, levaram a equipe tricolor a um título considerado pouco provável, já que o Liverpool vinha de grandes atuações na Europa.

Entretanto, o Tricolor conseguiu mostrar o gigante que era, e, com uma atuação deslumbrante, segurou os ingleses para coroar-se mais uma vez como a melhor equipe do mundo.

Para cruzar o mundo, é preciso primeiro cruzar a América

A trajetória tricolor até o Japão teve primeiro uma verdadeira saga pela América do Sul. Na Libertadores da América, a equipe tinha grandes concorrentes. Do Brasil, Santos, Palmeiras, Santo André e Atlético-PR acompanhavam o São Paulo na busca pela taça mais cobiçada da América. Outras equipes como os argentinos Boca Juniors, River Plate, San Lorenzo e o tradicional Nacional (URU) também disputavam o título.

O São Paulo encontrava-se no grupo 3, junto à Universidad de Chile, Quilmes (ARG) e The Strongest (BOL). A campanha foi tranquila, com nenhuma derrota sequer e 12 pontos ganhos. Em casa foram três vitórias, e, jogando como visitante, 3 empates. Nem mesmo a troca no comando técnico, de Leão para Paulo Autuori, evitou que o bom futebol do Tricolor fosse mantido. Nas oitavas de final, entretanto, uma verdadeira batalha esperava a equipe são-paulina. O confronto era diante do arquirrival Palmeiras. No primeiro jogo, no antigo Parque Antártica, Cicinho decretou a vitória são-paulina por 1 a 0. Na volta, Rogério Ceni, de pênalti, e novamente Cicinho fecharam o caixão palmeirense. O tricolor estava novamente nas quartas de final da Libertadores.

Cicinho comemora o gol mais bonito da campanha são-paulina na Libertadores (Foto: Fernando Pilatos/ Gazeta Press)
Cicinho comemora o gol mais bonito da campanha são-paulina na Libertadores (Foto: Fernando Pilatos/ Gazeta Press)

Na fase seguinte, o confronto era diante dos mexicanos do Tigres. No primeiro jogo, no Morumbi, não deu outra: 4 a 0 para a equipe da casa e classificação encaminhada. Na volta, só era preciso administrar o placar. Foi o que aconteceu. Vitória dos mexicanos por 2 a 1, mas nada que atrapalhasse o sonho pela terceira taça continental. Nas semis, seria necessário passar por cima do gigante River Plate, que, como o São Paulo, também era bicampeão continental. Na partida de ida, um Morumbi lotado viu a equipe mandante vencer por 2 a 0, gols de Danilo e, mais uma vez, Rogério Ceni.

Ceni terminaria a competição com 5 gols marcados).

Na volta, não teve pra ninguém. O Tricolor abriu o placar logo aos 11, novamente com Danilo. O River até chegou a empatar, aos 35 minutos, mas, àquela altura já era possível cravar o Tricolor na final. Amoroso e Fabão ainda aumentaram para o Tricolor. O craque Marcelo Salas até chegou a descontar para os "Millonarios". Não bastou. 3 a 2 pro São Paulo e mais uma final de Libertadores no currículo São-Paulino.

Amoroso foi decisivo em Buenos Aires (Foto: Reprodução/ YouTube)
Amoroso foi decisivo em Buenos Aires (Foto: Reprodução/ YouTube)

A final seria diante do Atlético-PR. O Furacão havia deixado pelo caminho o Santos nas quartas de final e o Chivas (MEX) nas semis. A equipe também vice-campeã brasileira do ano anterior, e prometia perigo ao São Paulo. Entretanto, uma polêmica mudou tudo. Pelo regulamento da CONMEBOL, a equipe que vai sediar a final deve ter seu estádio com capacidade para, pelo menos, 40 mil pessoas. Como a Arena da Baixada não comportava esse número à época, o Furacão foi obrigado a jogar no Beira-Rio, em Porto Alegre, distante cerca de 700km de Curitiba

Esse fator pareceu deixar o São Paulo em vantagem. E realmente deixou.  No jogo de ida, em Porto Alegre, o Atlético-PR até abriu o placar com Aloísio (que chegaria ao São Paulo após a competição, se transformando em ídolo e sendo um dos grandes destaques do Mundial ao dar a assistência para Mineiro). No entanto, um gol contra marcado por Durval logo no início do segundo tempo deixou a partida em igualdade, e com um leve favoritismo para o São Paulo no jogo de volta. 

Atacante do Furacão na época, Aloísio saíria do clube após o torneio para se consagrar com o camisa são-paulina em Tóquio

No Morumbi, mais uma vez, não teve jeito. Amoroso abriu o placar ainda no primeiro tempo, aos 17 minutos, e deixou os quase 72 mil torcedores presentes ainda mais confiantes que o título chagaria. Fabão, Luizão e Diego Tardelli fecharam o caixão numa goleada impiedosa por 4 a 0 sobre o Furacão. A terceira taça finalmente chegara. Festa em São Paulo e nos quatro cantos do Brasil. A passagem ao Japão estava carimbada. 

Ídolo do clube, Rogério conquistava sua primeira Libertadores como atleta (Foto: Divulgação/ IG)

O mundo se curva à Rogério Ceni

Com vaga garantida para o Mundial em Tóquio, iniciava-se a preparação para os duelos mais importantes da história do clube. Há 27 minutos para o término das inscrições para a competição, o Tricolor anunciou a contratação de Aloísio José da Silva, ou Aloísio Chulapa como é normalmente conhecido. O atacante vinha sendo destaque do Atlético-PR e foi dele o gol da equipe paranaense no primeiro jogo da final da Libertadores em Porto Alegre. O que poucos imaginavam é que Aloísio teria participação fundamental no tento mais importante do torneio que viria em sequência.

Deixando o Brasileirão completamente de lado (onde terminaria na 11ª colocação), o São Paulo fechou seu elenco para a disputa do Mundial e embarcou rumo ao Japão no dia 5 de dezembro, perante a mais de 5 mil são-paulinos que foram até o Aeroporto de Cumbica em uma segunda-feira: "Já sabia que os torcedores estariam presentes. A torcida do São Paulo é sempre assim, muito calorosa, uma prova disso foram os jogos na Libertadores", declarou o lateral Júnior, campeão mundial pela Seleção Brasileira em 2002. Após uma verdadeira maratona de quase 30 horas, com escala em Frankfurt, na Alemanha, o São Paulo realizava o seu primeiro treinamento dois dias depois em Tóquio.

A primeira decisão aconteceu no dia 14 no Estádio Nacional de Tóquio, diante do Al-Ittihad da Arábia Saudita. Demonstrando um claro nervosismo nos primeiros minutos de jogo, o time de Paulo Autuori não conseguia criar boas oportunidades. Mas aos 15' Danilo fez boa jogada individual, encontrou Amoroso dentro da área que dominou no peito e finalizou, contando com um desvio da zaga adversária a bola morreu no fundo das redes da equipe árabe. Era o primeiro gol do São Paulo no Japão. Antes mesmo do intervalo o ex-atleta da InternazionaleKallon, avançou num rápido contra-ataque do Al-Ittihad, bateu firme e viu Rogério fazer boa defesa parcial, mas na sobra Noor fez o gol de empate. 

Logo no início da segunda etapa veio o segundo tento são-paulino. Cicinho foi à linha de fundo e cruzou rasteiro para Amoroso marcar o seu segundo gol em Tóquio. O São Paulo novamente estava em vantagem. E não demorou para ela aumentar. Aloísio foi derrubado dentro da área, o árbitro bem posicionado marcou o pênalti. Rogério Ceni foi para a bola e marcou o terceiro gol do São Paulo na partida.

Rogério se tornava naquela noite o único goleiro a marcar um gol em uma partida pelo Mundial de Clubes

Pouco tempo depois o brasileiro Tcheco cobrou falta com categoria, após desvio a bola chegou em Al Montashari, que descontou para o Al-Ittihad. Mas já não era mais possível tirar o São Paulo da decisão. O Tricolor estava em mais uma final de Mundial de Clubes

Rogério Ceni fazendo história em Tóquio (Foto: Kazuhiro Nogi/ Getty Images)

O adversário dos brasileiros na grande decisão era ninguém menos que o poderoso Liverpool da Inglaterra. Ou 'imbátivel' se preferirem, como os Reds foram chamados pelo próprio capitão Gerrard, um dia antes da final. A equipe não sofria gols há 11 partidas. Era realmente uma tarefa quase impossível furar a defesa inglesa naquele 18 de dezembro de 2005. Os comandados de Rafa Benítez haviam vencido o Deportivo Saprissa da Costa Rica por 3 a 0 na fase anterior, utilizando uma equipe alternativa.

No Estádio de Yokohama, mais de 60 mil pessoas não faziam ideia da histórica partida que estavam prestes a ver. Seguindo um padrão praticamente comum do que aconteceria, a partida começou nervosa para ambas as equipes. O Liverpool ia pouco ao ataque e principalmente a equipe são-paulina tinha dificuldades e não conseguia finalizar à gol. Mas quando chegou levou perigo. Amoroso tabelou com Aloísio, fintou o zagueiro Hyypia mas bateu fraco, facilitando a defesa de Reina.

O lance deixou a equipe brasileira com mais confiança, e aos poucos o time de Paulo Autuori foi ganhando espaço no setor de meio-campo. Na virada dos 25' para 26', Fabão encontrou Aloísio um pouco à frente da linha central do gramado, o alagoano dominou esquisito, mas com uma passe primoroso de trivela encontrou Mineiro livre de marcação, o volante só teve o trabalho de deslocar o arqueiro espanhol e colocar a bola no fundo das redes. Caía a invencibilidade de 1041 minutos do Liverpool sem sofrer gols.

Herói improvável no Estádio de Yokohama (Foto: Andrew McGovern/ FuturaPress)

À partir deste instante os holofotes da partida apontaram para apenas um homem: Rogério Ceni. Atrás no placar, o Liverpool se jogou ao ataque e pressionou até o último minuto de partida. Entre defesas milagrosas e incontáveis e três gols (bem) anulados da equipe inglesa, o lance mais importante da partida após o tento de Mineiro surgiu aos 6' da etapa complementar. O Liverpool tinha uma cobrança de falta extremamente perigosa pela esquerda, na entrada da grande área. Steven Gerrard foi para a bola, um dos maiores cobradores de falta do mundo. Batida praticamente perfeita no ângulo direito de Rogério Ceni, que voou para fazer a defesa mais importante de sua carreira. Uma defesa simbólica e histórica. Naquela noite o Liverpool não conseguiria evitar de nenhuma maneira que o mundo se curvasse à Rogério Ceni. Se curvasse à um São Paulo Futebol Clube tricampeão mundial.