Vitória dentro e fora de campo: a história dos Craques da Vida
(Foto: Divulgação/Taça das Favelas)

O dia 11 de março foi especial para a Vila Aliança. Situada em Senador Camará, Bangu, Zona Oeste do Rio de Janeiro, a comunidade ganhou destaque dentro e fora do país, mas desta vez motivado pelos sorrisos. Na grande decisão da Taça das Favelas 2017, o Craques da Vida venceu o Jardim Bangu por 2 a 1 e garantiu o título da principal competição do calendário.

O Craques da Vida surgiu há 18 anos, em 1999, quando o casal de franceses Delphine Douyére e Cristian Doupes trouxe para o Brasil a ONG Terr’Ativa. Com a chegada da iniciativa sócio-esportiva na Vila Aliança, crianças e jovens da favela puderam conhecer outro lado da vida.

O projeto tinha como objetivo oferecer às crianças atividades esportivas e socioculturais. Para isso, o programa contava com apoio escolar, grafite, dança de rua e futebol”, conta Franklin Ferreira de Melo, formado em educação física e atual treinador do Craques da Vida.

O rumo, porém, mudou quando os franceses responsáveis pela ONG foram assassinados em Copacabana em 2007. “A perda dos patrocinadores do projeto acabou limitando o potencial de atuação. Com isso, as atividades oferecidas pelo projeto se reduziram apenas ao futebol e a gestão passou para mim, que atuava no Craques da Vida e criei uma nova ONG para que a iniciativa não se perdesse”, conta Franklin.

Atualmente, o time conta com base de 170 jovens de 5 a 18 anos que residem nas comunidades da Vila Aliança, Senador Camará, Mangueiral, Iraque, Vacaria, Nova Aliança, Coréia, Selva, Rebu, Sapo, Fundão, Jacaré, Carinhoso e Morro do Céu, áreas muito carentes do Rio de Janeiro. Apesar das dificuldades, os treinamentos são realizados de segunda a sexta-feira, enquanto as partidas acontecem nos fins de semana.

Franklin luta para chamar atenção de patrocinadores e voluntários para a reforma da sede da ONG, buscando sempre melhorar a estrutura para seguir auxiliando os jovens da Vila Aliança.

Confira a entrevista completa:

VAVEL: Apesar de todo esforço feito por quem está envolvido em projetos sociais, sempre aparecem dificuldades, seja na estrutura para treinamentos, na violência que cerca as favelas ou até em manter os jovens focados. Quais são os maiores problemas que você enfrenta para continuar o projeto há tanto tempo?

Franklin: A falta de financiamento nos deixa muito limitados. Mesmo assim, não ficamos reclamando, e sim vamos com mais garra para os campeonatos que disputamos, pois são neles que podemos mostrar nosso trabalho e, com isso, expandir o conhecimento do nosso trabalho.

VAVEL: Muitos jogadores saíram da Vila Aliança para outras equipes, incluindo clubes de fora do país, e agora o Bangu, que levou alguns atletas após a Taça das Favelas. Como é para você ver o sucesso desses jovens e conseguir realizar o sonho deles?

Franklin: Na verdade, me vejo como uma opção para que eles possam conseguir enxergar que têm qualidade para chegar aos seus sonhos. Os meninos, na maioria das vezes e em qualquer lugar do mundo, sonham com uma bola de futebol. A essência nas comunidades não é diferente, só mudam os nomes. Ver o sucesso deles é muito gratificante, pois mesmo com todas as dificuldades, é possível alcançar seus objetivos.

VAVEL: Qual foi o caso de maior sucesso que saiu da Vila Aliança e como foi contribuir com a formação desse jogador?

Franklin: Temos alguns, mas o caso de grande sucesso e, ao mesmo tempo, de grande tristeza foi em 2005. O nome do jovem é Paulo Vitor Barreto, que jogava no nosso projeto e foi para o Campo Grande Futebol Clube. Um dia olheiros de clubes italianos foram ao CT para ver um jogador que estava machucado e o Paulo Vitor era o reserva imediato. Foi a mão de Deus em sua vida, ele foi escolhido e se transferiu para o Treviso. De lá, sua carreira decolou, foi para a base do Milan, depois Udinese, Bari. Em 2006 ainda nos ajudou com os exames dos meninos, mas depois não tivemos mais notícias dele.

Hoje temos o Douglas Lima, de 20 anos, com contrato profissional no Ontario Fury, da Califórnia, jogando futebol indoor. O Alexandre Melo, de 18 anos, é atualmente jogado profissional do Clube de Regatas Vasco da Gama.

VAVEL: A vitória na Taça das Favelas desse ano foi fruto de um trabalho duro, já que independente de qualquer coisa vocês continuam treinando e se dedicando ao time. Qual é a sensação de vencer um título como esse?

Franklin: Com certeza a sensação é a de ganhar uma Copa do Mundo. As favelas passam a ser uma Seleção, é uma coisa surreal. É uma sensação maravilhosa ser campeão dessa Taça, pois não é só no campo, mas para a vida toda. Colocamos o nome da Vila Aliança para o mundo de uma forma diferente, não só como a mídia divulga sobre tráfico e outras coisas ruins. É bom poder mostrar para o mundo jovens que sonham e que lutam para serem algo que desejam.

Ver a favela parar nos bares, igualzinho a uma Copa do Mundo, não tem dinheiro que pague. Quando você anda na rua, todo mundo dando os parabéns, te abraçando. Tenho uma filha de dois anos, ver ela falar “papai, você foi campeão” foi impagável.

VAVEL: Quais são os seus objetivos para o futuro com os Craques da Vida?

Franklin: Fazer a obra na nova sede, aproveitar a oportunidade e pedir ajuda para esse nosso sonho. Também quero conseguir patrocinadores que possam financiar o projeto, capacitar mais ainda os profissionais que trabalham aqui, ter a oportunidade de mostrar para o mundo que, quando sonhamos e lutamos, chegamos aos nossos objetivos.

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