Não acumula golos sucessivos como Mitroglou nem está habituado a gozar de uma titularidade crónica no onze de Vitória, mas Raúl Jiménez, qual sorrateiro matador, saberá melhor que ninguém da sua crucial importância no Benfica das duas últimas épocas. Arma secreta tantas vezes mantida longe do olhar dos adeptos, o discreto avançado mexicano vem trilhando o seu caminho na Luz com humildade, paciência, e golos que desataram nós em momentos cruciais. Suplente de luxo? Activo subvalorizado? Titular na forja?

A verdade é que Jiménez não parece titubear perante as interrogações que, para além de ecoarem nas mentes dos adeptos encarnados, deverão também persistir na cabeça do jogador - paciente, o avançado de 26 anos espera pela sua vez. A vez de agarrar, definitivamente, o lugar de Mitroglou, fazendo parelha com Jonas. Durante o reinado de Rui Vitória, tal tem demorado, granjeando o mexicano de titularidades ocasionais. Mas os golos, esses, raramente faltaram. Durante 2016/2017, Jiménez actuou apenas 9 vezes na condição de titular, não celebrando apenas numa dessas partidas.

Para a Liga, o sul-americano apenas somou 6 titularidades, tendo assinado um golo em cada um desses encontros; na Liga dos Campeões mereceu a confiança do técnico por uma única vez, voltando a não deixar os seus créditos por mãos alheias; na Taça de Portugal a titularidade apenas chegou no jogo do Jamor, no qual abriu a contagem. Foi somente na Taça da Liga que o ex-Atleti passou ao lado dos golos enquanto titular. O excêntrico festejo com que fechou a época - colocando a máscara de um tal de 'Sin Cara' - contrasta com o perfil reservado com que encarou toda a temporada.

Por ironia de uma certa interpretação simbólica, a máscara de 'Sin Cara' parece até retratar o avançado mexicano: de tanto ser relegado para o banco de suplentes, entre titularidades esporádicas e saídas tardias do banco de suplentes, poucos se recordam, amiúde, da importância dos seus golos. Da sua marca no trilho encarnado. As estrelas dos filmes da Luz são encabeçadas por Mitroglou e Jonas: o grego pelo faro de golo à moda do típico ponta-de-lança clássico, o brasileiro pela 'finesse' inimitável com que passeia pelos relvados. Entre os golos de um e outro, Jiménez parece, de facto, interpretar um papel secundário.

Mas nesse estatuto de 'elenco de apoio', Raúl Jiménez tem servido, de modo ideal, os interesses do Benfica: não gozando do estatuto de crónico titular, o mexicano é, não raras vezes, lançado às feras em jogos duros, marcando golos que contribuiram para a glória benfiquista das duas últimas épocas. Para os mais atentos, ficam na retina o bis em Astana (2-2) que encerrou a qualificação para os oitavos-de-final da 'Champions' 2015/2016, o tento do empate diante do Moreirense (na vitória por 3-2, com golo aos 75 minutos, 2 após ter entrado em campo), o tento que desatou o nó em Coimbra (1-2 aos 85 minutos, 5 após ter saltado do banco), o golo salvador em Vila do Conde (0-1 aos 73 minutos, 6 após ser lançado em jogo) ou os golos diante do SC Braga (valeu a ida à final da Taça CTT, 2-1 na Luz) e Bayern (2-2).

Já na temporada que agora findou, Raúl Jiménez voltou a desempenhar o papel de arma secreta (e discreta!) na perfeição: não tremeu na marcação do penalty que deu o empate caseiro frente ao Vitória FC (na 3ª jornada da Liga meia hora após entrar em jogo), marcou ao Sporting (na 13ª jornada, com estatuto de titular), decidiu, novamente de penalty, a difícil saída à Amoreira (0-1 diante do Estoril, outra vez a titular), voltou a quebrar a barreira vilacondense (0-1 aos 75 minutos na jornada 32, como titular) e sacudiu o marasmo na final da Taça de Portugal, inaugurando o marcador aos 48 minutos.

Poderá Jiménez ascender ao papel principal no elenco da Luz? A recta final da época parece indicar isso mesmo, com o artilheiro-sombra a relegar Mitroglou para o banco nos últimos jogos; mas, perderá o mexicano o encanto, assim que venha a gozar do estatuto de titular? Ou, por outras palavras, é 'Sin Cara' Jiménez um jogador talhado para mexer com o jogo e não para iniciar o jogo? A sua utilidade cirúrgica fica, porém, inscrita no relato das épocas, bem audível nas celebrações dos adeptos, daqueles golos de alívio que os actores principais não estavam lá para marcar.