A chuva foi demais para tão pouca chama na Luz: os noventa minutos do «derby» lisboeta entre os encarnados e os «Azuis do Restelo» viram um Benfica preso de movimentos, apático perante a adversidade e inoperante na cara do desaire. No Sábado, a Luz não iluminou o suficiente e a chuva nem precisava de fustigar tanto para apagar a ténue chama da equipa de Jorge Jesus, que apenas durou pouco mais de vinte minutos para depois mergulhar na monotonia incapaz de alterar o rumo dos acontecimentos face à perícia defensiva do oponente e ao atrevimento dos seus esteios ofensivos, João Pedro e Fredy. As águias entraram com força e logo Cardozo testou o guardião Matt Jones: o aviso foi logo ao primeiro minuto e passado um quarto de hora o paraguaio confirmava as ameaças com um cabeceamento certeiro a cruzamento de Lima.

A entrada firme do Benfica deu lugar à reacção belenense, que depois de uma boa jogada de Fredy capitalizou de modo eficaz um canto a seu favor, equilibrando o marcador através da cabeça do médio defensivo Diakité, que subiu um andar acima de Fejsa para empatar o jogo. Passividade defensiva do Benfica e eficácia do Belenenses que, a partir do golo, ganhou confiança e estabilidade num meio-campo laborioso e empenhado onde o islandês Danielsson e o maliano Diakité brilharam ao manietar o futebol ofensivo do adversário. 

«60 minutos» em versão de apatia

Tendo-se colocado à frente no marcador à passagem do minuto 17, o Benfica viu o empate surgir à ultrapassagem da meia hora de jogo, e não mais o encontro viu golos: uma hora de inexpressão, uma hora de inexistente entrosamento, uma hora de atitude aquém, muitíssimo aquém da exigência que caracteriza o empenhamento de uma equipa que almeja arrebatar o título nacional. O Benfica esbarrou na sua própria apatia e ineficiência estrutural mas também na disciplinada organização do Belenenses, que se apresentou sólido no meio-campo e acertado qual relógio suiço na defesa, onde João Afonso e João Meira foram ponteiros centrais sempre serenos, secundados por Duarte Machado e Filipe Ferreira. Do lado encarnado, muitos foram os executantes virtuosos que pela Luz desfilaram, mas nenhum deles conseguiu roubar o espectáculo ao dissabor do empate: nem Markovic, apagado, nem Enzo, esforçado mas desapoiado, nem Matic, perdido em campo, nem Gaitán, retornado de lesão, nem Lima, comprometido mas abaixo do seu nível.

Apenas Cardozo abanou o jogo mas até o gigante desapareceu rapidamente. Num jogo com poucas situações flagrantes de golo, foi a chuva a dominar um jogo frio na alma e fraco à flor do relvado, onde, depois do bom início encarnado, foi a conteção azul a reinar, com calculismos bem medidos e saídas furtivas para o contra-ataque. Jorge Jesus puxou a equipa para a frente (colocou Rodrigo, Gaitán e Sulejmani) mas não houve eco dessa intenção no campo: a equipa já se desligara do jogo e nada haveria a fazer. E essa é a história do jogo benfiquista depois da meia hora: o empate pareceu, desde logo, uma fatalidade incontornável.

Regresso de Cortez no auge de Fredy

A grande surpresa do onze encarnado foi a chamada do brasileiro Cortez para tomar o lugar de Siqueira, poupado para a partida frente ao Paris Saint-German. O lateral ex-São Paulo regressou de lesão e foi titular num onze onde Maxi voltou à lateral direita e Lima se reapoderou do papel de segundo avançado. Mas, no meio da mediania, foi o extremo Fredy, do Belenenses, a mostrar habilidade para fazer tremer a defensiva da Luz, com correrias e dribles que colocaram em sentido as faixas e o centro da área das águias: as incursões de Fredy sucederam-se e o golo, nascido de um canto, tem origem numa jogada individual do extremo pelo lado esquerdo do ataque da formação da Cruz de Cristo. No primeiro jogo depois da despedida, espera-se que temporária, de Van der Gaag, os azuis conseguiram oferecer um ponto em honra do técnico que obteve a subida ao primeiro escalão do futebol nacional, e Marco Paulo, susbtituto do holandês, considerou o empate uma vitória: «Sabíamos os pontos fortes do Benfica, tentámos anulá-los e penso que conseguimos isso. Esta exibição é um sinal da qualidade e da determinação dos jogadores e também da vontade de inverter a nossa posição na tabela», considerou o novo treinador. 

Jesus e Vieira em coro contra a arbitragem

O jogo fica também marcado, inegavelmente, pelos erros de arbitragem cometidos pelo árbitro Jorge Tavares: o golo marcado por Diakité é manchado pelo movimento na direcção da bola, à boca da baliza, feito por Fredy, que se encontrava em posição de claro fora-de-jogo. O lance passou impunemente e foi validado pela equipa de arbitragem. Mais tarde, os benfiquistas reclamaram grande penalidade sobre Cardozo num duelo aéreo com os defesas belenenses: as imagens comprovam o agarrão ao paraguaio, novo erro de arbitragem.

Jesus e Luis Filipe Vieira, presidente do clube, alinharam pela crítica ao juiz da partida: «Fredy tem interferência na jogada», afirmou o técnico, não ilibando mesmo assim, a sua equipa: «Tentámos sempre mudar o resultado mas faltou alguma serenidade nos momentos de decisão. O Belenenses soube defender bem e ficou à espera do contra ataque e das bolas paradas. Perdemos dois pontos numa altura em que estávamos a recuperar e confiantes», aferiu Jesus. Já o presidente foi mais veemente nas críticas: «Este senhor, a um metro, um metro e meio, não conseguiu ver um fora de jogo. A equipa não esteve bem mas temos de continuar unidos. Hoje vou para casa triste mas também revoltado», declarou Vieira referindo-se ao árbitro Jorge Tavares e à sua prestação na partida. O Benfica perde terreno para o rival FC Porto que está de novo a cinco pontos, enquanto o Sporting sobe ao segundo posto com mais três pontos que as águias, que se quedam agora pelo quinto lugar.