Ainda que assumidamente Benfiquista, Fernando Santos nunca foi homem de polémicas. E por isso passou pelos três grandes sem deixar rastos de destruição junto dos adeptos rivais. Pode-se questionar o seu valor e alguns dos seus trabalhos mas é difícil colocar em causa a escolha tendo em conta o consenso que se gera à sua volta.

A FPF, quase sempre atrasada nas suas decisões, deparou-se com um problema difícil de resolver. Arriscar novamente num treinador pouco experiente poderia trazer graves efeitos em caso de fracasso. Arriscar num treinador demasiado conotado a um clube (Vítor Pereira também deve ter estado em cima da mesa…) também não parecia o mais adequado. E apostar num treinador estrangeiro, que poderia chegar e bater com o punho na mesa, também não interessava tendo em conta os mais que visíveis poderes paralelos instalados. Sobrava Fernando Santos e pouco mais, o leque de escolha também não era vasto. E, cá para nós, construiu uma carreira interessantíssima que culmina naturalmente no cargo de seleccionador nacional. Nada a dizer.

Fernando Santos até se habituou – enquanto seleccionador grego – a fazer umas omeletes razoáveis com poucos ovos. Os gregos enfrentam um momento complicado há um par de anos, com uma geração com pouquíssimo talento onde ainda havia espaço para os mais que acabados Karagounis, Katsouranis, Salpingidis ou Gekas. Ali os ‘craques’ eram Manolas, Holebas ou Mitroglou, nomes somente razoáveis no panorama internacional. E mesmo assim, Fernando Santos conseguiu a proeza de levar essa Grécia ao Mundial do Brasil e, mais relevante ainda, apurá-los para os oitavos de final da competição, um registo histórico para os helénicos. No mata-mata, saiu a fava aos gregos nas grandes penalidades, depois de terem sido superiores à Costa Rica durante todo o jogo.

Algum mérito deve ter tido Fernando Santos nessa caminhada. E a sua saída veio prová-lo ainda mais. No primeiro jogo oficial da Grécia pós-Santos, os helénicos (agora comandados por Ranieri, o técnico que mais estranhamente vai conseguindo grandes cargos sem resultados à vista…) foram derrotados em casa pela Roménia. Curiosamente o rival que Fernando Santos e seus pupilos eliminaram no Play-off de acesso ao Mundial do Brasil.

Ora bem, dizia eu que Fernando Santos se habituou a fazer bastante com o muito pouco que tinha à mão na selecção grega. Como em Portugal se ultrapassa também uma crise geracional de talentos (embora muito menor que a grega e menor também do que aquilo que muitos querem fazer crer), Fernando Santos tem aí um outro ponto a seu favor. Porque, pelo menos nesta fase, mais importante do que meter a equipa a jogar bem é metê-la a ganhar jogos. O comboio do Europeu já partiu e nós já vamos a correr atrás dele.

Mas Fernando Santos não terá essa margem de manobra para sempre. Em Portugal, habituamo-nos a bom futebol. Ganhar só não chega. Ou não chegará para sempre. Se de início se vão pedir ‘apenas’ bons resultados, em pouco tempo os bons resultados aliados a exibições pobres colocarão o seu nome em causa. Aconteceu com outros, acontecerá com ele também. E a seu favor tem uma fornada de talento como me parece que há muito não se via por cá.

Rony já brilha em França

Segui com muito interesse e entusiasmo as ligas europeias durante este fim-de-semana. Dei por mim a constatar que três miúdos portugueses do mais talentoso que existe na Europa do futebol estavam a jogar todos a titular ao mesmo tempo, em equipas de renome e em ligas de topo. Marcos Lopes (Rony, 18 anos) tem ganho o seu lugar no onze do Lille e este fim-de-semana voltou a começar de início numa equipa forte, que segue a um ponto do líder e que deixou no banco Origi (uma das revelações do Mundial), o talentoso internacional francês Corchia ou Balmont.

Também em França, Bernardo Silva (20 anos feitos em Agosto) estreou-se como titular pelo Monaco, depois de a meio da semana ter deixado água na boca em jogo para a Liga dos Campeões. O jovem esquerdino jogou o jogo todo e vai deixando boas impressões. Ao mesmo tempo que decorriam estes jogos em França, na poderosa Serie A jogava Bruno Fernandes (20 anos acabados de fazer), ao serviço da Udinese, onde vai jogando com bastante regularidade desde a época passada e já é seguido por Juventus ou Roma.

Fernandes é titular na Udinese

São apenas três exemplos do que aí vem, três jogadores que já vão dando cartas nos mais importantes palcos do futebol europeu. Como eles há mais pela Europa fora, uns sem espaço por cá, outros descobertos bem cedo por olheiros estrangeiros (talvez para o próprio bem da sua evolução).

Assim de cabeça, junto à lista André Gomes (21 feitos em Julho), médio titularíssimo no Valencia (segundo classificado em Espanha) que ontem se estreou a marcar pelos espanhóis na poderosa La Liga. No Valencia, quem também já vai sendo titular é Ruben Vezo (20). O central ontem voltou a jogar os 90’. Também na Liga Espanhola, Ricardo Horta (fez 20 anos há uma semana) agarrou a titularidade absoluta no Málaga. No Deportivo vai sendo titular Ivan Cavaleiro, aos 20 anos, mas sobre ele não tenho tantas expectativas. Mas não esquecer Bruma que com os seus 19 anos agarrou a titularidade no Galatasaray e parece totalmente recuperado da grave lesão. Talvez seja o que está no nível mais avançado desta geração.

Há muito mais por onde escolher, alguns infelizmente tapados nas nossas equipas. Rúben Neves e os seus 17 anos parece ser caso virgem no FC Porto. No Benfica, não houve espaço para João Teixeira que tanto fez na pré-época. No Sporting, aparentemente mais por imposição das limitações financeiras do que por estratégia, vão aparecendo mais, felizmente. João Mário tem potencial para ser fantástico, não é de hoje que se sabe isso. Mané também pode lá chegar e Esgaio pode vir a ser um lateral interessante. Falando, claro está, somente dos abaixo dos 21 anos, porque William Carvalho, Cédric e o próprio Adrien têm muitos anos de selecção pela frente.

Vem muito mais aí, quem segue as camadas jovens do futebol português (clubes e selecção) sabe-o bem. Fernando Santos terá a missão de enquadrar já alguns destes nomes, nomeadamente Marcos Lopes que junta ao talento a preocupante possibilidade de ser chamado pelo Brasil.

Quem tem a caminho do topo Bruma, Rony, Bruno Fernandes, Bernardo Silva, André Gomes, Rúben Vezo, João Mário, Ricardo Horta, Rúben Neves, Carlos Mané, Ivan Cavaleiro, Ilori, Rafa ou João Teixeira não pode ter qualquer medo do futuro que aí se avizinha. Na lista, falta saber como evoluem Bruno Varela, Paulo Oliveira, Edgar Ié, João Cancelo, Miguel Rodrigues, Raphael Guerreiro, Luís Martins, Sérgio Oliveira, Tozé, Iuri, Ricardo, Hélder Costa ou Gonçalo Paciência. Está aqui a base da selecção sub-21 que se apurou para o Play-off do Europeu da categoria só com vitórias e bom futebol. Nem vou aos sub-20, aos sub-19 ou aos sub-17, senão não saio daqui. Basta uma pequena pesquisa para perceber que esses escalões têm voltado a dar cartas nas competições internacionais, depois de um período duradouro de seca.

Senhor Fernando Santos, boa sorte! O futuro passa por aqui. Não é daqui a dois ou quatro anos. Alguns estão já preparados, outros estarão em muito pouco tempo. Curioso para ver a primeira convocatória. Espero não me desiludir.

* Este artigo foi cedido gentilmente pelo projecto «Palavras ao Poste», onde foi originalmente publicado.