São Petersburgo será a cidade palco da invasão da armada do Benfica, que na próxima Quarta-feira irá digladiar-se com as tropas russas do Zenit. O jogo, que tem carácter decisivo, será uma autêntica batalha pela sobrevivência na Liga dos Campeões, e para atingir o sucesso, um dos lados da barricada terá que condenar o outro ao fracasso: quem sair derrotado da batalha de São Petersburgo poderá ficar a um ténue passo da expulsão da Europa.

O Benfica, que saiu derrotado do confronto em Lisboa (0-2, com golos de Hulk e Witsel), possui 4 pontos e precisa desesperadamente de vencer a resistência russa de André Villas-Boas para alimentar a esperança de passar aos oitavos-de-final da competição milionária - o Zenit encontra-se na mesma situação pontual que as águias: precisa de vencer para acalentar o desejo de se manter na prova europeia dos milhões.

Invasão a Lisboa foi tranquila e deixou a Luz a arder

A armada russa do Zenit já demonstrou o osso duro de roer que é, tendo, em Lisboa, deixado a Luz em chamas com uma calma vitória por 0-2, com uns primeiros vinte minutos avassaladores que valeram dois golos e uma expulsão (Artur Moraes travou um isolado Danny). No restante da partida, o batalhão de São Petersburgo, comandado pelo ímpeto atacante de Shatov e Hulk e pelo brio defensivo de Garay e Javi Garcia, controlou a bel-prazer a reacção vermelha.

Com uma pressão intensa, com o intuito de barrar o pensamento construtivo do Benfica e entupir o desenvolvimento das jogadas, o Zenit sufocou os canais de comunicação da defesa e do meio-campo do Benfica, deixando os extremos e avançados à míngua. A velocidade de Shatov, Hulk e Danny, deixou o processo de transição primário dos encarnados encravado - Jardel sem capacidade de desenrolar jogo, Samaris desorientado enquanto pivot defensivo e Enzo desligado do centro de decisão das jogadas: um Benfica engasgado contra um Zenit subido e pressionante.

Os golos do Zenit transparecem o que acima é dito: perdas de bola dos encarnados na fase prematura da construção de jogo, passes errados sob pressão conjuntural (subida homogénea do Zenit, poucas linhas de passe para os defesas do Benfica) e resposta rápida e letal dos russos, com diagonais furtivas nos espaços dados pelos defesas encarnados. Tanto o primeiro golo como no lance da expulsão de Artur, o Zenit ganhou com a incerteza e tremura na saída de bola do oponente.

Chegará o 4-4-2 do Benfica para invadir São Petersburgo?

A pergunta é lógica e suscita-se sempre que o Benfica enfrenta uma formação de tarimba superior àquelas que normalmente encontra nas competições domésticas: chegará o habitual esquema táctico do Benfica para bater a oposição de uma equipa bem estruturada, com forte combatividade a meio-campo e três jogadores posicionados no centro do terreno, contra o duplo pivot do Benfica, assente em Samaris (médio defensivo) e Enzo (médio polivalente de construção)? A realidade dos resultados tem respondido que não.

Tendo em conta que o nível competitivo da Liga dos Campeões é bem diferente do da Liga Europa e colossalmente diferente do campeonato nacional, os resultados do Benfica na prova dos milhões têm mostrado um Benfica pouco consistente, permeável ao domínio dos adversários e normalmente incapaz de ultrapassar a fase de grupos - apenas por uma vez o Benfica de Jesus passou os grupos da «Champions». Nesta temporada, os encarnados apenas venceram um jogo em quatro realizados.

Quais as razões dessa crónica incapacidade? Apesar do Benfica ser constituído por executantes de alto calibre, dotados tecnicamente e capazes de tolher a concentração e marcação dos oponentes, a verdade é que o sistema táctico utilizado e as dinâmicas a ele inerentes deixam a estrutura encarnada exposta às virtudes combativas de adversários competentes na pressão, na ocupação de espaços e na anulação das peças do meio-campo encarnado, refém de um duplo pivot que pode facilmente ser isolado tacticamente - algo que Zenit e Bayer Leverkusen conseguiram fazer com eficácia.

Zenit - Benfica - Football tactics and formations

Acima temos os esquemas tácticos que deverão ser utilizados pelos dois técnicos portugueses: o Benfica com Samaris atrás de Enzo Pérez, utilizando os dois médios para defender e lançar as bases das jogadas, projectando os laterais ofensivos Maxi Pereira e Eliseu, e semeando os perigos Salvio-Gaitán-Talisca, trio de jogadores que tem como função dar o empurrão final no arranque do ataque encarnado. Mas, caso a pressão russa seja efectiva (usando Rondón, Hulk, Shatov e Danny), as possibilidades tácticas do Benfica sair a jogar são...diminutas.

Isto acontece porque o 4-4-2 do Benfica desenha-se, afinal, num 4-2-4, naturalmente mais desapoiado dada a distância entre os dois médios base e os extremos: Enzo e Samaris não gozam da proximidade táctica de Gaitán e Salvio na maioria das ocasiões, nem de Talisca, ainda estranho ao trabalho defensivo que Rodrigo fazia na temporada passada (à semelhança de Lima). Com a pressão dos quatro jogadores da frente (Zenit joga num 4-2-3-1), Javi Garcia e Witsel podem subir no terreno, pressionando mais acima e cortando linhas de passe na ligação do meio-campo encarnado (abaixo: perda de bola que originou golo de Hulk).

Apesar da crónica instabilidade nuclear no sistema encarnado, frágil perante formações fortes, o nível elevado dos jogadores do Benfica permite sonhar com a vitória contra, virtualmente, qualquer equipa do mundo. Jogadores de ruptura como Salvio, maestros de ataque como Gaitán ou farejadores de golo como Talisca ou Lima, poderão, a qualquer minuto, destrancar o jogo e abrir a porta dos golos. Além disso, a qualidade estonteante da manobra ofensiva, gizada pelo talento de Jorge Jesus, coloca em xeque a grande maioria das defesas.

O problema será, portanto, a possível fragmentação estrutural do Benfica, partido entre a incapacidade de sair a jogar e o vazio da posse de bola perante o controlo territorial do adversário - tal cenário voltou a repetir-se na cidade de Leverkusen, quando o Benfica caiu aos pés do Bayer, por 3-1. Os germânicos sufocaram o jogo do Benfica, pressionando com muitos jogadores e impedindo a formação de Jesus de pensar o jogo e de dominar a sua própria saída de bola: foram 45 minutos de fraco futebol encarnado.

Na Rússia, na cidade de São Petersburgo, o Benfica encontrará uma resistência fortificada por um 4-2-3-1 montado por Villas-Boas, assente na segurança defensiva do trinco Javi Garcia (ex-Benfica) e do auxílio táctico do versátil e tecnicista Witsel. Mais à frente, o trio de médios ofensivos terá como função desorganizar o posicionamento dos sectores recuados do Benfica, sempre tentando colocar jogadores nos espaços mortos entre as linhas do oponente, como a imagem acima demonstra - podemos também ver, de modo lúcido e límpido, o esquema de 4-2-3-1 do Zenit na sua explanação ofensiva.

Perder a batalha poderá significar perder a guerra

Quem sair derrotado da batalha de São Petersburgo dirá adeus à Liga dos Campeões e poderá ficar afastado da Liga Europa até. O Bayer lidera o grupo com 9 pontos, seguido do Mónaco com 5 pontos. Uma vitória, tanto de Benfica como de Zenit, abrirá as portas da continuidade da competição dos milhões, mas até um mero empate poderá aniquilar as probabilidades das duas equipas em manterem-se na Liga dos Campeões.

O Benfica jogará tudo na deslocação à Rússia, numa autêntica invasão de risco que será um teste de fogo às suas competências e ao estofo europeu de uma equipa que ainda não convenceu nos duelos internacionais durante a presente temporada. Conseguirá o Benfica ganhar a batalha de São Petersburgo?

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