Fez a diferença contra o Levante, ontem, no sempre exigente e eternamente insatisfeito Santiago Bernabéu, marcando dois golos e assumindo-se como o grande protagonista da partida, contribuição essencial para que o Real Madrid não descolasse do topo da tabela, encabeçado pelo rival Barcelona, que havia vencido a sua partida contra o Eibar. Gareth Bale brilhou e amenizou o rol de críticas tecidas à equipa «merengue».

A formação madrilena não passa um bom momento de forma e as exibições medíocres empilham-se em cima da reputação galáctica da equipa dos milhões infinitos. Com Cristiano Ronaldo, titulado melhor do mundo, Benzema goleador internacional, James Rodríguez craque emergente, Bale tem formado parcerias ofensivas profícuas - relembre-se que foi o galês a marcar o crucial tento que completou a cambalhota no marcador, diante do Atlético, na final da Liga dos Campeões 2013/2014, em Lisboa.

Mas a verdade mediática diz-nos que o reforço vindo do Tottenham, pago a peso de platina, nunca ganhou espaço consensual no coração da grande maioria dos adeptos «merengues». Gareth Bale chegou a Madrid no início da temporada passada, por uma quantia monstruosa similar à de Ronaldo, mas o seu percurso, repleto de lesões, contratempos físicos (alguns deles persistentes) e a cíclica condição de suplente de luxo oneroso, levaram a que o atleta nunca gozasse do estatuto de intocável.

Hoje natural titular no onze do Real Madrid, Bale beneficia da prolongada lesão de James Rodríguez, reforço pós-Mundial 2014 que chegou, viu e venceu nas preferências madrilenas. Uma vez recuperado, James será, provavelmente, o dono do lugar agora ocupado pelo dispendioso Bale, que poderá voltar à condição de suplente - e, quanto maior a contestação à equipa, maior a repercussão das críticas negativas direccionadas a Bale - pelo seu preço, pelo estatuto que a transferência antecipava mas que ainda não foi atingido.

Fogueira das vaidades: o «star-system» Real

Singrar entre as hostes do Bernabéu e entre a comunidade exigente do Real Madrid é tarefa árdua, nem todos os galácticos o conseguem: o desfile de estrelas no século XXI, próprio da era gastadora de Florentino Pérez, tem sido a passerelle temporal de uma parada de vedetas onerosas que, em muitos casos, nunca chegaram a embevecer os adeptos «blancos». Ronaldo Fenómeno, David Beckham, Michael Owen, Kaká, Van der Vaart, Wesley Sneijder, Arjen Robben, Mesut Ozil,fazem parte de um novo milénio feito de esbanjamento mas que nem sempre trouxe felicidade.

Quase todos os nomes acima citados não deixaram saudades no Bernabéu (Ozil não pelo que jogava mas pela pouca ternura granjeada entre adeptos) e muitos dos que singraram, como Angel Di María, não fizeram jorrar leitos de lágrimas - a exigência é tal que pouco tempo resta para saudosismos. Baseado numa filosofia de «star-system» rotativo que obriga os jogadores a lidarem com a pressão desportiva (natural) e com a pressão mediática (artificial), o colosso Real Madrid transforma-se muitas vezes numa feira das vaidades em que a exigência competitiva se confunde com o imediatismo frívolo dos resultados.

E, como em todo o imediatismo vaidoso das aparências, no fim, quem sofre é a equipa, mergulhada em perspectivas imponderadas, pressionada contra o céu galáctico da demanda de resultados e exibições que se comparem aos astronómicos valores gastos pela direcção «merengue». E, como sabemos, nem sempre o peso do dinheiro é suficiente para comprar boa qualidade de jogo - mais importante ainda é o sentido colectivo, a estabilidade táctica, filosófica e a boa consolidação das ideias do treinador. Carlo Ancelotti, apesar de ter erguido o troféu da «Champions», a ambicionado La Décima, sofre já a contestação.

To Bale or Not to Bale: uma questão maior que o galês

Cristiano Ronaldo, torpedeiro-mor da Liga e goleador impiedoso, abrandou o «goal spree» e já todos questionam a sua forma; Benzema também sofre as críticas impiedosas da imprensa desportiva e Gareth Bale, o senhor 90 milhões, esteve também na linha da frente das críticas, obrigando Florentino vir a terreiro, em sua defesa. Os dois golos marcados contra o Levante amenizarão a estridente crítica generalizada mas não durará muito tempo para que seja novamente colocada em silenciosa introspecção a questão: «To Bale or Not to Bale».

Permanecerá Bale no onze após o retorno de James? Deverá o Real continuar a apostar num activo dispendioso que poderá nunca se afirmar na equipa titular do Real Madrid fazendo jus ao dinheiro em si investido? Merecerá Bale continuar no clube, quando jogadores de craveira e provas dadas, como Ozil e Di María não mereceram continuar nos «merengues»? Ou conseguirá o galês ascender ao Olimpo «blanco», obtendo um estatuto que Figo e Zidane lograram obter? Todas estas interrogações pululam na cabeça de adeptos e analista.

Mas, subjacente ao dilema «To Bale or Not to Bale» está uma questão ainda mais crucial que todas as outras: deverá o Real continuar a apostar no «star-system football management» que reina no Bernabéu?