Chegou o dia de enfrentar um monstro - o FC Porto terá hoje a árdua e hercúlea tarefa de medir forças com o potente colosso mundial Bayern Munique, campeão da Bundesliga e um dos favoritos a arrebatar o troféu da Liga dos Campeões. Um Golias dos mais temíveis contra o Dragão de Julen Lopetegui, que esta noite encontrar-se-á com o seu homólogo espanhol Pep Guardiola a fim de discutir a passagem às meias-finais da competição dos milhões. 

O Bayern Munique chegou ao Porto com o seu inefável estatuto de monstro do futebol internacional, munido de estrelas cintilantes que, em condições normais, são capazes de roubar o espectáculo aos adversários e ofuscar o talento concorrente - com a espinha dorsal da campeão mundial Alemanha, a formação bávara ambiciona erguer de novo o troféu (que venceu com Jupp Heynckes, em 2012/2013) - nos últimos cinco anos, os bávaros alcançaram por três vezes a final da UEFA Liga dos Campeões.

Bayern de Guardiola é um camaleão táctico

Vindo de um campeonato sólido e competitivo, o líder Bayern (encabeça com tranquilidade a corrida à Bundesliga 2014/2015), de Pep Guardiola brilha através da sua dinâmica táctica baseada na posse de bola, qual «tiki-taka» em metamorfose, adaptado do estilo «blaugrana» à eficácia de processos germânica - o treinador catalão adicionou à abordagem da equipa uma panóplia táctica de recursos que torna o conjunto ainda mais imprevisível: partindo 4-2-3-1, o Bayern pode desenhar-se num 4-3-3 ou até num 5-3-2/3-5-2, dada a versatilidade dos seus executantes.

Jogando em casa, o FC Porto terá de, primeiramente, preocupar-se com a integridade estrutural do seu sistema defensivo -  Casemiro deverá patrulhar a zona média-baixa do perímetro portista, coordenando as movimentações cautelosas da defesa, auxiliando as funções dos defesas laterais e ajudando às tarefas dos defesas centrais, que terão de lidar com o mortífero Robert Lewandowski e com o inquieto «Ramdeuter» Thomas Muller, avançado fingido que busca incessantemente o espaço morto. Danilo e Alex Sandro estarão, certamente, obrigados e aventurar-se pouco no ataque, dada a profundidade das alas bávaras.

Cautelas & lesões - todos terão muito de ambos

Casemiro terá de, obrigatoriamente, gozar da ajuda incansável do mexicano Herrera, que ficará agarrado a tarefas defensivas de compensação no meio-campo, de forma a sustentar, com o colega brasileiro, uma linha recuada que se estacione perto da linha de quatro defesas do FC Porto, de modo a reduzir espaços e a dar o controlo ao Bayern - Quaresma e Brahimi estarão encarregados de lançar velozes contra-ataques, a maior arma do Dragão nesta partida. Proibitivo será também dar liberdade a Xabi Alonso - o espanhol é o construtor de jogo da equipa o pilar cerebral do futebol germânico.

Sem o goleador colombiano Jackson Martínez, o Porto apresentar-se-á hoje privado da sua maior arma; Vincent Aboubakar será o avançado de serviço, apoiado por Quaresma (Tello está lesionado) e Yacine Brahimi, o argelino mágico do Dragão. Mas também o rival se apresentará coxo: Pep Guardiola não poderá contar com os extremos Arjen Robben e Frank Ribéry (setas de perigo constante), nem com David Alaba, Bastian Schweinsteiger, Javi Martínez e Benatia, factor que poderá dar confiança à equipa portuguesa. Ainda assim, o Bayern não perde o seu estatuto de temível Golias.

Um passeio pelo registo da memória: Dragão inspira-se em 1987

Esta será a sexta vez que FC Porto e Bayern Munique se encontrarão na História do futebol - o saldo, renhido, é favorável aos alemães, que venceram os lusos por duas ocasiões contra um triunfo português do Dragão. A primeira vez que as duas equipas cruzaram destinos, a sorte sorriu ao FC Porto, logo numa finalíssima que voltou a glorificar a História do futebol português, 25 anos depois do épico Benfica da década de 60: em 1987, no saudoso Praterstadion, o Porto bateu o Bayern por 2-1, com golos de Rabah Madjer (aos 77 minutos) e Juary (aos 79), anulando a vantagem dada por Kogl. O famoso toque de calcanhar do argelino, aliado à magia de Paulo Futre, António Sousa, Jaime Magalhães e companhia, catapultaram lendário Porto para o primeiro triunfo na competição.

Mas estes quartos-de-final entre Porto e Bayern não são inéditos - as duas formações cruzaram-se na temporada 1990/1991 no mesmo local do labirinto da UEFA Liga dos Campeões. Os alemães tropeçaram em casa, logo na primeira mão (1-1) mas souberam corrigir a mão e, no segundo jogo da eliminatória, no Porto, bateram o Dragão por 0-2, Christian Ziege e Manfred Bender. Na viragem do século, 1999/2000, as duas equipas repetiram o duelo, nos mesmos quartos-de-final - Jardel marcou na Invicta mas Paulo Sérgio empataria aos 80 minutos, deixando o Bayern em vantagem na contenda.

Em Munique, na segunda mão, o Bayern viria a terminar com o sonho portista, vencendo 2-1 com golos de Paulo Sérgio e Thomas Linke; Mário Jardel ainda balançaria as redes bávaras (aos 90 minutos) mas o destino luso estava já traçado. Para a História fica ainda o nome do avançado Domingos Paciência, já que o agora treinador foi o único jogador português a marcar um golo ao colosso de Munique (todos os restantes quatro golos portistas foram apontados por estrangeiros). 

Sonhar contra as probabilidades

O Porto procurará, ainda, vencer pela primeira vez o Bayern Munique em casa, já que, nos cinco encontros do passado, o Dragão apenas bateu o monstro bávaro num terreno neutral, o tal mítico Praterstadion, situado na Áustria. Para sonhar, os portistas terão de tapar os caminhos da baliza de Fabiano, usando a eficácia como arma maior contra o favoritismo da sábia e experiente equipa alemã. Mesmo que as probabilidades destroçem o Porto, sonhar é condição essencial para suar, no relvado, até à última gota - com pouco a perder, o Dragão sabe que, com um pouco de sorte e muito esforço, poderá tornar o sonho real.