Se há uns anos alguém dissesse a José Mourinho que o Chelsea – clube inglês que treinador português “ressuscitou” no início do milénio – iria atravessar um dos piores capítulos da sua história, com um arranque de época a um nível decadente, o técnico iria provavelmente rir-se na cara dessa pessoa.

Contudo, nos dias que correm, é isto que se verifica em Stamford Bridge. Muitos analistas e figuras importantes dentro do universo futebolístico estão a tentar entender o que se passa no balneário do clube londrino mas não encontram razões para tal descalabro, pelo menos, dentro destas proporções. Para além de não ser nada fácil justificar a forma decadente de muitos jogadores-chave do plantel – uma espécie de vírus que afetou nomes como Hazard, Diego Costa, Ivanovic, Fàbregas e Matic – também não existem razões palpáveis para explicar como é que o campeão inglês está a quinze pontos do primeiro lugar na tabela classificativa ao fim de apenas doze jornadas.

Talvez a justificação esteja no historial da carreira de José Mourinho. Ao analisarmos a carreira brilhante do técnico português notamos um certo padrão de declínio na forma das suas equipas: após conduzir o FC Porto a duas épocas de sonho entre 2003 e 2004 (com a conquista da extinta Taça UEFA, Liga dos Campeões e provas internas do campeonato português), o setubalense acabou por sair, pela porta pequena – face às divergências com adeptos e  figuras importantes da presidência do clube – para um clube que tinha sofrido uma mutação financeira radical, o Chelsea de Londres. Muitos duvidaram se o treinador iria levar o clube inglês à glória mas os resultados provaram o contrário: com a conquista do título mais prestigiante do futebol inglês, algo que não acontecia, em Stamford Bridge, há mais de quarenta anos. A segunda época mostrou, novamente, um clube faminto por títulos. Mas o mau arranque em 2007 ditou a saída do Special One.

Já em Itália ao serviço do Inter de Milão, José Mourinho comprovou porque é considerado um dos melhores treinadores do mundo e atravessou um período de estabilidade que culminou com várias conquistas importantes entre 2008 e o ínicio de 2010, entre as quais uma Liga dos Campeões. Nesse mesmo ano mudou para Madrid e começou um dos períodos mais conturbados da sua vida. Apesar de ter feito um trabalho  notável com o Real Madrid, foi desgastado pela imprensa espanhola, adeptos e até mesmo jogadores do próprio balneário – como o caso, já bastante debatido, de Iker Casillas.

A 10 de Junho de 2013, José Mourinho regressou ao Chelsea. Na primeira conferência de imprensa, destaca a felicidade que sente e autodenomina-se de “Happy One”. Nesse mesmo ano, refere, várias vezes, que esta seria uma “época de transição” e acaba por ficar em terceiro lugar. No ano seguinte, Mourinho é nomeado o Treinador do Ano e vence a Taça da Liga e a Barclays Premier League. Se fizermos fast-forward para Novembro de 2015, vemos o Chelsea em 16º lugar, a realizar um dos piores arranques de sempre e a somar derrota atrás de derrota tanto dentro de portas como em terrenos, na teoria, minimamente acessíveis.

Para além disto, observamos, ainda, uma série de factores que assolaram a vida do português nos últimos tempos. Na verdade, o técnico nunca alimentou tantas polémicas como em 2015: com o episódio caricato com Eva Carneiro (fisioterapeuta dos blues que apresentou recentemente a carta de demissão), diversas punições por parte da Federação Inglesa, problemas com a imprensa britânica, e um balneário, que apesar de o negar, parece estar a “fazer a cama” ao treinador português.

Porém, e é aqui que está o problema central, o prazo de José Mourinho está a atingir uma ruptura incompreensível. Apesar da confiança do treinador nos jogadores, estes demonstram exactamente o contrário quando estão em campo. Até o estilo de jogo da equipa mostra um rumo inverso às ideias de Mourinho – o Chelsea entra no relvado com vontade de vencer mas a ansiedade toma conta da mente dos jogadores, o que resulta numa permeabilidade pouco comum no sector defensivo (nunca um campeão inglês mostrou um registo tão deficitário no que diz respeito a golos sofridos) e uma apatia constante no meio-campo, com perdas de bolas infantis, pouca pressão no miolo e com o  próprio ataque a um nível irreconhecível, com a equipa a depender, constantemente, dos “coelhos da cartola” que Willian tem tirado ao longo das últimas partidas.

Muitos referem que o treinador deveria colocar o lugar à disposição ou que simplesmente deveria fazer um ano sabático – uma das modas do futebol moderno. Contudo, estas possíveis resoluções não seriam bem aceites pelos adeptos blues (que continuam a apoiar e a cantar, em uníssono, o nome do português) e que poderiam, de certa forma, manchar a carreira brilhante de Mourinho.

Porém, torna-se mais que evidente que o treinador tem de reinventar o seu estilo de jogo, aproximar o balneário, utilizar outro tipo de mind games, admitir que erra na utilização de determinados jogadores que estão em péssima forma e até mesmo, tentar aproveitar o potencial da academia de jogadores do Chelsea – que mostra, cada vez mais, que pode dar cartas num patamar mais elevado.

Só que o relógio não pára e o tempo de José Mourinho parece estar a acabar, o que pode provocar uma mudança radical na maneira como o setubalense tem inscrito páginas de sucesso no futebol. Poderá deixar-se de falar em Special One e sim no Normal One (termo adaptado pela imprensa britânica e alguns jogadores do clube, como Eden Hazard), uma figura construída em redor de um mito que soube aproveitar, da melhor forma, determinadas circunstâncias para vingar no universo futebolístico. Ninguém sabe se o técnico português vai continuar um legado imaculado ou se vai cair redondamente mas os próximos jogos parecem ser decisivos para o futuro do Special One.