Apesar do triunfo desta noite de quarta-feira diante o Málaga, a vida do Valência está longe de estar tranquila. A formação do magnata Peter Lim, que investiu em nomes como Enzo Pérez, Rodrigo ou Negredo, está a atravessar um período dramático na presente temporada, ocupando o 9º lugar da La Liga com 34 pontos, a 10 da perigosa zona de descida de escalão (à condição). No Valência, André Gomes tem sido a estrela mais brilhante, mas nem o luso evitou a recente eliminação vergonhosa na Taça do Rei frente ao Barcelona. Com Nuno Espírito Santo a treinar os resultados foram intermitentes, mas com Gary Neville o Valência perdeu rigor tático e alegria em praticar futebol. Valeu a pena despedir o técnico lusitano?

Valência sem potência

Nas 2 últimas temporadas o Valência mudou drasticamente a sua política de investimento, tendo Peter Lim assumido a presidência do clube espanhol. O multi-milionário com ligações a Jorge Mendes revolucionou o clube em parceria com o agente português, e contratou o técnico ex-Rio Ave Nuno Espírito Santo. A crítica espanhola apostou logo numa estratégia atacante, desconfiando das capacidades do treinador luso. Antes de ser treinador, Nuno Espírito Santo foi guarda-redes, e nas conferências de imprensa foram inúmeras as vezes em que vestiu virtualmente as luvas para se defender dos "remates potentes" dos jornalistas.

Do Benfica chegaram a Valência craques como Cancelo, André Gomes, Enzo Pérez e Rodrigo, com destaque também para Otamendi do FC Porto. Nesta temporada, Negredo foi a grande aquisição e a esperança em chegar aos lugares da frente na Liga cresceu exponecialmente. Para lutar contra Atlético de Madrid, Barcelona e Real Madrid, a direção do Valência deveria ter dado mais tempo a Nuno Espírito Santo, mas a feroz frente ofensiva jornalística atacava o treinador luso a cada empate, e por vezes até quando se registava uma vitória.

Para 2015/2016 o Valência perdeu Otamendi, tratando-se de uma contrariedade que se viria a revelar irreparável. Em termos táticos o Valência estava bem estruturado, com um meio campo sólido onde André Gomes se destacava com capacidade técnica para transportar o esférico e distribuir jogo na frente, e até finalizar alguns lances com grandes golos. Mas, no final do mês de novembro, Nuno Espírito Santo foi demitido por ter deixado o Valência em 9º lugar do campeonato, com 19 pontos num total de 13 partidas. Avaliar esta estatística é subjectivo, mas se equacionarmos a concorrência de Atlético de Madrid, Barcelona e Real Madrid acaba por ser no mínimo estranho despedir um treinador promissor que estava a desenvolver um projecto aliciante.

Os milhões investidos fizeram os adeptos sonhar pelo título, mas com os pés assentes na terra é simples concluir que o Valência está a léguas dos rivais que lutam pelo campeonato. O plantel dos valencianos é valioso, mas logo na defesa se observa que, por exemplo, Aderlan Santos não corta lances como o prodígio Otamendi. O argentino era o patrão do último reduto e a sua venda não foi colmatada da melhor forma. Uma vez demitido o treinador lusitano a imprensa espanhola bateu palmas, e foi com sorrisos que recebeu Gary Neville como novo técnico do Valência.

O encanto do adeptos foi, no entanto, momentâneo. O inglês conseguiu a proeza de destruir o trabalho tático de Espírito Santo, passando o Valência a jogar um futebol desorganizado e que não benificia o potencial individual dos jogadores. Em 14 jogos na Liga BBVA no comando técnico, Gary Neville regista 5 derrotas, 6 empates e apenas 3 vitórias. Este registo revela um Valência triste a jogar futebol, instável e longe dos lugares cimeiros. A 11 jogos do fim do campeonato, os valencianos ocupam o 9º lugar com 34 pontos apenas, 10 acima da linha da água (à condição).

Recentemente, o desaire no campeonato frente ao Bilbao por 3-0 humilhou o Valência, mas o que dizer dos 7-0 para a Taça do Rei diante o Barcelona? Sem rodeios, estes resultados espelham uma equipa que treme a defender, é frágil no miolo e é inofensiva no ataque. Os ecos destes resultados são, no entanto, demasiado simpáticos, e parece que desde que Espírito Santo saiu que tudo ficou resolvido no futebol do Valência.

Em suma, é notória uma estrutura directiva que só sabe investir, sem ter a experiência de um clube grande para cumprir um projecto que se esperava de sucesso. Um treinador promissor, jogadores de qualidade, mas uma estrutura que cedeu à pressão dos adeptos e de alguma comunicação social. Com Gary Neville é doloroso ver o Valência jogar e levanta-se a questão: valeu a pena demitir o treinador que deixou a equipa com uma melhor média de pontos em menos jogos? Sem Espírito Santo resta ao Valência esperar por um milagre.