A pergunta impõe-se, quando, munidos de um olhar táctico sobre o «derby» de amanhã, analisamos os corações tácticos de Benfica e Sporting: será capaz o duplo pivot encarnado de vencer a batalha no miolo, perante um Sporting que actua em casa, banhado pelo optimismo dos seus adeptos? Por outras palavras, será o Benfica capaz de suster o rival, pressionando efectivamente a liberdade de movimentos dos Leões logo na saída de bola destes, ocupando a faixa central do terreno de forma combativa?

A pergunta impõe-se por dois motivos: primeiro, porque é muitas vezes no meio-campo que formações de semelhante valia conseguem ganhar vantagem táctica, e, por conseguinte, vantagem sistémica durante a partida, controlando melhor os espaços, ocupando de modo mais eficiente o terreno e limitando a manobra do adversário, cortando linhas de passe, ganhando duelos e impedindo a alimentação ofensiva da equipa. Em segundo lugar, porque o Benfica, montado no esqueleto habitual do 4-4-2 (herança de Jesus), não tem sido capaz de ser sólido contra rivais de valia elevada.

Essa carência táctica evidenciou-se nos primórdios de Rui Vitória ao leme dos encarnados, logo na partida da Supertaça, onde o Sporting se fez valer da sua superioridade operacional no miolo; no particular duelo com os Leões, o Benfica voltou a sair machucado quando mediu forças com a nova equipa de Jorge Jesus: na Luz, o peso do 0-3 realçou a fragilidade táctica de uma equipa que também vivia um período emocional débil. Actuando no seu 4-4-2 que na verdade apenas dispõem de dois jogadores demarcadamente centrocampistas, o Benfica viu-se sempre em inferioridade no meio-campo.

Isto porque, diante de um Sporting mais bem pragmático que o mais pragmático dos Benficas de Jesus (foi factual a curva ascendente da vertente pragmática na filosofia táctica de Jesus durante os seis anos), o Benfica viu-se inúmeras vezes em desvantagem, perante um meio-campo leonino munido de um médio defensivo posicional estático (William Carvalho), um médio todo-o-terreno com excelente capacidade de organização de jogo (Adrien) e uma muleta táctica essencial, capaz de equilibrar o meio-campo e ainda dar extensão ao jogo do Sporting (João Mário).

A evolução táctica deste Benfica 2015/2016 fez-se sentir avultadamente com a deriva de Pizzi para a faixa direita e a inclusão de Renato Sanches na linha intermédia - assim sim, as Águias ganharam asas para poderem planar, ganhando estabilidade global, um valor indispensável ainda mais importante que a exacerbada veia ofensiva, isto porque, em duelos feitos de equilíbrio, a chave está, normalmente, na homeostase táctica da equipa. Pizzi passou a ser, em «part-time», um auxílio ao duplo pivot de meio-campo, enquanto Renato Sanches deu à aquilo que ela não tinha nem terá na sua ausência.

E o que deu o jovem Renato, tido como impulsionador do futebol encarnado? Deu, tão simplesmente, dinâmica táctica (na capacidade de ser um pêndulo a balançar entre as funções defensivas e atacantes) e maior dimensão física ao jogo do Benfica: desde que se estabilizou no onze de Rui Vitória, as Águias ganharam uma couraça totalmente nova, voltando a ter, no miolo, um activo capaz de elaborar jogadas pela raiz. Está longe de ser um médio completo (falta-lhe naturalmente maior perspicácia na leitura defensiva do jogo) mas a estreia em «derbies» contra o Sporting poderá dar nova alma ao futebol encarnado.

Será este figurino táctico suficiente para, em pleno reduto de Alvalade, encravar a manobra do Leão? Sabe-se de antemão que as valências complementares de Adrien e William montam um meio-campo sólido, capaz de, através do auxílio do incansável João Mário (um dos grandes pensadores do jogo ofensivo do Sporting) monopolizar as incidências do jogo e refrear o ímpeto ofensivo dos adversários. Apenas o cooperativismo e o mutualismo poderão fazer a diferença num duelo tão equilibrado - serão a capacidade física e versatilidade táctica as chaves do jogo. 

Ora, dadas as características de jogadores como Gaitán e Mitroglou (pouco aptos a pressionar, a ler defensivamente os espaços e a suar de forma extra pela integridade táctica da equipa) poderá ser expectável que Rui Vitória jogue apenas com um ponta-de-lança (Jonas), lançando mais um médio no miolo ou até dando a titularidade a Salvio ou Carcela, na direita, centrando Pizzi e actuando assim num hipotético 4-3-3 ou 4-2-3-1. Se Vitória considerar vital o triunfo a meio-campo como caminho para a vitória, essa é uma solução pertinente. Já Jesus pouco mudará, espera-se; ainda assim, Teo deverá ficar no banco, sendo Ruiz um segundo avançado mais operante no meio-campo.