A época 2015/2016 iniciou-se no reino das águias sob o símbolo da mudança. Luís Filipe Vieira prometeu um Benfica mais português, onde a formação teria um peso enorme na formação principal do emblema da Luz, com Rui Vitória a ser o homem escolhido para levar o novo projecto desportivo a bom porto. Meio ano volvido os resultados estão à vista: líder isolado do campeonato português, presença assegurada nas meias-finais da Taça da Liga, e com fortes possibilidades de passagem aos quartos-de-final da maior prova de clubes do Mundo, a Liga dos Campeões. Eis um Benfica renovado nos seus ideais, e onde a formação encerra por fim um peso relevante na vida do clube. Mas compreender o projecto desportivo deste Benfica implica perceber o que mudou no novo século nas estruturas do emblema da segunda circular.

Centro de Estágios do Seixal: do sonho à realidade

Quando Luís Filipe Vieira assumiu os destinos do emblema da Luz, apresentou como porta estandarte da sua campanha o desejo de recuperar a grandeza patenteada pelo clube no século passado. Para lá da componente desportiva, Vieira defendia a criação de estruturas condizentes com a grandeza histórica do clube. Foi assim que nasceu o projecto do Caixa Futebol Campus, o complexo desportivo que hoje alberga as formações jovens do futebol encarnado, e serve de centro de treinos à principal equipa de futebol.

Inaugurado a 22 de Setembro de 2006, o Caixa Futebol Campus conta com seis campos de futebol, três dos quais sintéticos, dispondo ainda de um luxuoso edifício que serve de albergue aos jovens jogadores do clube. Com um custo estimado em cerca de 15 milhões de euros, o projecto atravessa nova fase de expansão, tendo em vista a acomodação de todos os jogadores da formação do Benfica. O projecto é tal como o estádio, o símbolo maior de um Benfica moderno, e que soube nos últimos anos reerguer-se após a grave crise desportiva e financeira que atravessou no final da década de 90. Representa o novo paradigma do clube, que procura cada vez mais apostar na formação e retomar a linha desportiva que o caracterizou no passado, bem evidenciada em antigas glórias como Humberto Coelho, Fernando Chalana ou mais recentemente Rui Costa.

Rui Costa foi uma das estrelas da Academia das águias
Rui Costa foi uma das estrelas da Academia das águias

Rui Costa, o último símbolo da formação

Desde os tempos de Rui Costa que toda a nação benfiquista anseia por um novo símbolo da formação encarnada. Um jogador formado no clube, que sinta os valores e a mística do Benfica, um representante digno da segurança de Humberto Coelho, dos malabarismos de Chalana, da magia de Rui Costa. O novo século trouxe promessas falhadas, e protótipos de futuras vedetas que nunca o chegaram a ser. De Hugo Leal, herdeiro hipotético da mítica camisola dez, a Pepa, herói preconizado num célebre Benfica x Rio Ave, todas as novas coqueluxes encarnadas foram-se diluindo nas exigências do futebol contemporâneo. Foi tendo por base este pressuposto que Vieira apostou no centro de estágios do Seixal como novo bastião do futebol jovem encarnado, um complexo que garante aos jovens jogadores encarnados todas as condições para se prepararem para as exigências competitivas que o mundo do futebol acarreta.

Foi já com Jorge Jesus ao leme do Benfica que começaram a surgir os primeiros indícios de mudança no paradigma do futebol encarnado. Paulatinamente jogadores vindos da formação do clube passaram a integrar os quadros da primeira equipa. Primeiro com David Simão, Miguel Rosa e Nelson Oliveira, e mais recentemente com André Gomes e André Almeida, pese que estes não tenham efectuado toda a formação no emblema encarnado. A aposta no jogador da formação começava a surgir de forma sistemática no discurso da estrutura benfiquista, que ambicionava ver uma presença mais significativa dos seus jovens na primeira equipa de futebol.

André Gomes foi outro jogador da formação em destaque
André Gomes foi outro jogador da formação em destaque

Neste campo, a criação da equipa B na temporada 2012/2013 teve o condão de garantir a estes jovens jogadores a necessária adaptação ao desporto sénior, através da inclusão da equipa secundária no segundo escalão do futebol nacional. Estava dado o derradeiro passo para a preconização de um novo paradigma no futebol do Benfica, onde por fim os jovens vindos da formação garantiam a necessária rodagem futebolística antes de abraçarem uma oportunidade na equipa principal.

Das vendas milionárias ao Benfica de Rui Vitória

Contrariamente ao que seria expectável, a aposta na formação não foi tão clara como tudo indicava que viria a ser nas duas últimas temporadas. Nomes como João Cancelo, Ivan Cavaleiro ou Bernardo Silva não vingaram no plantel, e acabaram por rumar a outras paragens a troco de quantias megalómanas. Bernardo Silva acabou por ser o nome mais controverso de entre estes jogadores. A principal figura da selecção Sub 21 portuguesa no último europeu do escalão acabou por ser transferido para o Mónaco por cerca de quinze milhões de euros, não chegando a singrar no seu clube de sempre. Pese a falta de protagonismo nas primeiras escolhas de Jorge Jesus, Bernardo Silva acabou por se tornar no símbolo maior do novo projecto desportivo encarnado, a figura de toda a formação Caixa Futebol Campus, que por fim dava aos seus adeptos os primeiros indícios claros do trabalho que ali tinha vindo a ser desenvolvido.

A época 2015/2016 trouxe-nos por fim um Benfica virado para a formação. Após um excelente trabalho no Vitória de Guimarães, com recurso à formação do clube vimaranense, Rui Vitória foi o eleito pela direcção benfiquista para assumir os destinos do clube lisboeta. Ao todo foram seis os jogadores provenientes da formação que integraram o plantel principal do Sport Lisboa e Benfica nesta nova temporada, e a verdade é que excepção feita a João Teixeira todos eles têm tido oportunidades dentro da equipa. De Lindelof, a Nelson Semedo, passando por Ederson ou Gonçalo Guedes todos os jovens jogadores provenientes da equipa B têm entrado nas primeiras escolhas da equipa em determinados períodos da temporada. Neste ponto há um nome que se destaca de todos eles: Renato Sanches.

Foto: AFP // GettyImages
Foto: AFP // GettyImages

Aos 18 anos, o internacional jovem português não só agarrou o lugar no meio-campo encarnado como se assumiu como principal figura de todo o novo projecto desportivo encarnado. Chega a parecer incrível que tenha somente 18 anos, tal é a maturidade com que assume a batuta de todo o futebol benfiquista, gerindo o ritmo de jogo da equipa, qual pêndulo no meio-campo encarnado. Dotado de uma força e cultura táctica invulgares para um jovem da sua idade, Renato é a nova conqueluche encarnada, o novo menino bonito da massa associativa.

E a verdade é que analisar o Benfica de Rui Vitória implica reconhecer a existência de um Benfica pré e após Renato Sanches, onde o jovem nascido e criado na Musgueira transporta para o terreno de jogo a irreverência do futebol de rua, com os princípios tácticos que assimilou ao longo de mais de dez anos de futebol no centro de estágios do Seixal. Por tudo isto, Renato personifica todo o projecto de formação do Benfica, materializa os sonhos dos seus adeptos e representa por fim um digno sucessor das antigas glórias encarnadas. Pode descansar por fim Rui Costa, pois a nação benfiquista já encontrou um novo herdeiro de entre os seus.

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Sobre o autor
Marco Afonso
Mestrado em Comunicação