Uma coisa parece certa e garantida neste Mundial 2014: não resistem quaisquer dúvidas em relação ao estatuto de surpresa-mor da prova para a Costa Rica, equipa superiormente orientada pelo colombiano Jorge Luis Pinto mas também uma nação marcada pelo bom trabalho desempenhado em duas passagens por um técnico português, Guilherme Farinha de seu nome.

O experiente treinador continua a residir e a trabalhar no país no qual se fixou e ajudou a criar condições futebolísticas para que o desenvolvimento chegasse ao ponto que o panorama internacional agora bem conhece e a partir do qual acedeu a prestar uma entrevista, respondendo a questões preparadas pelo jornalista brasileiro Ulisses Carvalho e a mim próprio num exclusivo nacional para VAVEL.

Rafael Reis: Espero que esteja a correr-lhe tudo como espera pela Costa Rica, será para continuar?

Na Costa Rica felizmente correu bem, fomos vice-campeões do Torneio de Copa, fizemos 5º lugar e estivemos a lutar até á ultima jornada para entrar nos 4 primeiros, para as semifinais. Em 66 anos de história da AD Carmelita fui considerado o melhor treinador do clube.

A equipa foi considerada a que melhor futebol praticou no campeonato nacional e estive entre os nomeados para o melhor Técnico do ano. E, por tudo isto, fui convidado a renovar contrato, o que fiz com muito agrado apesar de ter outras propostas.

Ulisses Carvalho: Como está o trabalho no Carmelita?

A AD Carmelita assinou contrato comigo na época passada, é um clube no pequeno bairro de Alajuela e que geralmente está na II Divisão e este ano conseguimos o título de vice-campeões no Torneio de Copa ao perdermos por penalties com o Saprissa, o campeão nacional. Ficámos em quinto lugar, temos o jogador com o golo mais bonito da época e eu estou entre os nomeados para melhor treinador do ano…

UC: Por que não foi jogador de futebol mas sim técnico? Como conseguiu seu primeiro emprego no futebol?

Nunca fui jogador de elite mas sempre joguei, desde os 8 até aos 25 anos, o meu primeiro treinador foi o Sr. Mário Lino no Sporting, como aspirante joguei no GDCR Os Mouros tendo como treinador o Sr. Luís Norton de Matos numa competição organizada pela AF Lisboa. 

Como sénior joguei no SBC e Woensel e também no Best-Voruit, todos da Holanda. Era jogador dos aspirantes de Os Mouros na época de 79/80 e a Direcção do clube convidou-me para treinar a categoria de Iniciados e aí comecei a minha carreira de treinador.


RR: Pode descrever os primeiros passos da sua longa carreira enquanto técnico?

A minha carreira não começou no Fanhões, começou nos Iniciados do Mouros durante duas épocas, ainda jovem e estudante, e na minha série só o Sporting me ganhava, cheguei inclusive a empatar com eles sendo eu jogador dos aspirantes do mesmo clube, na altura treinado por Luís Norton de Matos. Apareço depois como treinador dos Juniores do Fanhões graças ao convite de um grande amigo meu nessa altura director do clube, o Eng. João Duarte.

Depois passei pelo futebol da Holanda, onde treinei os seniores do KS Broekhoven, da cidade de Tilburg, nessa altura fui o primeiro treinador português a treinar na Holanda e quiçá dos primeiros na Europa.

Regressando da Holanda, treinei o Vitória Clube de Lisboa, da III Divisão e depois fui convidado a treinar o FC Oliveira do Hospital, também da III Divisão antes de aceitar a possibilidade de treinar a selecção da Guiné-Bissau e assumir o assessoriamento técnico do Centro Nacional de Formação de futebolistas e a organização de todos os campeonatos dos escalões etários de formação, das Escolas até aos Juniores.

UC: Através de quem surgiu a proposta da Seleção de Guiné Bissau e como era o país naquela época, as dificuldades e o futebol?

Havia vários candidatos para seguir para a Guiné-Bissau, mas para ser eu o eleito tive de ter a decisão favorável das seguintes entidades: Federação Portuguesa de Futebol, o Presidente, Dr. João Rodrigues, Direcção-Geral dos Desportos de Portugal, Prof. Dr. Mirandela da Costa, Associação Nacional dos Treinadores de Futebol, o presidente, Prof. Dr. João Mota, e do Cônsul da Guiné-Bissau, nessa altura o Major Valentim Loureiro.

O projecto chamava-se ‘Projecto Juvenil da Guiné-Bissau, a colaboração e o apoio directo era dado pela DGD de Portugal e a coordenação do mesmo era feita pelo Prof. Carlos Queiroz na FPF.

O Projecto tinha vários objectivos, e o principal passava por organizar e dinamizar o futebol juvenil da Guiné-Bissau, durante esse período, que foram 4 anos e meio, também fui treinador de todas as selecções de formação da Guiné participando em Campeonatos do Mundo de sub-17 e sub-20, nos I Jogos Desportivos da Língua Portuguesa ganhando na final a Portugal em sub-16, e acabei por ser seleccionador nacional desse país ganhando vários torneios internacionais.

Por exemplo, venci a Taça Amílcar Cabral e apurei pela 1ª vez a Guiné-Bissau para uma  fase de grupos de uma CAN, Tunísia 94. Também participámos nos I Jogos da Francofonia em Paris com os sub-23, conquistando um honroso 5º lugar, saí de Portugal para iniciar este projecto em 1 de Novembro de 1990 e regressei em Dezembro de 1994. O país nessa época era tranquilo e vivia-se com extrema segurança, havia muito talento na Guiné-Bissau mas faltava melhorar as infraestruturas para a prática do futebol.

RR: Como descreveria essa etapa da sua carreira?

Pessoalmente é um país que muito respeito, mas na realidade era muito complicado pela falta de verbas, de condições, de infraestruturas, com um nível de pobreza muito elevado e desorganização quando lá cheguei e por todo o trabalho realizado durante quatro anos e meio classifico este meu trabalho neste país do continente africano como o meu melhor trabalho até hoje.

Testemunham esta minha classificação os Profs. Carlos Queiroz, Nelo Vingada, Rui Caçador e Arnaldo Cunha, depois de sair da Guiné após a brilhante participação nos Jogos da Francofonia em Paris em Sub-21, regressei a Portugal definitivamente devido a uma segunda malária que pôs em risco a minha vida. 

Quem me salvou da morte foi o Dr. Bernardo Vasconcelos, ficando para trás um trabalho árduo mas de muita paixão e dedicação e uma vitória nos I Jogos Desportivos de Língua Portuguesa ao vencer na final no Estádio Nacional Portugal por 1-0,” 


UC: O que ocasionou a sua saída de Guiné Bissau?

Após os Jogos da Francofonia em 1994, deixe-me dizer-lhe que fui para essa prova em Paris com uma recaída da febre da Malária, por indicação dos médicos guineenses, portugueses e italianos que trabalhavam na Guiné-Bissau foi-me aconselhado o regresso imediato a Portugal, portanto houve essa questão da saúde, e por outro lado o Governo de Portugal decidiu que estava concluído o meu trabalho na Guiné e que seriam os guineenses a dar continuidade ao projecto.

Graças a Deus, derivado ao trabalho desenvolvido por mim durante todo esse tempo recebi elogios do Governo português, nomeadamente do Ministro da Educação, Dr. Couto dos Santos, e ainda um Louvor e Mérito do Presidente da República da Guiné-Bissau.


RR: Que etapa se seguiu a essa experiência em África?

Há um pequeno interregno de alguns meses no qual dei aulas de Educação Física e após isso surge o convite para treinar o Praiense na II Divisão, o objectivo salvá-los da descida iminente, com a curiosidade de ter chegado à Praia da Vitória numa cadeira de rodas pois tinha sido operado com anestesia geral a uma rutura no tendão de Aquiles quando dava aulas e bem... consegui salvar o Praiense. 

Logo de seguida orientei o Sporting da Horta da III Divisão, também com o mesmo objectivo e mais uma vez foi cumprido, o aparecimento de Guilherme Farinha no continente sul-americano no Club Cerro Corá da I Divisão do Paraguai foi graças a um protocolo existente entre o Sporting Clube de Portugal e o Cerro Corá, pelas mãos do Eng. Vítor Batista, amigo de infância que conhecia e era amigo do vice-presidente do Sporting, Dr.Simões de Almeida.

Pôs-me em contacto com ele para uma reunião e numa semana viajei para Asssunción, o Cerro Corá encontrava-se na última posição do campeonato paraguaio, tive o privilégio de ter um mês de trabalho entre o Torneio Apertura e o Torneio Clausura e arrancámos para o Clausura. Para não descermos de divisão só podíamos perder um jogo e perdemos logo na primeira jornada com o Guarani.

Após essa derrota ganhámos 14 jogos seguidos e fui à final no Estádio Nacional Defensores del Chaco com o Olímpia e perdi por 3-0...e fomos vice-campeões. Deixo aos leitores a classificação do meu trabalho no Cerro Corá, um clube de bairro- Bairro de Campo Grande – com 200 sócios. 


UC: Como chegou até a América do Sul para treinar o Cerro Corá do Paraguai e fale de seu grande trabalho nesse clube?

Tinha acabado de salvar o Sp.Horta dos Açores de uma descida de divisão iminente, falo de 1996 e regressei a Lisboa. Era Director do Departamento de Futebol do Sporting o Sr. Luís Norton de Matos e o vice-presidente o Dr. Simões de Almeida, na época de 1997 o Sporting assinou um protocolo de colaboração e cooperação com o Cerro Corá, nessa altura militava na I Divisão do Paraguai e corria risco de descida.

O Cerro Corá pediu ao Sporting um treinador seu, as duas pessoas que referi convidaram-me para seguir para o Paraguai como treinador principal do Cerro Corá, ganhei o Torneio Clausura e consegui ser vice-campeão nacional e ganhei o prémio de Treinador Revelação outorgado pelo jornal ABC Color.  


RR: Depois do Paraguai optou pela primeira experiência na Costa Rica. Correu de acordo com o que esperava? 

As condições que encontrei na Liga Deportiva Alajuelense e no Sport Club Herediano foram muito diferentes das do Paraguai porque tanto um clube como outro são ou estão por História do país nos três melhores clubes da Costa Rica.

Posso afirmar inclusive que a LD Alajuelense em todos os aspectos é um clube de top em qualquer parte do Mundo, de tal forma que logrei o bicampeonato nacional, ganhando os dois campeonatos de Apertura e Clausura.


UC: Como foi parar no Alajuelense? Fale da sua passagem por lá.

Estava no meu terceiro ano de Cerro Corá e mataram o vice-presidente do Paraguai, Don Luis Argaña, e culparam o General Lino Oviedo que era presidente honorário do Cerro Corá, tornou-se quase impossível para o clube ter condições de segurança nos seus jogos fora. Para defender a minha integridade física o presidente do Cerro convidou-me a regressar ao Sporting mas não quis pois o trabalho estava a correr muito bem.

Entretanto o presidente da LD Alajuelense da Costa Rica, Rafael Solis Zeledon mostrou interesse junto do presidente do Cerro em adquirir um jogador do clube, Carlos Alberto Gonzalez, e também necessitava de um treinador, e o presidente do Cerro comunicou-lhe que o treinador do clube, Guilherme Farinha, seguia com o jogador para assinar contrato aproveitando a ocasião para tecer elogios vários elogios à minha pessoa enquanto pessoa e homem.

Com franqueza aceitei o convite do presidente do Cerro para seguir viagem para a Costa Rica e o Alajuelense, embora contrariado. Passados onze dias assinei contrato, no dia 13 de Maio de 1999, com o clube. Como deve compreender não vou contar toda a história pois seria muito longa mas conto o principal e talvez o mais impprtante – o Saprissa tinha ganho os quatro últimos Campeonatos quando pisei solo costa-riquenho, falei para a Imprensa que estava ali para ser campeão nacional!


A equipa já estava formada de jogadores e a equipa técnica era constituída por mim como treinador e preparador físico e mais dois elementos. Como aparte, hoje a mesma equipa é constituída por sete elementos. Ganhei o Torneio Abertura e o Clausura 99/00 e fui vice-campeão CONCACAF Las Vegas e campeão da UNCAF, no mesmo ano ganhei o prémio de melhor treinador estrangeiro da Costa Rica. 

Na época seguinte voltei a ganhar os Torneios Abertura e Clausura, fui bicampeão nacional, campeão da UNCAF, segundo na Copa Merconorte, o clube chegou ao 23º lugar no ranking mundial de clubes, ganhei o prémio de treinador do ano. 


RR: Considera ter conquistado o respeito dos adeptos da Costa Rica?

Sem dúvida, ganhei dos Torneios da UNCAF, sendo vice-campeão da CONCACAF em Las Vegas, conseguindo o segundo lugar na MercoNorte, levando a Liga a um elevado posto do ranking mundial da FIFA e tendo o orgulho da UNAFUT me ter outorgado por duas vezes com o prémio de melhor treinador do ano e a ANTF em Portugal me ter entregue o Prémio Fernando Vaz e o Jornal O JOGO me ter considerado o melhor técnico português no estrangeiro. Este último prémio foi atribuído por uma votação de todos os jogadores portugueses que actuavam no estrangeiro.

UC: Por que não deu continuidade nos trabalhos com o Sportivo Luqueño e o Herediano?

No Sp. Luqueño o presidente Ramon Gonzalez Daher pediu-me para fazer o mesmo trabalho que tinha sido feito no Cerro Corá, ou seja, apostar numa equipa jovem com jogadores formados no clube e assim o fiz. Terminámos no 7º lugar no Torneio de Abertura, a equipa estava a aprender e a assimilar todas as informações, métodos e processos de treino. 

Entretanto havia uma rádio, a Rádio Auri-Azul da cidade de Luque que me exigia que fizesse alinhar alguns jogadores do clube e tentou comprar-me, e como não me vendi começaram a denegrir a minha imagem e a dos jogadores e não tive o apoio nem do presidente nem da direcção do clube que devia ter tido, e como tal decidi retirar-me.

De imediato regressei à Costa Rica em passeio e o presidente do Herediano, Mohamed Aquile Ali, convidou-me a assinar contrato. Era mais patriota e preocupava-se mais com a selecção nacional do que com o próprio clube. Pouco antes de me despedir tinha sido entrevistado na TV e tinha afirmado que eu seguiria até ao final do Campeonato, mas no Herediano havia dois jogadores que tinham uma força que não deveriam ter e influenciaram a decisão do presidente.


Nesse Torneio Abertura o Herediano esteve muito tempo em primeiro e começou a ser prejudicado pela arbitragem, terminando o jogo com nove ou dez jogadores. Ficámos em terceiro e o presidente despediu-me, ainda hoje estou convicto de que se tivesse continuado no clube teria sido campeão nacional.

RR: Voltou depois a Portugal para treinar o Casa Pia… Como evoluiu a sua carreira nos anos seguintes?

Sim, treinei o Casa Pia por duas vezes, foi um clube no qual tive a honra e o prazer de trabalhar por onde passaram ilustres homens do futebol português com um historial invejável, não esquecendo que do Casa Pia nasceu o Sporting, o Belenenses e o Vitória de Setúbal.

Classifico as minhas passagens pelo Casa Pia de dois trabalhos apesar de na segunda vez ter deixado o clube a meio da época para regressar ao Paraguai para treinar o SP Luqueño e encontrávamo-nos em 2º lugar a um ponto do Barreirense treinado pelo Daúto Faquirá na II Divisão B, quiçá o maior erro da minha carreira de treinador tenha sido não ter ficado com o Casa Pia até final da época.

Precisamente o Académico de Viseu aparece após a primeira época do Casa Pia, quando depois de o tirar do último lugar e termos ganho a 2ª volta do campeonato e terminarmos em quinto lugar num lote de vinte clubes porque saio? Porque o Académico de Viseu pela primeira vez ia ser SAD e principalmente porque a minha falecida mãe, a poetisa Marília Farinha, era de Viseu.

Aqui jogaram as questões sentimentais. Naturalmente porque fui duas vezes vice-campeão no Paraguai, onde também ganhei o prémio Revelação, onde mexi com a metodologia de treino aplicada e onde fizemos uma boa campana na  COMMEBOL, ainda hoje sou recordado e deixei de facto a ‘marca de Farinha’ e prestigiei a qualidade dos técnicos portugueses. 

O Belenenses aparece após o meu regresso do Paraguai, onde quase no final da época tive outra rutura no tendão de Aquiles, no outro pé, e apesar de ter sido operado no Paraguai quis fazer a minha reabilitação em Portugal, coisa que acabou por não acontecer porque tive o convite do meu amigo Augusto Inácio para o acompanhar no Belenenses como preparador físico.

Aqui mais uma vez prevaleceu o sentimento, neste caso o da amizade, e depois, com todo o respeito que tenho pelo Loures, onde fiz um trabalho de apenas um mês, para ser franco nessa altura não consegui ter a motivação desejada e exigida, por isso pedi a minha demissão.


RR: Após essas experiências, chegou à Ásia. Como descreve essa escolha?

O meu trabalho no Foolad foi novamente por um convite feito pelo meu amigo de infância Inácio. Foram cinco épocas de árduo trabalho nas quais numa época cheguei a ser o treinador principal e nas últimas três épocas com as funções de assessor técnico-táctico e preparador físico.

Nesse continente asiático e nomeadamente nesse clube, o Foolad, posso também dizer que no próprio país, o Irão, alterei a metodologia de treino, num país em que as condições e as infraestruturas são boas, onde as pessoas têm um alto grau de emotividade com uma mentalidade muito diferente da nossa mas infelizmente em muitos dos casos com uma mentalidade amadora.

Em 2007, já eu tendo um conhecimento razoável do que era treinar no Irão, tendo também já feito uma avaliação da qualidade dos técnicos a trabalhar naquele país e da qualidade dos jogadores dizia que um treinador com outra mentalidade e outra filosofia de analisar o futebol não teria difícil ser campeão no Irão.

Por isso perspectivei uma boa campanha de Toni no Tractor e o apuramento de Carlos Queiroz para o Campeonato do Mundo Brasil 2014, não esquecendo a possível recuperação que o Persepolis de Manuel José ainda pudesse fazer. Não sei quando mas um dia gostava de regressar ao Irão como treinador principal com o objectivo de me tornar campeão no antigo Império Persa.


UC: Fale de seu grande trabalho que exerceu no Irão ora como preparador físico ora como técnico e porque ficou muito tempo por lá?

Cheguei ao Irão em 2007 e estive cinco épocas com uma de intervalo em que treinei o Municipal da Guatemala, como preparador físico revolucionei a metodologia de treino do futebol do Irão, fui também convidado para treinador principal do Foolad mas por questões políticas tive de voltar a ser preparador físico e assessor técnico-táctico. 

Tive uma excelente relação com as pessoas do país e consideraram-me um excelente profissional de futebol. Quem sabe um dia não voltarei ao futebol Irão pois por exemplo ainda hoje tenho convites para regressar.


RR: Ainda regressou novamente ao Foolad. Foi convidado a voltar ao clube?

O meu regresso ao Foolad foi precisamente depois de regressar da Guatemala em que tive o cuidado de visitar o clube e apresentar os meus cumprimentos aos meus colegas e jogadores e aquando dessa visita tive o gosto de ser novamente convidado para assumir as funções de assessor técnico-táctico e preparador físico para a época 2011/12.

Sentia-me bem no Irão, estava a realizar um bom trabalho, todas as pessoas do clube e da cidade de Ahwaz tinham grande admiração e respeito por mim e via-me numa continuidade de desenvolvimento do meu trabalho no Foolad. O Municipal da Guatemala convida-me e eu aceito e saio do Foolad porquê? Aqui não há questões sentimentais mas sim de estratégia.

RR: Passou então a trabalhar na Guatemala. Como se explica uma mudança tão radical?

Após quatro épocas acima de tudo como preparador físico agarrei o desafio do Municipal para mostrar ao Irão que também era acima de tudo e em primeiro lugar treinador de futebol. Fui para o Municipal a 15 dias de começar o campeonato e ganhei o Torneio Regular, fui vice-campeão ao perder na final com o Comunicaciones por penalties (8º penalty) e fazendo uma boa campanha na Champions League da CONCACAF.

Pena que três jogadores da minha equipa, o que me deixou muito triste quando tive conhecimento, se tinham vendido em dois jogos, um da CONCACAF e outro precisamente o jogo da final. Aliás, a decisão de irradiação destes três jogadores foi recentemente ratificada pela FIFA.


UC: Porque na sua carreira sempre trabalhou como preparador físico e técnico? Como é o seu método de trabalho nessas duas profissões?

Em alguns casos trabalhei como preparador físico e na maioria dos casos como preparador e também como treinador principal. Hoje em dia no futebol a metodologia mudou, há anos atrás dava-se importância à componente preparação física e técnico-táctica mas de forma separada, hoje o futebol moderno é total e mais global, as componentes física, técnica e táctica trabalham-se em conjunto, estamos na ‘periodização táctica’.

UC: Porque não deu certo no futebol da Guatemala?

Treinar na Guatemala não é fácil, principalmente quando se joga fora da capital. Ainda assim tenho de admitir que há boa gente no país no qual deixei muitos amigos. Quando cheguei ao Municipal faltavam 15 dias para começar o Campeonato Nacional e nessa época 2010/2011 já era realizado com dois torneios curtos.

Vencemos o de Abertura no Torneio Regular com cinco pontos de avanço sobre o segundo classificado e no Torneio de Copa tivemos de jogar contra o Alto Rendimento (equipa B) porque nas mesmas datas tínhamos de fazer jogos relativos ao Torneio da CONCACAF no qual apenas nos apurámos para os quartos-de-final na última jornada. Nas meias-finais do Torneio Abertura ganhámos com facilidade ao Suchitipequez e fomos para a final com o Comunicaciones.

Empatámos o primeiro jogo a zero, empatámos o segundo a dois e perdemos nos penalties ao oitavo penalty. Fui vice-campeão nacional e regressei depois a Portugal para passar o Natal e voltei mais cedo do que o que estava combinado para continuar o meu trabalho, na 5ª jornada do Torneio Clausura fomos jogar ao terreno do Comunicaciones, no Estádio La Pedrera ganhámos por 1-0 e fui despedido.

RR: Poucos saberão deste facto, mas apenas lhe falta treinar um clube na Oceânia para fazer História. O que lhe falta para cumprir esse propósito?

Quando saí do Foolad, durante esse tempo já surgiram várias situações para diversos sítios do Mundo mas até hoje nada de concreto, já disse publicamente que gostaria de ter uma possibilidade de treinar na Oceânia pois seria o único técnico do Mundo a trabalhar nos cinco continentes.Talvez me falte o empresário para poder pôr em prática este sonho que me é legítimo.

UC: Porque é que em Portugal não treinou equipes mais fortes?

Em Portugal não treinei até hoje equipas mais fortes porque não tenho empresário, não entro em lobbies e não me vendo. Mantenho um procedimento de honestidade e seriedade.

UC: O que falta na América em si possuir mais treinadores Europeus?

Penso que não há mais treinadores europeus por duas razões – já existem treinadores americanos de qualidade e porque os dirigentes dos clubes do continente americano não apostam em treinadores europeus.

UC: Você já recebeu alguma proposta para trabalhar no Brasil? Caso tenha recebido, por que não aceitou?

Na época 2012/2013 tive vários contactos para ir treinar para o Brasil, inclusive alguns empresários disseram-me que o processo já estava adiantado e pensei que ia mesmo assinar contrato com um clube brasileiro.

Nunca disse que não a qualquer convite que tivesse recebido mas os empresários e os directores dos clubes nunca deram continuidade às conversações, e nunca foi por questões monetárias, não sei por que razão deixaram de falar. Era um dos países nos quais gostava de trabalhar, talvez um dia…

UC: Você está há anos no futebol, possui alguma história engraçada ou inusitada para nos contar?

Como deve compreender, comecei a praticar futebol aos 8 anos e sou treinador de futebol há mais de 30, já trabalhei em quatro continentes e é lógico que tenha inúmeras histórias para contar. Prefiro dizer-lhe que sou um treinador do Mundo e ‘my life is a football game’!

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