Pedro Álvares Cabral saiu de Portugal para chegar às terras brasileiras no ano de 1500. Segundo documentos da época, a frota lusitana, composta por 13 caravelas, teria descoberto a então chamada “Ilha de Veracruz”, em um dos vários projetos de expansão das grandes navegações coloniais. Contudo, muita coisa mudou na relação entre os dois países de lá para cá.

Em 2014, mais de cinco séculos depois, os portugueses voltarão ao país-continente almejando uma conquista ambiciosa novamente. A ilha tornou-se uma nação, chamada Brasil; estudos mostraram que não houve exatamente uma descoberta, mas um choque cultural entre indígenas e portugueses e o comandante lusitano que está para chegar não terá sua passagem pelo continente seguida por um genocídio da população local. Na Copa do Mundo, coube a Cristiano Ronaldo a responsabilidade de capitanear a frota até aqui. Mas ele está longe de estar sozinho nesta empreitada.

Eurocopa, a ascensão de Ronaldo

Voltemos a 2012. Portugal classificou-se para a Eurocopa e acabou ficando em um grupo bem complicado (assim como o que enfrentará na Copa). Pela frente, Alemanha, Dinamarca e Holanda, no que foi rapidamente apelidado de “grupo da morte”. Os lusos perderam na estreia para os germânicos (adversários na primeira rodada do Mundial) por 1 a 0, com gol de Mario Gomez e bolas na trave de Pepe e Nani. A segunda partida, contra a Dinamarca, poderia significar a eliminação da equipe. No entanto, Portugal venceu os alvirrubros por 3 a 2 com um gol de Varela no apagar das luzes, reacendendo as esperanças do time.

A rodada final chegou com várias possibilidades de classificação. A Alemanha, já classificada com 6 pontos, enfrentaria a Dinamarca, que estava empatada com Portugal, ambos com 3 pontos. A Holanda era o lanterna do grupo, mas uma vitória sobre os ibéricos poderia coloca-la na próxima fase (desde que os dinamarqueses não empatassem com a Alemanha).

Portugal foi a campo precisando vencer para não depender de ninguém, e assim o fez. Cristiano Ronaldo desencantou na competição e foi muito decisivo (seu grande momento individual pela seleção até então). Van der Vaart abriu o placar para o time dos Países Baixos no começo da partida com belo chute de fora da área, mas Ronaldo fez os dois gols da virada que sacramentou a vitória por 2 a 1.

Classificado para as quartas de final da Euro, Cristiano Ronaldo manteve o embalo e voltou a ser decisivo na partida seguinte. Foi dele o único gol do triunfo sobre a boa seleção da República Tcheca. Após cruzamento preciso da direita, Ronaldo mergulhou de peixinho e marcou seu terceiro tento na competição.

Nas semis, Portugal teria pela frente a Espanha, atual campeã do mundo e algoz da eliminação da Copa do Mundo de 2010. As duas equipes fizeram um jogo muito parelho e truncado, com poucas oportunidades para cada um dos lados. Os espanhóis não conseguiam ir além da simples posse de bola e criar jogadas, enquanto Portugal não era muito efetivo quando tinha a chance. A partida acabou empatada em 0 a 0 e foi para a prorrogação. No tempo extra, a Espanha foi melhor, mas parou no goleiro Patrício, encaminhando a decisão para a disputa de pênaltis. Cobrando as penalidades máximas, os portugueses não foram bem e acabaram eliminados ao perder por 4 a 2 no duelo. A cena mais famosa da partida é Cristiano Ronaldo balançando a cabeça negativamente e dizendo "injustiça, injustiça" após a eliminação. “La Roja” acabou sendo a campeã daquela edição da Euro depois de bater a Itália por 4 a 0 na final.

Eliminatórias: o sufoco e a glória

Confiante após outra boa campanha em uma competição de grande relevância, Portugal foi sorteado para enfrentar adversários relativamente fáceis nas Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2014. Rússia, Israel, Irlanda do Norte, Azerbaijão e Luxemburgo se juntaram aos lusitanos no grupo F da fase classificatória para o Mundial. Mesmo assim, os comandados de Paulo Bento não foram bem.

Os portugueses deixaram escapar pontos preciosos em jogos que tinham de vencer e não conseguiram a classificação direta. Com empates contra Israel (3 a 3 em Tel-Aviv e 1 a 1 em Lisboa) e Irlanda do Norte (1 a 1 em Porto), Portugal acabou a fase de grupos em segundo, atrás da Rússia.

O resultado deu aos lusos o direito de disputar a vaga na Copa pela repescagem. O confronto em jogos de ida e volta foi definido via sorteio, e os lusitanos teriam pela frente a seleção da Suécia, de Zlatan Ibrahimovic.

O embate entre dois dos melhores atacantes do mundo (Ronaldo e Ibra) chamou a atenção dos fãs de futebol ao redor do planeta, que desde já lamentavam a ausência certa de pelo menos um deles no Mundial. Com a segunda partida sendo realizada cerda de uma semana antes do fim das votações para a Bola de Ouro da Fifa de 2013, Cristiano deixou bem claro quem era o melhor jogador de futebol no ano.

A primeira partida foi disputada em Lisboa e foi equilibrada do começo ao fim. As duas equipes faziam um bom jogo, mas não conseguiam transformar as chances em gol. Aos 37 minutos da segunda etapa, no entanto, veio a marca do craque. Um cabeceio fulminante do atacante do Real Madrid derrotou o goleiro Isaksson e decretou a vitória por 1 a 0 para Portugal, que levou boa vantagem para a partida em Solna.

No jogo de volta, na Suécia, veio a melhor partida da carreira de Ronaldo pela seleção portuguesa. Após um primeiro tempo muito nervoso de ambos os times, o camisa 7 abriu a contagem aos cinco do segundo e botou Portugal em ótimas condições de assegurar a classificação. Ibrahimovic, porém, não parecia disposto a deixar que os portugueses tivessem uma noite fácil dentro de seu país. O sueco empatou tudo com uma linda cabeçada após 23 minutos jogados na segunda etapa da partida. A torcida local se ensandeceu e empurrou a seleção amarelo e azul para a virada, que chegou apenas quatro minutos mais tarde, com cobrança de falta de Ibra. A situação estava crítica para Portugal, que não mostrava reação e aceitava a pressão da Suécia. Mas Cristiano Ronaldo não estava para brincadeiras naquela noite. O craque foi muito certeiro e tratou de matar o jogo em dois excelentes contra-ataques, virando a partida e dando a classificação à Portugal aos gritos de “Eu estou aqui!”.

Os principais coadjuvantes

Os lusos, depois de muito sofrimento e altos e baixos, garantiram uma vaga na Copa do Mundo de 2014, muito por conta de Ronaldo. Mas não só por ele. O sistema defensivo, por exemplo, conta com dois companheiros de CR7 no Real Madrid campeão europeu de 2013/2014. Pepe deixou o estigma de jogador que só usava a violência para trás e demonstrou muita técnica na ótima temporada que teve pelo clube da capital espanhola. É, sem dúvida, o principal jogador do miolo de zaga dos portugueses e será muito importante na marcação dos grandes goleadores do planeta, como Benzema, Balotelli e Klose.

Ao seu lado, o lateral-esquerdo Fábio Coentrão é uma das principais alternativas ofensivas do técnico Paulo Bento na formação da seleção. Muito habilidoso e com boa visão de jogo, o ala iniciou a decisão contra o Atlético de Madrid como titular da equipe merengue (deixando Marcelo no banco) e teve um final de temporada excelente, o que o credencia a ser um dos melhores laterais do Mundial.

Completando a defesa, tem o goleiro Rui Patrício, em ótima fase no Sporting. O arqueiro foi um dos principais nomes da posição na temporada e pode ser um fator determinante na campanha portuguesa. Com uma defesa relativamente frágil se comparada a de seleções como Itália, Alemanha e Brasil, Portugal precisará que o goleiro mantenha seu momento na Copa do Mundo e esteja atento sempre que acionado. Um Mundial em alto nível de Rui Patrício pode potencializar as pretensões dos lusitanos na competição.

Com Cristiano Ronaldo como principal opção ofensiva do time, o meio de Portugal tem dois pilares em sua formação. Raul Meireles dá combate, organiza a equipe, joga com muita raça e dedicação tática, além de somar com sua categoria habitual. O volante do Fenerbahçe reúne quase todas as características que um técnico gosta de ver para um jogador de meio-campo e tem vaga assegurada na meiuca lusitana.

Raul Meireles: muita raça e organização no meio-campo português (Foto: Getty Images)

Um pouco mais adiantado, João Moutinho é o grande responsável pela armação de jogadas no ataque. Quase companheiro de Meireles no Porto, Moutinho atua hoje em dia pelo Mônaco, da França, onde também é o principal construtor de oportunidades de gol. Na temporada, serviu Falcão García e cia oito vezes, apesar de marcar apenas um gol. Mesmo vindo de fase um pouco pior, Moutinho é fundamental para que Portugal não dependa apenas da individualidade de Ronaldo no ataque.

Tudo isso se acentua porque Ronaldo vem de uma temporada desgastante pelo Real Madrid e não jogou os últimos amistosos internacionais por Portugal devido a lesões no joelho e na coxa esquerdas. O astro disputou competições como La Liga, Uefa Champions League e Copa del Rey (torneio do qual esteve de fora da final) até a última rodada, e chega à Copa com vários títulos na bagagem, mas com algumas dores para suportar.

Cristiano Ronaldo é, sim, o craque e líder da seleção portuguesa. Mas o capitão quer mostrar que não fez a tortuosa viagem ao Brasil sozinho, e é isso que Portugal terá de comprovar se almeja fazer história no continente sul-americano novamente. Como diz o belíssimo hino do país, "às armas", jogadores portugueses, sua seleção precisará de todos vocês, principalmente se CR7 não estiver no auge da sua condição física.

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