Dar adeus nunca é fácil. Para um torcedor apaixonado, ver um ídolo deixando o clube é extremamente complicado. Quando se trata de uma lenda do futebol pendurando as chuteiras, todos que gostam de ver a bola rolando acabam se emocionando. E 2017 foi um prato cheio para que as lágrimas também rolassem. Na Alemanha, na Itália ou nos Estados Unidos, cinco grandes jogadores se aposentaram neste ano e foram saudados ao redor do mundo. Relembre agora a trajetória e a despedida de Philipp Lahm, Xabi Alonso, Francesco Totti, Andrea Pirlo e Kaká.

Todos os cinco citados encerraram suas carreiras ainda jogando por equipes relevantes e desempenhando papel importante. Algumas delas foram até relativamente surpreendentes, como a de Philipp Lahm, que tinha apenas 33 anos. Outras, como a do italiano Totti, eram esperadas, mas ainda assim mobilizaram milhares - talvez milhões - de pessoas para uma última homenagem.

Lahm: zero cartões vermelhos na carreira e capitania honorária da Seleção Alemã

Até hoje, é muito raro ver jogadores de alto nível que terminem sua vida dentro do futebol profissional sem receber nenhum cartão vermelho. O feito se torna ainda mais digno de exaltação quando o jogador em questão é um defensor. Philipp Lahm, portanto, merece aplausos por ter feito mais de 600 partidas, somando jogos por Bayern de Munique, Stuttgart e sua Seleção, sem nunca ser expulso.

Profissional desde 2003, Lahm foi um "coringa". Lateral-direito de origem, também se destacou no Stuttgart, emprestado pelo Bayern, do outro lado do campo e, já no fim de sua carreira, chegou a desempenhar o papel de volante, também sendo utilizado em alguns momentos como defensor central. Em todas elas, foi bem. É o segundo maior campeão da história dos bávaros, atrás apenas de Oliver Kahn, com 21 troféus levantados, vários como capitão, incluindo oito títulos de Bundesliga, uma Uefa Champions League e um Mundial de Clubes.

Como capitão, Lahm comandou a festa da Alemanha tetracampeã do mundo no Brasil (Foto: Adrian Dennis/AFP/Getty Images)
Como capitão, Lahm comandou a festa da Alemanha tetracampeã do mundo no Brasil (Foto: Adrian Dennis/AFP/Getty Images)

Pela Alemanha, foram 113 partidas, o que lhe coloca como quinto jogador que mais vestiu a camisa da Die Mannschaft. Disputou três Copas pela seleção, sendo terceiro colocado em casa, no ano de 2006, e levantando o troféu de campeão do mundo em 2014, no Brasil, com a faixa de capitão. Se retirou do selecionado nacional justamente após o título. Em dezembro, foi nomeado capitão honorário da Seleção Alemã, ao lado de Fritz Walter, Uwe Seeler, Franz Beckenbauer, Lothar Matthäus e Jurgen Klinsmann.

Sua despedida não poderia ter sido melhor. Na última rodada da Bundesliga 2016/17, o Bayern goleou o Freiburg por 4 a 1, e Lahm foi substituído, aos 40 minutos da segunda etapa, para ser aplaudido e reverenciado de pé por companheiros, torcedores e adversários dentro da Allianz Arena. Incluindo outro companheiro que também se aposentava. O espanhol Xabi Alonso.

Sem choro: despedida de Lahm foi regada à cerveja, coisa tradicional nos títulos do Bayern (Foto: Mathias Hangst/Bongarts/Getty Images)
Sem choro: despedida de Lahm foi regada à cerveja, coisa tradicional nos títulos do Bayern (Foto: Mathias Hangst/Bongarts/Getty Images)

Xabi Alonso: acumulador de títulos e elegante como um maestro em campo

O meio-campista Xabi Alonso se aposentou apenas cinco minutos antes de Lahm. O espanhol deixou o gramado aos 35 da segunda etapa da partida contra o Freiburg. Curiosamente, foi aos 35 anos de idade, dos quais 18 foram dedicados ao futebol profissional, onde começou na Real Sociedad, ainda no milênio passado, em 1999.

Por lá, ficou até 2004, quando o clube recebeu uma proposta do Liverpool e vendeu Xabi, por 16 milhões de euros. Sob o comando de Rafa Benítez, Alonso esteve presente em um dos momentos mais emocionantes da história do esporte, quando a equipe inglesa bateu o Milan na final da Uefa Champions League da temporada 2004/05, depois de estar perdendo por 3 a 0, buscar o empate, e levar a partida para as penalidades máximas. O volante marcou o terceiro gol daquele jogo, no rebote de sua própria cobrança de pênalti, defendida por Dida.

Da carinha de menino campeão da Champions.... (Foto: Mustafa Ozer/AFP/Getty Images)
Da carinha de menino campeão da Champions.... (Foto: Mustafa Ozer/AFP/Getty Images)

Em 2009, deixou a Inglaterra e se tornou reforço do Real Madrid, onde ficou até 2014. Com os merengues, Xabi conquistou mais uma Champions League, mesmo ficando de fora da final, por estar suspenso, além de duas Copas do Rei e um Campeonato Espanhol. Com a camisa branca do Real, foi sempre considerado um dos jogadores mais consistentes da equipe, desde sua primeira temporada. Acabou sendo descartado para a temporada 2014/15 e desfilou sua classe no Bayern de Munique por mais três anos, até se aposentar, vencendo três Bundesligas no caminho.

...ao 'Barba Roja' - apelido recebido à época de Real Madrid - que se aposentou ao lado de Lahm (Foto: Christof Stache/AFP/Getty Images)
...ao 'Barba Roja' - apelido recebido à época de Real Madrid - que se aposentou ao lado de Lahm (Foto: Christof Stache/AFP/Getty Images)

Pela Seleção Espanhola, mais três taças: duas Eurocopas - 2008 e 2012 - e a Copa do Mundo de 2010, sendo titular em todas as conquistas. Jogador espanhol do ano em 2003; Eleito para o time do ano da Fifa em 2011 e 2012; melhor meio campista de La Liga na temporada 2011/12; Eleito para o time da Champions League 2013/14; Eleito para o time da Bundesliga 2014/15. Essas foram algumas das conquistas individuais de Xabi Alonso durante sua vitoriosa carreira. A despedida foi similar à de Lahm e você acompanha no vídeo abaixo.

Francesco Totti: o camisa 10 que se eternizou por um único clube

Falar de Roma e não lembrar de Francesco Totti é simplesmente impossível. Nascido em 27 de setembro de 1976, o ex-jogador está eternizado nos corações romanistas como a maior bandeira da história giallorossa. Criado como torcedor da equipe, poderia ter desbravado outros países e acumulado títulos, mas preferiu ficar em seu time de coração, mesmo que levantando poucas taças, para construir uma das histórias mais bonitas que o futebol já viu.

A única camisa que vestiu além do amarelo e vermelho da Roma foi a da seleção italiana. E por lá não foi menos bem-sucedido. Depois de ter passagem por todas as seleções de base, Totti foi fundamental no título da Copa do Mundo de 2006. Depois de sofrer grave lesão no tornozelo, em fevereiro daquele ano, conseguiu se recuperar e, nas sete partidas do Mundial, marcou um gol e deu quatro assistências.

Totti se recuperou de lesão e cirurgia para ser campeão do mundo em 2006 (Foto: Patrick Hertzog/AFP/Getty Images)
Totti se recuperou de lesão e cirurgia para ser campeão do mundo em 2006 (Foto: Patrick Hertzog/AFP/Getty Images)

Il Capitano se aposentou em 28 de maio deste ano, no mesmo dia em que Lahm e Xabi penduravam as chuteiras na Alemanha. Num Olimpico lotado para partida contra o Genoa, Francesco ficou no banco de reservas. Entrou aos 8 minutos da segunda etapa, no lugar de Mohamed Salah, levantando a torcida, 24 anos depois de seu primeiro jogo pelo clube, num 28 de março de 1993, quando era apenas um menino de 16 anos.

A partida estava empatada em 1 a 1 e Totti viu, quase que numa cena de filme, De Rossi, que envergaria a braçadeira de capitão na temporada seguinte, pôr a Roma na frente. O Genoa até voltou a empatar, mas Perotti, aos 45 do segundo tempo, garantiu a comemoração e a festa na despedida do ídolo.

O adeus foi emocionante. O estádio parou para que o Capitano pudesse se despedir de sua torcida e de seus companheiros. Foram 785 partidas pela Roma e o amor traduzido no choro de um estádio Olimpico lotado. Ao lado de sua família, Totti também chorou. Discursou. Abraçou a esposa, Ilary Blasi, seu filho Cristian - que joga na base romanista -, a filha Chanel e a pequena Isabel, que tinha pouco mais de um ano. E deu adeus aos gramados. Ainda acompanha o time, sendo membro da diretoria, mesmo sem cargo definido.

Pela Roma, venceu um Scudetto, duas Supercopas da Itália e duas Copas Itália. Na temporada 2006/07, foi o maior goleador do futebol europeu, quando também foi artilheiro da Serie A. Foi eleito duas vezes o melhor jogador do campeonato italiano e cinco vezes o melhor italiano da liga. Além de levantar a taça do Mundial pela Seleção.

Andrea Pirlo: desprezado, acolhido por um rival e subida ao status de gênio

A palavra que melhor pode resumir a carreira de Andrea Pirlo é classe. Aos 38 anos, o italiano, que estava no New York City FC, anunciou sua aposentadoria dos gramados. Nunca foi um jogador de extremo vigor físico, mas nem precisava. O meio-campista parecia levar a sério a máxima de que "é a bola que tem de correr" quando estava em campo. E isso ele fazia com maestria.

Revelado pelo Brescia, Pirlo surgiu para o futebol como uma espécie de segundo atacante. Teve bons momentos na equipe e Mircea Lucescu, que havia promovido sua estreia no profissional, o levou para a Internazionale. Por lá, não vingou. Em sua última temporada no Giuseppe Meazza, acabou emprestado ao Brescia novamente, onde mudou de posição. Baggio ocupava seu posto e o jovem Pirlo acabou sendo recuado para atuar como um armador. Ali, fez sua história.

Desprezado pela Inter, o italiano foi vendido ao rival Milan em 2001. Foram dez anos no lado rossonero da cidade, onde se destacou como um armador de excelente qualidade técnica e, além disso, como um especialista em cobranças de bola parada. Por lá, venceu dois títulos da Serie A, uma Copa Itália, uma Supercopa da Itália, duas Uefa Champions League e um Mundial de Clubes. Mas era pouco para Pirlo.

Pirlo comemora um dos gols do título do Milan na Champions League de 2006/07 (Foto: Franck Fife/AFP/Getty Images)
Pirlo comemora um dos gols do título do Milan na Champions League de 2006/07 (Foto: Franck Fife/AFP/Getty Images)

Em 2011, o volante não teve seu contrato renovado com os rossoneri e acabou rumando para a Juventus, sendo peça fundamental da dinastia que dura até os dias de hoje. Tratado como "a contratação do século" por ninguém menos que Gianluigi Buffon, ajudou a vencer quatro títulos da Serie A, uma Copa Itália e duas Supercopas enquanto esteve em Turim. Ainda foi eleito o melhor jogador da liga em três ocasiões consecutivas, estando no time do ano em todas as quatro temporadas disputadas com a camisa bianconera. Em 2015, se transferiu ao New York City FC, e não teve o mesmo destaque obtido na Itália, mas por lá ficou três anos, sendo fundamental para o time da MLS.

Na Juve, a consagração como um dos melhores de todos os tempos em sua posição (Foto: Giuseppe Cacace/AFP/Getty Images)
Na Juve, a consagração como um dos melhores de todos os tempos em sua posição (Foto: Giuseppe Cacace/AFP/Getty Images)

Pela Azzurra, as glórias não foram menores. Pirlo foi eleito o melhor jogador da final de 2006, quando também levantou a taça. Venceu uma Eurocopa sub-21 e teve uma medalha de bronze olímpica, em Atenas-2004.

Pirlo também conquistou o maior dos títulos pela Seleção (Foto: Clive Mason/Getty Images)
Pirlo também conquistou o maior dos títulos pela Seleção (Foto: Clive Mason/Getty Images)

Kaká: o último 'humano' a vencer o prêmio de melhor jogador do mundo

É isso que pode ser falado sobre Ricardo Izecson dos Santos Leite, o Kaká. Foi o último deste texto a anunciar sua aposentadoria, no início deste mês de dezembro, encerrando uma carreira recheada de títulos e prêmios individuais. Entre eles, o de melhor jogador do mundo em 2007, quando também foi campeão da Uefa Champions League pelo Milan.

Criado nas divisões de base do São Paulo, Kaká venceu o Torneio Rio-São Paulo de 2001, quando fez sua estreia no time profissional do Tricolor Paulista. O bom desempenho o levou à Seleção Brasileira do técnico Luiz Felipe Scolari, que também o convocou à Copa do Mundo de 2002. Mesmo jogando apenas 20 minutos, o jovem de apenas 20 anos já tinha um Mundial no currículo.

Kaká ganhou a Copa do Mundo aos 20 anos de idade (Foto: Pedro Ugarte/AFP/Getty Images)
Kaká ganhou a Copa do Mundo aos 20 anos de idade (Foto: Pedro Ugarte/AFP/Getty Images)

E continuou sendo um dos pilares do São Paulo naquele ano, sendo o melhor jogador do Brasileirão de 2002, em premiação da conceituada revista Placar. Acabou deixando o clube brasileiro no ano seguinte, rumo ao gigante Milan. Por lá, fez seu nome e se consagrou como um dos melhores meias do futebol mundial.

Contratado por 8,5 milhões de euros, Kaká teve impacto imediato, fazendo parte de um ataque poderoso, que também contava com o ucraniano Andriy Shevchenko. Chegou sendo fundamental na conquista do título da Serie A 2003/04, seu único pelo Milan. Na temporada seguinte, viveu o difícil vice-campeonato da Champions League, em derrota nos pênaltis para o Liverpool. Na Copa do Mundo de 2006, nova decepção, com a eliminação para a França nas quartas de final.

Em 2007, a redenção: Kaká chegou a mais uma final de Champions League com o Milan e, dessa vez, conquistou a Europa. Principal estrela do time, foi eleito o melhor jogador do mundo daquele ano, impulsionado principalmente pela conquista do título europeu. Em 2009, se transferiu ao Real Madrid, pelo absurdo valor de 65 milhões de euros, pouco antes de Cristiano Ronaldo chegar ao Santiago Bernabéu.

Deixar defensores no chão foi uma cena comum na carreira de Kaká (Foto: Jamie McDonald/Getty Images)
Deixar defensores no chão foi uma cena comum na carreira de Kaká (Foto: Jamie McDonald/Getty Images)

Sofrendo com lesões, acabou não emplacando as atuações que encantaram o mundo na Espanha. Ainda assim, venceu uma Copa do Rei, um título de La Liga e uma Supercopa da Espanha. Acabou retornando ao Milan em 2013, mas sofreu novamente: o clube não se classificou à Champions League e Kaká ativou uma cláusula em seu contrato para se transferir à MLS, onde jogou e se tornou ídolo do Orlando City.

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Sobre o autor
Gabriel Menezes
Jornalismo na UFRJ. Coordenador e setorista de Botafogo; Coordenador de Futebol Americano e Italiano