Todas as prestações realizadas por Alemanha e Brasil nesta edição do Mundial apontavam uma evidente diferença de consistência emocional e táctica entre ambas as selecções, por muito que pudesse custar à equipa que joga a competição em casa e que possui mais títulos mundiais do que qualquer outra selecção. 

Essa realidade levava a que no seio da ‘amarelinha’ fosse necessário reconhecer que para ultrapassar o rival alemão seria necessária astúcia, uma sapiência que na verdade há muito nenhuma equipa nacional demonstra para levar de vencida a Mannschaft. No entanto, se a nível de selecções tal não tem acontecido, a nível de clubes existe um modelo que Luiz Felipe Scolari e seus pares poderiam ter utilizado como parâmetro para aumentar as suas possibilidades – o campeão europeu de clubes Real Madrid.

Difícil colocar em prática uma estratégia de clube numa selecção nacional? Sim, até porque este Brasil não tem, nem perto disso, ‘um’ Karim Benzema, ou Cristiano Ronaldo, ou Angel Di María. Pior, nem sequer tinha a sua principal arma ofensiva, Neymar, à disposição. Ainda assim, possui jogadores com uma qualidade bem superior à que foi demonstrada num verdadeiro vexame que será certamente relembrado até nos próximos 100 anos.

Como tal, certamente que o Brasil não faria pior figura que aquela que na realidade fez caso tivesse apostado no ‘anti-taka’ que fez com que o Real tenha goleado sem apelo nem agravo a espinha dorsal desta Alemanha, o Bayern de Munique, que apenas e só consiste na génese desta Alemanha.

Contudo, Felipão preferiu manter-se fiel à teimosia e ao seu Brasil que de ‘vintage’ apenas possui a forma arcaica como defende e procura sair para o ataque, cometendo novamente o erro de prender vários jogadores neutrais a uma só posição, perdendo uma possível dinâmica ofensiva que poderia colocar o ‘Bayern-Deutschland’ em apuros e, pior, desprezando mesmo as principais qualidades de um adversário que demonstrava um poderio bem superior.

O desprezo começou pela defesa, que se apresentou lenta e sem propósito, com a particularidade de ser composta por dois defesas centrais de estilo semelhante, David Luiz e Dante, que por curiosidade ou não apenas só isso também havia feito parte da barricada dos humilhados no acima mencionado Bayern - Real.

Foram muitos os problemas de um Brasil que não foi adversário para a Mannschaft

Com o central mais credibilizado de fora por castigo, Thiago Silva, e com duas alternativas sem a mesma qualidade, a necessidade de colmatar as virtudes que David Luiz não oferece pediriam o lançamento de um central mais sóbrio como Henrique, que está longe de ser um grande central, ao invés do mais espectacular mas também mais errante Dante, ainda mais quando os laterais sempre foram neste Mundial demasiadamente macios no processo defensivo.

Com Marcelo, Maicon ou eventualmente Daniel Alves pedem-se centrais capazes de fazer a dobra e muitas compensações, algo que pela sua composição David Luiz e Dante nunca foram nas suas carreiras capazes de fazer – essa debilidade tornou-se ainda mais marcante quando pela frente do quarteto defensivo brasileiro surgiu um endiabrado Thomas Muller, que com facilidade apontou dois golos e arrancou uma assistência.

No caso dos laterais, seriam obrigados a fechar o seu flanco sem hesitações e subir apenas pela certa, contrariando o seu estilo, e na perspectiva ofensiva dos centrais pelo menos um deles teria de ser também referência ofensiva nas bolas paradas, algo que David Luiz poderia ter assumido. Mais: se esse ‘buraco’ defensivo existiu, a isso muito se deve a escolha dos nomes para a convocatória: difícil perceber porque ficaram de fora dos 23 jogadores como Miranda, Filipe Luís, Rafinha ou até Luisão

Passando ao meio-campo: seria nada menos do que impossível uma dupla composta por Fernandinho e Luiz Gustavo, dois ‘destruidores’ de génese idêntica, ter o mínimo sucesso perante dinamizadores como Bastian Schweinsteiger, Sami Khedira e especialmente o sensacional Toni Kroos, muito provavelmente o melhor homem em campo pelo que jogou para além dos dois golos marcou e a assistência que arrancou.

Estranho no mínimo, verificar que Ramires não foi titular neste encontro no centro do terreno. Mais estranho ainda foi perceber que o homem do Chelsea é constantemente adaptado à ala direita do ataque quando seria o elemento mais habilitado para tentar dividir o meio-campo com os alemães, mais ainda do que Paulinho, que frente ao México tinha saído claramente a perder nesse particular em relação ao portista Hector Herrera, nomeadamente no posicionamento sem bola.

Equipa titular apresentou várias escolhas que não justificaram a confiança de Scolari

Desta forma, Ramires poderia assumir a saída em posse e libertar Oscar para se tornar a primeira ‘seta’ apontada à baliza adversária. Todavia, para que tal pudesse resultar, não só Oscar teria de jogar de forma mais solta como vez mais a escolha dos nomes a compor a linha ofensiva teria necessariamente de ser outra visto que teriam de forma obrigatória de passar pelas cada vez mais referidas ‘ventoinhas’, de constante projecção atacante e forte movimentação.

Face à complicada época de estreia que teve na Europa, não poderia pedir-se a Bernard que desempenhasse essa função, ainda mais quando a restante alternativa consistia num jogador mais tarimbado no panorama internacional e bastante rodado com uma interessante época transacta ao serviço do Chelsea, como é o caso de Willian, que em situação normal teria sempre sido titular frente à Alemanha ao invés de ser lançado com a partida e o resultado completamente resolvidos.

Aliás, a sua própria convocatória parece duvidosa face à existência de outros nomes deixados de fora da lista final de 23 e mais habilitados que o jovem extremo para actuar neste Mundial. Como explicar que Bernard ocupe uma vaga que poderia pertencer a Lucas Moura, um valor que teria espaço, de caras, neste grupo de trabalho e mesmo na equipa titular.

Mas para além de Lucas uma das vagas de extremo neste ‘escrete’ poderia pertencer a jogadores como Alex Teixeira, Douglas Costa ou Taison, que curiosamente retiram espaço a Bernard no Shakhtar, Robinho mesmo com a falta de ritmo, ou a criativos como Kaká ou Ronaldinho Gaúcho, que possuem uma importantíssima experiência neste tipo de competições. Nenhum destes jogadores mereceu a confiança de Felipão, e o ataque ressentiu-se disso.

Quanto ao lugar de ponta-de-lança, frente à Alemanha tornava-se mais específico do que nunca, e dispensava por completo um jogador com as características do mal-amado Fred em prol de uma unidade rápida capaz de dominar, tabelar e de imediato disparar em desmarcação, uma função que num primeiro olhar caberia melhor a Jô, que ainda assim se trata de um futebolista longe de justificar a presença numa selecção como a brasileira.

Embora não disponha dos goleadores do passado sempre poderia ter recorrido a Jonas, Lima do Benfica ou Luiz Adriano. Contas feitas, todos os sectores estiveram aquém frente aos germânicos e o seu seleccionador foi claramente incapaz de ler o seu oponente, terminando copiosamente goleado e com muitos pedidos para a sua demissão que muito embora possa não ser a resolução de todos os problemas parece justificar uma mudança, pelo menos a chegada de um conselheiro mais inserido no jogo actual, quem sabe oriundo da Europa para evitar que novo vexame se repita…