O ex-técnico da seleção espanhola, Luis Aragonés, faleceu na manhã deste sábado em Madri aos 75 anos. A nota de falecimento foi divulgada às 6h15 pelo médico Pedro Guillén à Rádio Nacional da Espanha. Don Luis, como era apelidado, estava internado desde o ínicio do mês no hospital Centro, na capital espanhola. O Atlético de Madrid, clube por onde destacou-se como treinador e jogador, decretou luto em sua nota de pesar aos familiares.

"Nesta madrugada faleceu Luis Aragonés. Todos da família atlética estamos de luto e enviamos um forte abraço a sua família", confirmou o Atlético de Madrid em comunicado oficial.

A carreira dentro dos gramados

Luis Aragonés nasceu em Hortaleza, localidade da cidade de Madrid, em 28 de julho de 1938. Iniciou sua caminhada como jogador de futebol no Getafe, clube do subúrbio da capital espanhola, em 1957. Um ano depois, transferiu-se para o poderoso Real Madrid, equipe que já havia conquistado o respeito dos adversários tanto dentro quanto fora das fronteiras da Espanha. No entanto, não conseguiu se firmar nos merengues e foi emprestado a diversas equipes: Recreativo Huelva, Hércules e Real Madrid Castilla (time B do clube madrilenho).

Após tamanha rodagem, Aragonés foi vendido ao Real Oviedo em 1960. Não tardou muito e o meio-campista defendeu o Bétis no ano seguinte. Foi no time da cidade de Sevilla que o atleta começou a dar um grande passo em sua carreira, marcando 33 gols em 86 partidas. Suas atuações chamaram a atenção do Atlético de Madrid, que o comprou em 1964. Apadrinhado por Vicente Calderón, o mesmo que dá nome ao estádio dos colchoneros nos tempos atuais, Luis defenderia as cores do Atleti por nada mais e nada menos que dez temporadas.

Desta vez, Don Luis Aragonés, como ficou conhecido, seria feliz na capital da Espanha. Com a camisa do lado vermelho e branco de Madrid, atuou em impressionantes 372 jogos e balançou as redes em 172 oportunidades. Conquistas também não faltaram. Ajudou os Rojiblancos na caminhada rumo ao título de La Liga em três temporadas: 1965-1966, 1969-1970 e 1972-1973. Também levantou duas taças da Copa do Generalíssimo, antigo nome da Copa do Rei, em 1965 e em 1972.

Na edição 1973-1974 da Taça dos Campeões Europeus, atual UEFA Champions League, Don Luis foi um dos líderes do Atleti, finalista da competição após eliminar Galatasaray (Turquia), Dínamo Bucareste (Romênia), Estrela Vermelha (Iugoslávia) e Celtic (Escócia) nas fases anteriores do mata-mata. Na decisão, o adversário seria o Bayern de Munique, base da seleção da Alemanha Ocidental que seria campeã da Copa do Mundo da FIFA no mesmo ano, diante de sua torcida.

Disputada em jogo único, a final seria repetida em caso de empate no tempo normal e na prorrogação. O Atlético não facilitou as coisas para os bávaros. A seis minutos do fim do prolongamento, Aragonés abriu o placar e deixou os colchoneros muito perto do título. Muito mesmo. Mas, nos instantes finais, Schwarzenbeck igualou o marcador e forçou a realização de uma segunda partida, a ser disputada no mesmo Estádio Heysel, em Bruxelas, na Bélgica. Aparentemente abatidos por terem deixado a conquista escapar na ida, os espanhóis sucumbiram diante da potência alemã e tomaram um acachapante 4 a 0, com Uli Hoeness e Gerd Müller marcando dois gols cada. Nada que apagasse a boa campanha dos alvirrubros.

A corrente temporada seria a última de Luis Aragonés como jogador de futebol. Após pendurar as chuteiras, foi logo promovido ao cargo de técnico do time pelo qual se aposentou, ainda aos 36 anos de idade.

Um técnico vitorioso

À beira do gramado, Zapatones, outro apelido o qual adquiriu ainda na carreira de jogador devido ao fato de ser um exímio cobrador de faltas, teve muito o que comemorar. Foram quatro passagens no comando técnico do Atleti, entre 1974 e 1980, 1982 e 1987, 1991 e 1993 e, por fim, 2001 e 2003. Dentro destas longas eras, gritou "É campeão" sete vezes: uma em La Liga (1976-1977), três na Copa do Rei (1975-1976, 1984-1985 e 1991-1992), uma da Supercopa da Espanha (1985), uma da segunda divisão espanhola (2001-2002) e uma do Mundial Interclubes (1974), indubitavelmente a mais importante - àquela época, o Bayern, então campeão europeu, desistiu de disputar a competição e o Atleti herdou a vaga; em jogos de ida e volta, derrotou o Independiente, papa-títulos da Libertadores da América, por 2 a 1 no placar agregado e ficou com a taça.

Bétis, Espanyol, Barcelona, Sevilla, Valencia, Oviedo e Mallorca foram outras equipes treinadas por Aragonés. Mas em nenhuma delas adquiriu o mesmo sucesso obtido no Atlético de Madrid. O único título conquistado foi a Copa do Rei de 1987-1988 com o Barça. Protagonizou campanhas relevantes, como o vice-campeonato do Valencia no Campeonato Espanhol da temporada de 1995-1996 - curiosamente, o campeão foi o Atleti. Àquela altura, os Chotos também alcançaram as semifinais da copa nacional. Também houve momentos críticos: em algumas oportunidades, chegou a se afastar do cargo devido a problemas de saúde; dentro de campo, o momento mais desolador foi o rebaixamento à segunda divisão com o Real Bétis em 1989.

Em 2001, antes de voltar ao Atleti para tirá-lo da segundona, havia se destacado por ter deixado o Mallorca na terceira posição da elite do futebol espanhol.

No ano de 2004, Luis Aragonés chegou ao cargo em que já tinha sido especulado por diversas vezes: o de treinador da Seleção Espanhola. O aproveitamento à frente da Fúria foi bastante expressivo: 70,37%, com 32 vitórias, 12 empates e apenas quatro derrotas em 54 confrontos. Engatou um recorde de 25 partidas consecutivas de invencibilidade e ajudou a formar a base do selecionado cujo plantel é considerado o melhor dos dias atuais. Não à toa conquistou a Eurocopa de 2008. Na final, os espanhóis bateram a Alemanha por 1 a 0 em Viena, com o gol da vitória sendo marcado pelo atacante Fernando Torres.

Além do próprio Torres, vários são os jogadores que continuam defendendo a seleção da Espanha atualmente: Casillas, Sergio Ramos, Iniesta, Xavi, David Silva, Xabi Alonso, entre outros. Logo após a Euro 2008, o vínculo de Don Luis com a Real Federação Espanhola de Futebol chegou ao fim. Não demorou e foi à Turquia treinar o Fenerbahçe. Estabeleceu-se em Istambul até 2009, depois que o Fener terminou o Campeonato Turco numa decepcionante quarta colocação. Era o seu último trabalho como técnico de futebol. Após longo período desempregado, anunciou sua aposentadoria recentemente, em dezembro de 2013.

Aragonés deixa legado no futebol espanhol: além de conquistas, ajudou a formar um time sólido que vem dominando o futebol mundial (Foto: elgratuito.com.mx)

Polêmicas

Zapatones também se envolveu em polêmicas. Em 2004, já no primeiro ano no cargo de técnico do selecionado espanhol, ficou nos holofotes por ter feito comentários de teor racista direcionados ao atacante francês Thierry Henry, enquanto motivava o meia José Antonio Reyes: "Diga àquele negro de m**** que você é muito melhor que ele. Não reprima, diga a ele. Fale de mim. Você tem que acreditar em si mesmo, você é melhor do que o negro de m****"

A repercussão do comentário foi imensa, especialmente na imprensa inglesa, visto que Henry atuava no londrino Arsenal àquela época. O fato deixou o posto de Aragonés ameaçado, mas tal hipótese não se concretizou.

Em setembro de 2006, após o fracasso na Copa do Mundo da Alemanha - a Espanha caiu diante da França, que viria a ser vice-campeã, na fase de oitavas-de-final, ao ser derrotada por 3 a 1 - , Aragonés tomou uma de suas decisões mais polêmicas, se não a mais polêmica: deixou de convocar o atacante Raúl González, então com 29 anos, um dos maiores ídolos do Real Madrid, bem como do futebol espanhol, para a Fúria.

Dividindo intrigas e admirações entre os amantes deste esporte, a certeza a qual fica é que o maior legado deixado por Luis Aragonés em vida terrena é a atual geração espanhola. Afinal, foi ele quem deu o pontapé inicial e começou a plantar os frutos que são colhidos ainda hoje por Vicente del Bosque. Depois da Eurocopa de 2008, a Espanha obteve o inédito título da Copa do Mundo em 2010 - 1 a 0 sobre a Holanda, na prorrogação - e ainda reconquistou a Euro dois anos mais tarde - 4 a 0 sobre a Itália na decisão.

Além do mais, o Atlético de Madrid é um dos clubes mais vitoriosos da história do futebol espanhol e deve boa parte de suas conquistas a Don Luis, jogador e treinador dos colchoneros por longos tempos. Tais façanhas o manterão eternizado no Vicente Calderón.

Na rodada deste final de semana da Liga BBVA, a 22ª da edição 2013-2014, o tradicional um minuto de silêncio deve ser respeitado em todos os jogos. Não só da divisão de elite como também das divisões inferiores.

Colaboração: Luis Francisco Prates