Se futebol também é negócio, os clubes são como empresas e seus nomes como marcas poderosas. Dotadas de demandas que vão além das que preenchem as quatro linhas, as instituições adotam estratégias para dinamizar o relacionamento com seu torcedor e conquistar novos adeptos. Para atingir missões como essas, um dos caminhos pode ser apostar em mecanismos diversos de comunicação.

As redes sociais, por exemplo, há tempos vêm se revelando como ferramentas importantíssimas para expandir os nomes dos clubes de futebol, que passaram a perceber o quanto seus perfis podem ser usados de maneira eficaz. Se antes empresas restringiam-se, basicamente, a estampar seus nomes nos materiais esportivos das equipes parceiras, um movimento recente tem mostrado que o contexto digital pode também ser um forte aliado.

Mais do que expansão de marca, ações simples podem ser rentáveis ao clube. Um gol representado por um gif com anúncio nas redes sociais, o lucro sobre o engajamento de hashtags em plataformas ou até mesmo a escolha de um momento específico para anunciar contratações, tudo isso representa um processo de monetização de práticas antes nem conhecidas.

Para o gerente de conteúdo do Cruzeiro, André Luiz Araújo, as redes sociais são espaços importantes de ligação dos clubes com o seu torcedor e podem ser otimizadas. "As redes sociais, como o próprio termo diz, são canais para que as instituições divulguem seus trabalhos e produtos, além de interagir com seu público e prospectar novos clientes. Entretanto, o mais importante é que se aproveite esses canais para entender esse consumidor e as movimentações do mercado e do mundo atual", afirmou.

Apesar de serem ferramentas que facilitam a comunicação, alguns cuidados são necessários quanto ao seu uso em ações que extrapolam a mera função de disponibilizar informações do time. "Antes de tudo, as redes sociais são canais de exposição do clube e de relacionamento das empresas com seus cliente. No caso do esporte é uma das formas mais simples do torcedor conversar com o clube. É possível encontrar caminhos em que marcas apresentem conteúdos dentro de outros perfis. O que se deve evitar é a exposição de forma agressiva e fora de contexto", comentou André.

Pensando nesse papel abrangente das redes sociais e dos mecanismos de comunicação para os clubes de futebol atualmente, a reportagem da VAVEL Brasil levantou exemplos de ações que renderam dinheiro sem necessidade de grandes investimentos ou planejamento de marketing por trás.

Bristol City: o atual 'case de sucesso'

A lógica é simples: a cada gol, um gif diferente na timeline. Os clubes investem cada vez mais na ferramente de tempo real, mas o Bristol City, clube de pouco apelo na Inglaterra, pensou diferente: por que não colocar uma dose de humor no momento dos gols? Foi assim que nasceram os gifs que rendem milhares de compartilhamentos nas redes sociais a cada partida da equipe.

Marketing simples. Vendo a grande interatividade no conteúdo, a ação começou a atrair patrocinadores. De maneira inteligente, o clube começou a monetizar em cima dos gols marcados pela equipe ao expôr a marca dos anunciantes nas comemorações. Contra o Manchester City, na semifinal da Copa Carabao, o Bristol bateu seu recorde de engajamento nas redes sociais.

O chefe de comunicação do Bristol City, Adam Baker, conta que a inspiração surgiu das equipes norte-americanas que adotaram um comportamento mais ousado nas redes sociais - como na NBA ou NFL. Em um país com humor mais comedido como a Inglaterra, a atitude foi vista como inovação e criatividade.

"Na Inglaterra, as coisas parecem muito mais regradas - até esta temporada. No verão, muitos clubes eram corajosos na forma como anunciavam contratações. Então trouxemos a ideia para o futebol. Os jogadores recebem muita pressão negativa em torno deles. Eu sei que parece um clichê, mas temos um ótimo grupo de jogadores no clube, seres humanos fantásticos, e os gifs ajudaram a mostrar isso", declarou Adam Baker.

Mais do que usar nomes de parceiros em várias partes da camisa, uniforme que contempla até preços distintos para cada lugar dos anúncios, os perfis dos clubes também têm se mostrado como espaços a ser monetizados. Segundo André Luiz, por mais que esses ambientes possam ser usados assim, é preciso uma utilização em momentos certos e contingencialmente bem aplicados.

"Em um ambiente em que os patrocínios master são mais segmentados, existe a necessidade e a tendência de se ampliar as formas de parceria. Todo conteúdo é passível de alguma forma de exploração, seja de amplificação dos patrocínios existentes, seja da criação de oportunidade de exposição para empresas menores. Mas o critério que precisa ser respeitado é o de a marca não se tornar um alien dentro da comunicação. É importante que ela seja sutil e faça sentido dentro do contexto das ações", ponderou André.

Uma brincadeira que rendeu muito dinheiro

Em 2015, a Nike optou por fazer uma grande mudança no uniforme do Barcelona: para a temporada, o clube trocou suas faixas verticais por horizontais. O problema é que o desenho ficou muito parecido com a camisa do Llagostera, que também é da Catalunha e disputa a segunda divisão do Campeonato Espanhol.

Nas redes sociais, uma brincadeira simples da Hummel, fornecedora de material esportivo do pequeno clube catalão, rendeu muito dinheiro. Devido à semelhança dos uniformes, o clube aproveitou para anunciar a contratação do francês Paul Pogba, na época na Juventus e negociando com o Barcelona, com a camisa do Llagostera em suas redes sociais.

Segundo o 'Diário Marca', da Espanha, a brincadeira foi sensacional para o clube e para a fornecedora de material esportivo. O mundo voltou os olhos para ambos e para as semelhanças dos uniformes. Segundo o jornal, o Llagostera vendeu mais de 10 mil uniformes com listras horizontais, um recorde de distribuição para a instituição.

Ainda de acordo com o 'Marca', a Nike chegou a pedir para o rival mudar o seu uniforme na próxima temporada. O Llagostera rejeitou completamente o pedido da empresa americana e seguiu usando o mesmo uniforme. Anos depois, Pogba foi para o United e não para o Barcelona, mas a estratégia de marketing já havia rendido frutos.

Bahia envia 'SMS' e alavanca sócio-torcedor

O Bahia precisava impulsionar seu programa de sócio-torcedor. Para disputar de igual para igual com os grandes clubes brasileiros, a diretoria precisava inovar para conseguir uma forma de obter renda. Uma estratégia simples de marketing ajudou a alavancar o contato entre clube e torcida: através de mensagem de texto para celular (SMS), os sócios recebiam notícias exclusivas sobre o clube. Até então, a ideia foi pioneira no Brasil.

Em 2013, quando a estratégia se iniciou, o Bahia tinha apenas sete mil sócios e ocupava a 32ª posição no ranking de sócios do Brasil. De lá para cá, a quantidade de associados dobrou e deu um pulo na tabela: o Esquadrão de Aço abriu 2018 com 14 mil sócios e na 20ª colocação do Ranking para um Futebol Melhor.

Foto: Divulgação

Criador da ação, o então diretor de marketing do Bahia, Jorge Avancini, comentou sobre a operação de 2013. “Foi uma ferramenta que nos permitiu alcançar mais de 8 mil sócios em uma velocidade impressionante. Esta ação foi um pedido da torcida que resolvemos atender, como acontecia em 2014", afirmou.

Além de ajudarem seus clubes, sócios-torcedores de times brasileiros têm descontos em produtos das marcas Ambev (Brahma), Empório da Cerveja, Chopp Brahma Express, Unilever, Sky, Pepsico, Premiere, Centauro.com.br, Rede de Hotéis Arco, Méliuz e Bic. Essas empresas são parceiras do Movimento por um Futebol Melhor, que, desde 2013, já concedeu mais de 80 milhões de reais aos associados dos 74 clubes participantes.

Este tipo de ação do Bahia extrapolou o ambiente digital, mas, ainda assim, comporta uma estratégia de comunicação do clube para melhorar o relacionamento com o torcedor. "O mundo está cada vez mais digital e isso não significa apenas redes sociais, sites e serviços online, mas também o pensamento colaborativo, ações transversais, interações e parcerias", comentou André Luiz.

Santa Cruz rendeu dinheiro com o 'Corujão'

A queda para uma divisão inferior representa um marco negativo na história de um clube, mas também um momento de reestruturação. O Santa Cruz, por exemplo, encontrou nas redes sociais uma maneira de conseguir uma nova fonte de renda bem no ano de seu rebaixamento para a Série C.

O clube criou o 'Corujão Coral' em dezembro de 2017, uma forma de anunciar atletas contratados. A peculiaridade, porém, foi a escolha do horário para fazer seus anúncios: a madrugada. A ideia logo caiu no gosto da torcida e, com o sucesso, vieram os patrocinadores.

Marcas como TNT e Pizzaria Atlântida entraram em contato com o clube Coral para anunciar no exato momento em que o clube fazia suas contratações. De acordo com o presidente Constantino Junior, isso gerou uma renda extra para os cofres do Santa Cruz.

"Os jogadores não foram contratados como o patrocínio conseguido no Corujão Coral, mas conseguimos pagar passagens, por exemplo. Foi um valor razoável e o número de engajamentos é fantástico. Fomos trending topics no Brasil e isso deu uma condição muito boa para quem patrocinou, estamos muito satisfeitos e nosso departamento comercial vem sendo procurado por possível patrocinadores", disse o cartola do Santa.

Buscando expandir a marca do 'Corujão Coral', o clube também pretende levar a brincadeira para suas lojas físicas. A estratégia é aproveitar a imagem para fabricação de mascotes e camisas. O dinheiro feito pelo Santa Cruz ganhou novas fontes de renda, pois usa a torcida como maneira de ganhar dinheiro.

Dupla Gre-Nal nas redes sociais

Grêmio e Internacional disputam tudo que é possível como se fosse um clássico. Títulos, número de sócios e também engajamento nas redes sociais. Tudo isso integra o universo polarizado dos rivais gaúchos. Mas, apesar desses terem condições suficientes para montarem suas equipes de marketing, dois lemas de torcedores viraram febre nas redes sociais:

"Nós vamos acabar com o planeta" x "O Inter não dorme"

No lado tricolor do Rio Grande do Sul, o sonho de ser tricampeão da Libertadores ganhou a hashtag #NósVamosAcabáComOPlaneta como lema. A ideia partiu de um áudio de um torcedor gremista na semifinal da Copa do Brasil de 2016, que viralizou após comemorar de maneira bastante entusiasmada os dois gols do atacante Pedro Rocha para cima do Atlético-MG.

Sucesso entre torcedores, coube ao perfil do Grêmio usar a expressão em postagens nas suas redes sociais durante a campanha do título da Libertadores de 2017 e principalmente no Mundial de Clubes. O mundo não acabou, mas a interação com os torcedores gerou boa impressão e números. O próximo passou foi criar ações de marketing e se inspirar na venda de produtos físicos - como com as expressões 'Rei de Copas' e 'Queremos a Copa'.

"Esta frase pegou na torcida. Quando vem da massa para o contexto, é muito bacana. Foi como o "Rei de Copas", que todo mundo já falava e ganhou uma nova dimensão, com mais de 20 produtos derivados. O Rei de Copas foi algo que fizemos e ganhou força. Com esta frase, estamos buscando criar uma atmosfera em cima do que o torcedor fala. Também usamos muito o "Queremos a Copa", explicou Beto Carvalho, executivo de marketing do Grêmio, ao portal Zero Hora.

Pelo lado colorado, uma frase mais sem sentido ainda. Mesmo sem a certeza de sua origem, o Internacional aproveitou a interação com a hashtag #OInterNaoDorme para se aproximar do seu torcedor. A explosão aconteceu após a vitória sobre o Figueirense, pelo segundo turno do Brasileirão Série B de 2017, quando a expressão entrou para os assuntos mais comentados no Twitter.

Segundo o departamento de mídia do colorado, a frase começou a ser divulgada pela torcida. Até o presidente Marcelo Medeiros entrou na onda e respondeu a um colorado, entre outras conversas, que "o Inter nunca dorme". Desde então foram contabilizadas mais de 15 mil postagens no Twitter com a frase. Nas redes sociais, engajamento é dinheiro.