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Kaká, o Milan, a idolatria e o dinheiro: Il Bambino d’oro ainda vale ouro?

O casamento entre Milan e Kaká já foi perfeito, mas uma reconciliação estaria longe de ser a solução para os problemas de ambos - principalmente do Milan

Kaká, o Milan, a idolatria e o dinheiro: Il Bambino d’oro ainda vale ouro?
Kaká, em 2009, ao anunciar sua recusa ao Manchester City para a torcida, que lotava a frente de sua casa: o ídolo ainda é necessário em Milão? (Foto: Luca Bruno/AP)
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Por Caíque Toledo

O Milan praticamente não tem mais ídolos. Da geração que encantou o mundo, que era comandada por Maldini e tinha os gols de Shevchenko, só sobrou Ambrosini. Um a um, todos foram saindo, parando. Os últimos ícones, Thiago Silva e Ibrahimovic, foram 'vítimas' do dinheiro, e deixaram Milão, rumo a Paris.

 
Depois das saídas de Ibra e Thiago, o Milan ficou carente de ídolos, mesmo com Ambrosini, capitão, ainda em Milanello. Afinal, o camisa 23 não tem titularidade garantida - foram apenas 16 jogos na temporada. Ao começar mal a temporada, o Milan foi melhorando aos poucos, e hoje até pode tentar brigar por uma vaga na Champions League. Mas precisa de reforços.
 
Querendo matar duas necessidades de uma vez só, Sílvio Berlusconi, presidente do rossonero, pensou em Kaká. A ideia era simples: trazer o jogador para onde teve a melhor fase de sua carreira, onde é ídolo, e que comandaria o meio-campo do jovem time que o Milan pretende montar nos últimos anos. O clube tentou, Kaká aceitou diminuir o salário, mas razões fiscais não deixaram o casamento acontecer novamente.
 
Mas a questão é: apenas a volta de Kaká deixaria o Milan em paz com a torcida? O passado de glórias do brasileiro seria garantia de um excelente futuro? Kaká, na verdade, é o que o Milan precisa?
 
Voltando no tempo, em janeiro de 2009, o Milan chegava ao San Siro para enfrentar a Fiorentina. Às seis da tarde, três horas antes da partida, a Curva Sud já estava lotada, e o grito, ao invés de apoios condicionais ao clube, como de costume, era apenas um: "non si vende Kaka!" Na época, uma proposta de mais de 100 milhões de euros do Manchester City estava na mesa do Milan, que foi obrigado a aceitar, tamanho o valor. Kaká preferiu ficar. No fim da temporada, o meia foi para o Real Madrid, por 65 milhões de euros. O dinheiro era quase a metade, mas a vontade do jogador, aliada a falta de dinheiro do Milan, pesou.
 
Hoje, quatro anos depois, vemos que Kaká, até então, esteve longe de dar certo na Espanha. Diante disso, várias foram a tentativa do clube de Milão repatriar o jogador. Em janeiro de 2013, o negócio esteve muito próximo de ser concretizado. Parte da torcida comemorou como uma conquista de Champions League. Outra parte franziu a testa: Kaká é o que o Milan precisa?
 
O ex-são paulino viveu muitos momentos bons em Milão, em especial em 2007, quando conquistou a Champions League e foi o melhor do mundo. Ao todo, na Itália, foram quase 270 partidas, e 95 gols. Seis anos e uma idolatria incomum para um time cheio de ícones (de Maldini a Sheva, passando por Pippo, Gattuso, Pirlo, Nesta, Seedorf, Rui Costa e tantos que Kaká pode atuar ao lado). Mesmo com todas as lendas ao lado, Kaká conseguiu brilhar. E o fez muito bem. Foram seis títulos nos tempos em que o Bambino d'oro ficou na Velha Bota.
 
Acontece que o cenário é perigoso. Kaká, desde sua chegada na La Liga, vive rodeado por lesões. Tantas lesões que, tenho certeza, foram o único motivo de não ter dado certo no Real Madrid. Futebol ele tem, e já provou ao mundo. A questão é que, hoje, Kaká pode não ser o nome certo para o Milan. Se Berlusconi e Galliani querem um atleta símbolo, de fato, o único contratável é Kaká (Pirlo, brilhando na Juve, não voltaria. E nem preciso falar de Ibra e Thiago). Se querem alguém que chegue para jogar e comandar o time, Kaká pode ser esse jogador - mas tem seu risco, e não será barato. E Kaká tem 30 anos. Fará 31 em abril.
 
Vendo a situação, como não lembrar de Shevchenko? O ucraniano, durante anos o grande ídolo da equipe, que se mandou para a Inglaterra por milhões de libras, e voltou dois anos depois, após fracassar no Chelsea? De volta à Itália, foram poucos jogos - e apenas dois gols. E se o Milan gastasse milhões com a volta de Kaká, e o cenário fosse igual?
 
O dinheiro está escasso em Milanello. Há problemas em vários setores do campo, e que precisam muito de novos reforços. Kaká, mesmo aceitando reduzir muito seu salário, ainda chegaria recebendo vencimentos muito mais altos que grande maioria do elenco. Sem esquecer do valor que o Real pede para liberá-lo - em definitivo ou não.
 
Galliani, sempre que pode, frisa que pretende montar um Milan mais jovem o quanto antes - e vem sendo elogiado por isso. Então, vai escorregar no erro de anos atrás? Aos 30, Kaká não é o mesmo de quando a Curva Sud implorou sua permanência. Caso o rossonero não conquiste a vaga na Champions League, uma quantia muito menor de receita virá para os cofres. E Kaká vai ter que sofrer jogando Europa League e com um time com menos dinheiro ainda para contratar.
 
Eu, em particular, apostaria em Kaká - mas só dependendo do preço. E, como o Milan não está em lá muitas condições de gastar quantias milionárias, minha opinião já passa a pender pro lado contrário.
 
Kaká tem um passado brilhante. É um ícone do San Siro, e nunca deixará de ser. Mas, hoje, o pouco dinheiro que Berlusconi investe pode ser gasto de maneira melhor. E Kaká, mesmo que seja difícil, entende isso. Se o ex-camisa 22 voltasse, seria recebido de braços abertos, com festa da torcida, independente dos valores. Mas a mesma torcida sabe - e se preocupa - do risco. Sabe também que Kaká, apesar de ídolo, está longe de ser a solução para os problemas do Milan. Aos rossoneri, é até difícil dizer, mas hoje, o clube faria muito melhor ao jogador do que Kaká faria bem ao Milan.