Do bairro da Restinga ao mundo: a carreira do volante Tinga

Nascido e criado em Porto Alegre, Tinga, que está de despedida dos gramados, deslanchou em uma carreira vitoriosa em títulos e dedicação a projetos sociais

Do bairro da Restinga ao mundo: a carreira do volante Tinga
Foto: Divulgação / Cruzeiro
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Por Henrique König

Na certidão, é Paulo César Fonseca do Nascimento. No bairro humilde onde foi criado, Paulo César herdou o apelido pelo qual se tornaria famoso mais tarde. Tinga, originário do bairro Restinga, em Porto Alegre, foi volante gabaritado do futebol brasileiro. Após anunciar a aposentadoria, aos 37 anos, o atleta realizou o último treino nesta quinta-feira (30), pelo Cruzeiro, seu último clube. A VAVEL recorda a carreira do jogador de raízes humildes e que conquistou espaço e títulos por onde trabalhou.

O início de Tinga foi no Grêmio, sua primeira casa no futebol. Profissionalmente, estreou na temporada de 1997 e, no Tricolor gaúcho, permaneceu com contrato até 2003, período em que esteve presente nas conquistas de duas Copas do Brasil, dois estaduais e uma Copa Sul-Brasileira. Individualmente, foi Bola de Prata do Brasileirão de 2002, como melhor volante. Durante o vínculo com os azuis de Porto Alegre, foi emprestado ao Kawasaki Frontale, do Japão, e ao Botafogo. Em 2004, deixou o mosqueteiro do sul para percorrer a Europa em ida ao Sporting Lisboa.

A chegada ao Internacional, o lado vermelho de sua cidade natal, foi em 2005. Lá, na temporada debutante pelos rubros, se mostrou derradeiro na conquista do campeonato gaúcho e no vice-campeonato brasileiro. Nenhum colorado esquece o pênalti do goleiro Fábio Costa sobre Tinga, ignorado pelo árbitro Márcio Rezende de Freitas, que ainda expulsou o gaúcho. O lance ruminou nas mentes de todos os afetados por ele. Mas a redenção veio no ano seguinte.


Na disputa da Libertadores da América de 2006, Tinga novamente teve a carta na manga para ser decisivo. Na final contra o São Paulo, no Beira-Rio, ele completou para as redes no gol que colocou o Inter na frente do placar: 2 a 1. Aínda nos minutos finais, foi expulso e, com a conquista do título sul-americano inédito na história do clube, o porto-alegrense se despedia de sua primeira passagem pelo Inter. Após os festejos da Libertadores, se apresentou no Borussia Dortmund, da Alemanha.

Até 2010, foram 154 jogos e 31 gols marcados pela equipe alemã, tornando Tinga um ídolo local. Como título, houve a taça da Supercopa da Alemanha, em 2008. Religioso desde os tempos de Grêmio, Tinga recorreu à igreja como melhora de sua ambientação na Europa. Depois de conquistar a idolatria dos torcedores do clube auri-negro, voltou ao Brasil, novamente ao Inter, e com nova missão de reconquistar a América.

O filme se repetiu para a alegria do sujeito da Restinga. "Tinga, teu povo te ama, te aclama" é um lema de escola de samba do bairro oriundo do jogador. Novamente com a casa cheia, ele conseguiu vislumbrar a alegria nos semblantes de seu povo pela conquista de mais uma Libertadores. Além disso, em 2011 venceu o Campeonato Gaúcho e o brinde da Recopa Sul-Americana pelo Internacional.



Recheado de conquistas, desembarcou no Cruzeiro para a temporada de 2012. A dificuldade financeira no clube mineiro era uma realidade, mas Tinga não abandonou o barco. Seguiu para o ano de 2013 e, com a devida reformulação do elenco, a constelação de Minas chegou para a conquista do Campeonato Brasileiro, o terceiro do Cruzeiro na história.

Sem esquecer das origens, Tinga possui uma história de participação e depoimentos em lutas sociais, por exemplo, com a CUFA - Central Única de Favelas. Sofreu com o racismo na partida contra o Real Garcilaso, no Peru, pela Libertadores de 2014. Ao tocar na bola, o volante cruzeirense era hostilizado com gritos que simulavam sons de macaco, emitidos pelos torcedores peruanos. Triste pelo ocorrido, Tinga falou após a partida do lamentável incidente: "Trocaria todos os meus títulos por igualdade".

Tinga, ao lado da presidente Dilma Rousseff, em campanha contra o racismo

Os dias seguintes àquele episódio de fevereiro repercutiram com o lançamento de uma campanha da CBF contra o racismo: Somos Todos Iguais. Sem desanimar com mais esse obstáculo na sua carreira repleta de lutas, Tinga permaneceu com o Cruzeiro para a conquista de mais um Campeonato Brasileiro, último título enquanto jogador profissional. Apesar de ter atuado somente em seis jogos, por causa de uma lesão, ele esteve junto aos companheiros para a comemoração na 36ª rodada do torneio.

Em 2015, mais precisamente no dia 11 de abril, Tinga oficializou o fim de sua carreira em evento realizado em Porto Alegre. Com o término de contrato pelo Cruzeiro no fim do mês (30), o atleta se despede das torcidas brasileiras como exemplo de luta, raça e dedicação. Jamais desistiu do sonho do futebol e driblou todas as dificuldades nos percursos da vida.

Ao anunciar que vai pendurar as chuteiras, o recado da despedida de Tinga foi o seguinte: "Através do trabalho e da honestidade, a gente consegue alcançar os nossos objetivos. A honestidade é a grande malandragem do século. Está muito difícil de ter isso. Hoje, todos pensam na sua vantagem, onde é que vão ganhar, então está muito difícil viver isso. E eu pude viver isso (honestidade) nos meus últimos anos."

Além das alegrias proporcionadas dentro de campo, Tinga encerra com uma fala para estimular a reflexão do papel social no país: "Para mim, o verdadeiro ídolo é um professor, é um médico, são aqueles que educam, aqueles que formam. Para mim, esse é o verdadeiro ídolo: é aquele que salva vidas, aquele que cuida de vidas."

Confira o vídeo completo da despedida de Tinga em evento em Porto Alegre:


Nome: Paulo César Fonseca do Nascimento (Tinga)
Posição: volante - armador
Nascimento: 13/01/1978 (Porto Alegre-RS)
Clubes: Grêmio (1997 a 1999); Kawasaki Frontale-JAP (1999 a 2000); Botafogo (2000); Grêmio (2001 a 2003); Sporting Lisboa-POR (2004); Internacional (2005 a 2006); Borussia Dortmund-ALE (2006 a 2010) e Internacional (2010 a 2012).
Títulos: Copa do Brasil 1997 e 2001; Copa Sul 1999; Campeonato Gaúcho 1999, 2001 (Grêmio); Copa Libertadores da América 2006 e 2010; Recopa Sul-Americana 2011; Campeonato Gaúcho 2005, 2011 (Internacional); Supercopa da Alemanha 2008 (Borussia Dortmund); Campeonato Brasileiro 2013 e 2014; Campeonato Mineiro 2014 (Cruzeiro).